O país de Caça-Rato

Por Xico Sá

Amigo torcedor, amigo secador, no país de Caça-Rato, símbolo da sobrevivência e herói do time do Santa Cruz, tudo é diferente da fantasia e da modernidade que tentam nos vender a cada instante, a cada clique, a cada moda. No país de Caça-Rato, o menino Paulo Henrique, 9, nada de braçada no esgoto do canal do Arruda, como na foto de Diego Nigro (JC Imagem), que assombrou o mundo esta semana.

No país de Caça-Rato, alguns, como o próprio jogador, escapam graças ao futebol, ao funk, ao rap, ao pagode. Muitos outros ficam no caminho, caça-ratinhos fadados ao limbo dos refugos humanos ou às balas nada perdidas da polícia – quase sempre morte matada antes dos 30.

No país de Caça-Rato, vale o libelo da música de Chico Science, no rastro das imagens do médico e escritor Josué de Castro (1908-73): o homem-caranguejo saiu do mangue e virou gabiru.

No país de Caça-Rato, as vidas são desperdiçadas, velho Bauman, muito mais do que nos exemplos do teu livro sobre o tema. No país de Caça-Rato só há o barulho dos roedores em sinfonia (wagneriana) com a denúncia permanente das tripas.

Neste país, não se diz estou abaixo da linha da pobreza ou qualquer outra frieza estatística, neste país se diz simplesmente “tô no rato”, o mesmo que estar lascado como um maxixe em cruz. O mesmo que estar na pele daquele roedor da fábula de Kafka, o bicho que vê o mundo cada vez mais estreito, sem saída à esquerda e muito menos à direita, restando apenas recorrer à orientação de um gato para não cair na ratoeira. O gato o orienta, civilizadamente, mas o abocanha na sequência.

No país de Caça-Rato, tudo é mesmo diferente. Estádio não é arena, não se sabe quem governa, e o Santa Cruz é muito mais que a seleção Brasileira. É a pátria dos pés-descalços, ouviram do canal do Arruda às margens fétidas e baldeadas.

O dialeto que se fala neste país não entra no Aurélio, mas sim no Liêdo, um sábio recifense, autor, entre outras joias, de “O Povo, o Sexo, a Miséria ou o Homem é Sacana”.

A alta gastronomia no país de Caça-Rato tem o aruá, o sururu –já bem escasso e artigo de luxo–, o mingau de cachorro e o caroço de jaca assado na brasa. O rei do camarote neste país sem fronteiras é conhecido como cafuçu, o avesso do playboy, mas uma criatura que capricha no estilo dentro das suas posses. O jogador do Santa Cruz que dá nome a este país é o príncipe dos cafuçus.

No reino de Caça-Rato, o menino que nada no esgoto no canal do Arruda é apenas uma foto que assombra a classe média. Não se fala outra coisa no país de Caça-Rato: que gente mais besta e limpinha, por que tanto barulho sobre uma cena tão repetida diariamente? O país de Caça-Rato sabe que daqui a pouco ninguém mais se lembra. O país de Caça-Rato funciona à prova de padrão Fifa.

Que árvores existem na Amazônia?

Por Fernando Reinach – no Estadão

Quantas espécies de árvores existem na Amazônia? Você não sabe? Não se preocupe, porque ninguém sabe. Mas agora cientistas obtiveram uma primeira estimativa. São aproximadamente 16 mil espécies. Essa descoberta veio com uma surpresa. As 227 espécies mais frequentes são responsáveis por 50% de todas as árvores presentes na região.

Mais de uma centena de cientistas se juntaram para estudar 1.170 quadrados de mata espalhados pelos 6 milhões de quilômetros quadrados de florestas que compõem a região amazônica. Cada um desses quadrados de 100 por 100 metros (o tamanho de um quarteirão) foi vasculhado palmo a palmo. As árvores foram contadas, identificadas e classificadas (a definição de árvore usada pelos cientistas é qualquer planta com um tronco com mais de 10 centímetros de diâmetro). Dado o tamanho da amostra, e a distribuição desses quadrados por toda a região, os cientistas acreditam que esses dados são suficientes para inferir a real biodiversidade de árvores presentes na região.

Nos 1.170 quadrados foram identificadas e classificadas 639.639 árvores, o que indica que na Amazônia a densidade média é de 565 árvores por hectare e o total de árvores existente na região é de 3,9 x 1011. Isso equivale a mais de 50 árvores por habitante do planeta Terra (somos aproximadamente 7,1 x 109 pessoas). Se cada um de nós derrubar uma árvore por dia, em menos de 2 meses liquidamos a floresta.

