Vale o escrito?

Por Nelson Motta

Quanto ainda vale o escrito? Só no jogo do bicho. Na selva da internet, seus textos circulam com outras assinaturas e escritos alheios, quase sempre toscos e constrangedores, são atribuídos a você. Agora um novo formato de fraude digital une a desonestidade à covardia: postam o seu texto original assinado, mas acrescentam por conta própria mais um parágrafo no final, distorcendo o seu sentido — e comprometendo o seu autor.

No auge do mensalão, escrevi uma crônica sobre o caso de amor e ódio que mudou a História do Brasil, entre José Dirceu e Roberto Jefferson, fazendo um paralelo com Nina e Carminha de “Avenida Brasil”, em que o texto encaminhava o leitor à conclusão final: “Feitos um para o outro”.

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A crônica continua circulando até hoje, mas fraudada por uma anta que lhe acrescentou um novo final com frases grossas e ignorantes sobre Dirceu e Lula, que nem é citado no texto, e botou no ar, como se fosse minha.

Vai dizer que não é? Ou é, mas até certo ponto? Que ponto? Tarde demais, o estrago já está feito. É uma sensação desconcertante receber elogios ou ser criticado, ser amado ou odiado, pelo que você não escreveu.

Ou pior, por um trabalho seu que foi adulterado, às vezes de forma sutil, às vezes grosseira, por um usurpador anônimo que quer propagandear as suas paixões políticas. E alguns são tão estúpidos que pensam que estão “reforçando” o texto, mas o estão enfraquecendo e desmoralizando, pelo excesso.

Em breve só poderá ser considerado autêntico o que for dito de viva voz em vídeo, mas com todos os atuais recursos de edição, manipulação e animação digital, nem isso será totalmente confiável, como é cada vez menos. Os biógrafos do futuro, que ironia, vão confiar mais na imprensa de papel e nos livros do que em textos da internet quando pesquisarem sobre o nosso tempo.

Quando se discute o direito à informação, o fim da privacidade, as ameaças à identidade e a defesa da intimidade na era digital, ainda ressoam as palavras de Nelson Rodrigues sobre seus limites e consequências: “Se todo mundo soubesse da vida sexual de todo mundo ninguém falaria com ninguém”.

É assustador. É real. É Belém

Por Elias Pinto – publicado no DIÁRIO de quarta, 06

1 Eu vinha de uma esquina perto de casa, na Carlos Gomes com a Ferreira Cantão, quando uma mocinha (acho que ainda não tinha 18 anos) brecou sua bicicleta esbodegada e fez sinais insistentes para que outra amiga, uma esquina adiante, viesse ao seu encontro. Rápido, insistia.

2 A mocinha chamada era do mesmo tope, girando a mesma idade, da mocinha que chamava. A primeira passou por mim no pique, e um outro rapazinho, completando o trio, atravessou a rua e passou pela calçada do outro lado. Os três confabularam às pressas, nervosos, e partiram.
3 Quando cheguei na esquina adiante, da Ferreira Cantão com a Silva Santos, olhei para a direção da Presidente Vargas. A explicação para o nervosismo do trio de jovens estava no formigamento que se formava em torno de uma senhora, por trás do cinema Olympia, fundos do Hilton. Ela devia ter sido assaltada pelas duas moças e pelo rapaz.
4 Eu estava com uma vizinha e prosseguimos até a porta de sua casa, defronte à minha. Antes de nos despedirmos, falamos de problemas de reforma na casa e da vizinhança violenta, o que acabáramos de constatar, jovens que vêm de outros bairros para arriscar assaltos e roubos aqui no centro.
5 Estávamos nesse papo quando uma das moças, que trajava shortinho, bonitinha, cara ainda de menina (ou de menina periguete), cruzou de bicicleta na nossa frente. Era uma das que há pouco passara correndo por nós.
6 Sem conter a surpresa, vimos que, em vez de seguir, ela deu meia volta e largou a bicicleta na sarjeta, bem defronte de onde estávamos. Abaixou-se e, de o sob o carro do vizinho, estacionado na rua, retirou um longo punhal com sua capa. O punhal, bonito, brilhou na manhã, refletindo a luz do sol.
7 Se ainda havia alguma dúvida de que ela era uma assaltante, a cena tratou de desfazê-la. Depois de, com os outros dois delinquentes, ameaçar a mulher e lhe arrancar a bolsa (ou só o dinheiro, a carteira), a jovem ladra, escolada, jogara a faca para debaixo do carro, a fim de se livrar do flagrante. Destemida, despachada, retornara, imediatamente, para se reapossar da faca – que certamente assustaria qualquer um, pelo tamanho. Não era uma faca comum, mas um punhal impactante.
8 Eu a encarei e lhe disse: “Olhe o que está fazendo. Você ainda vai se dar mal”. Ela sorriu (e neste momento parecia uma jovem como qualquer outra, não uma assaltante escolada) e, para dizer algo, disse que ia guardar a arma, como se tivesse acabado de praticar uma peraltice. Pensei ainda em lhe chutar a bicicleta, pular para lhe arrancar a arma, mas do momento que vai do pensamento à ação ela, ágil, já estava longe. A sua juventude, de certa forma, me imobilizara. Há pouco tinha sido uma menina, de cujo sorriso maroto ainda guardava vestígio. E suponho que ela não hesitaria em tentar me enfiar o punhal se eu buscasse tirá-lo de suas mãos.
9 Movidos pelo desejo de arranjar algum dinheiro aparentemente fácil, para comprar drogas, ir a baladas, beber – ou tudo junto –, esses jovens não titubeiam em assaltar em plena tarde de sexta-feira, no centro movimentado da cidade.
10 Por outro lado, é assim que, sem avaliar o perigo que nos cerca, imaginando-nos razoavelmente seguros numa rua às claras, movimentada, em pleno centro da cidade, a dois passos da Presidente Vargas, podemos ser surpreendidos por duas mocinhas e um rapaz, armados de um punhal cinematográfico (mas bem veraz). Além do assalto, podemos até nos ferir gravemente. É assustador. E pior: é real. É Belém. 

Tecnologia a serviço da paz

Por Gerson Nogueira

GERSON_08-11-2013Último grito na batalha contra os hunos e visigodos que infestam nossos estádios, a biometria facial é a tecnologia que os clubes de São Paulo planejam utilizar no Paulistão 2014. Testes feitos na Espanha, Alemanha e Inglaterra atestam a eficácia do sofisticado sistema de câmeras na identificação de suspeitos em estádios, aeroportos, estações de metrôs e outros pontos de grande aglomeração.

Espécie de Big Brother de amplos recursos, o único impeditivo para a adoção do sistema é o custo salgado da tecnologia. Dependendo dos locais monitorados e da quantidade de câmeras e pessoas envolvidas, pode atingir R$ 100 mil por jogo. Alarmada com o índice de ocorrências violentas nas praças esportivas, a cartolagem planeja buscar patrocinadores para tentar bancar a nova despesa.

Para grandes clássicos, que atraem até 60 mil espectadores, a solução parece ideal, como suporte as ações das forças de segurança. A biometria permite identificar e prender em flagrante bandidos que se disfarçam de torcedores para criar confusão nas arquibancadas. Funciona também como importante instrumento de apoio para as ações da Justiça, garantindo a comprovação de delitos.

Mais do que facilitar a repressão, o novo equipamento facilita a identificação preventiva de elementos já cadastrados como arruaceiros. De posse dessas informações, a polícia tem meios de impedir que se aproximem de locais de grandes jogos.

A oito meses da abertura da Copa do Mundo, todo esforço para reprimir o vandalismo nos estádios é bem-vinda, embora seja forçoso reconhecer o atraso na adoção de medidas segurança.

Aos que se preocupam com o preço a pagar pelo sistema, cabe recordar os termos do item inicial do capítulo I do Estatuto do Torcedor: “A prevenção da violência nos esportes é de responsabilidade do poder público, das confederações, federações, ligas, clubes, associações ou entidades esportivas, entidades recreativas e associações de torcedores, inclusive de seus respectivos dirigentes, bem como daqueles que, de qualquer forma, promovem, organizam, coordenam ou participam dos eventos esportivos”.

Em outras palavras, todos são responsáveis pela integridade dos torcedores de verdade, que pagam ingressos cada vez mais caros e ironicamente são as maiores vítimas da violência. É chegada a hora de gastar um pouco mais para garantir segurança e bem-estar a quem, em última instância, financia a festa. Tomara que o progresso chegue logo ao Pará, a tempo ainda de salvar o futebol da sanha dos bárbaros.

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Muricy de volta ao estilo brucutu

Depois de uma fase low-profile, de estudada simpatia, coincidentemente no período em que esteve desempregado e longe dos holofotes, Muricy Ramalho reapresenta sua persona hostil e ríspida com repórteres que comparecem a suas entrevistas. Entrevistado após a classificação do São Paulo às semifinais da Sul-Americana, distribuiu coices verbais, como se os profissionais ali reunidos tivessem a obrigação de aturar seus maus bofes.

É justo reconhece, porém, a habitual grosseria de Muricy costuma ser recebida por alguns jornalistas de São Paulo como algo folclórico, engraçado até. Essa benevolência contribui para a repetição dos gestos deseducados, que nada têm a ver com folclore ou simples rabugice. Denotam apenas má educação e ausência de civilidade.

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Time do Remo para o Parazão

Fabiano; Levy, Rafael Andrade, Carlinhos Rech e Alex Ruan; André, Jonathan, Wellington Saci e Eduardo Ramos; Zé Soares e Leandrão. Apesar dos seguidos desmentidos por parte de dirigentes, há gente forte no clube garantindo que esta pode ser a escalação do Remo para a estreia no Campeonato Paraense, no dia 5 de janeiro. Leandrão defendeu Botafogo e Internacional e joga há três anos no futebol árabe.

O clube negocia com outros jogadores, que podem ser confirmados até dezembro. Danilo Rios, Arlindo Maracanã e Zé Antônio (volante que defende o Paissandu na Série B) são alguns dos nomes especulados. Herrera, que chegou a conversar com representantes do Remo para ser o homem da camisa 33, foi praticamente descartado em função do alto salário.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 08)