Nessa amostra de 639.639 árvores foram identificadas 4.962 espécies. O resultado mais surpreendente foi a distribuição das diferentes espécies. As 227 espécies mais abundantes da floresta representam 50% de todas as árvores presentes na amostra. As outras 4.750 espécies representam os outros 50% da amostra.

Em seguida, os cientistas organizaram as 4.962 espécies por ordem de representatividade na floresta. Para tanto, colocaram no eixo vertical de um gráfico a quantidade de indivíduos de cada espécie, e no eixo horizontal a posição da espécie no ranking de representatividade. Esse gráfico permite extrapolar uma reta que cruza o eixo horizontal na espécie de número 16 mil. É com base nessa extrapolação que os cientistas acreditam que devem existir aproximadamente 16 mil espécies de árvores nesse ecossistema. Esse número é muito parecido com o número de 15 mil espécies estimado por diversos outros métodos.

A distribuição desigual de espécies significa que, apesar da grande biodiversidade de árvores, um número pequeno de espécies é responsável por grande parte de todas as árvores, enquanto as outras espécies possuem poucos exemplares na região.

Essa desigualdade é enorme: 227 espécies cobrem 50% da floresta, 5.853 espécies cobrem 49,88% da floresta e as restantes 10 mil espécies cobrem 0,12% da floresta. Isso significa que as 6 mil espécies menos frequentes na Amazônia são extremamente raras. Os cálculos feitos pelos cientistas indicam que provavelmente elas possuem menos de 1 mil indivíduos em toda a região amazônica.

Essa descoberta tem implicações importantes para os estudos da região amazônica. Como grande parte da floresta é composta por um pequeno número de espécies, os cientistas acreditam que a floresta é provavelmente muito menos resistente às mudanças ambientais do que se imaginava. Se o ambiente se tornar desfavorável para uma fração das espécies dominantes, grande parte da floresta desaparece.

Além disso, a baixa frequência das espécies mais raras (com menos de 1 mil indivíduos em toda a região) torna praticamente impossível fazer um levantamento completo de todas as espécies presentes na região. É provável que muitas dessas espécies desaparecerão muito antes de serem identificadas.

Esse estudo é um bom exemplo do pouco que sabemos sobre a biodiversidade da Amazônia. Tal como a caixinha de Pandora, a floresta é cheia de surpresas.

* É biólogo

(Mais informações: Hyperdominance in The Amazonian Tree Flora. Science Vol. 342, pag. 1243093 2013)

Para continuar sonhando

Por Gerson Nogueira

No primeiro turno, em Itápolis, o Paissandu perdeu por puro descuido. O jogo era equilibrado e, num vacilo, o Oeste foi lá e beliscou a vitória. O desfecho daquele confronto deve servir de balizamento para o confronto decisivo de hoje à tarde.

O visitante, que é o 13º colocado na classificação da Série B, joga fechadinho mesmo quando se apresenta em casa, imagine fora. Jamais se arrisca, preferindo explorar contra-ataques e bolas aéreas. Bem perto de garantir permanência na Segunda Divisão, pois precisa de apenas três pontos, o time paulista vem disposto a conquistar um empate.

bol_sab_091113_11.psNada muito diferente do que costumam fazer os demais times da Segundona. Quase todo mundo se agarra a esquemas cautelosos, com oito ou mais jogadores atrás da linha da bola e defesas superpovoadas. Os placares apertados e as raras goleadas refletem bem a situação.

Com base nisso, é de esperar que o embate de hoje seja truncado, com forte marcação no meio-de-campo e poucas oportunidades de gol. Aumenta então a responsabilidade dos homens de frente, que não podem desperdiçar as chances que forem criadas.

Sem Pikachu, o Paissandu perde muito de seu poder de fogo pelas extremas e fica dependendo quase que exclusivamente das jogadas de Eduardo Ramos. Como terá dificuldades para chegar pelos lados, a equipe de Benazzi terá que se aproximar com jogadas rápidas pelo meio.

Careca e Marcelo Nicácio terão a companhia de Ramos e Jailton para enfrentar a defensiva do Oeste, que nas últimas partidas como visitante sofreu derrotas por escore dilatado – perdeu para o ASA e o Sport, ambas por 3 a 0.

Contra América-MG e Joinville, o Paissandu voltou a apresentar oscilações de um tempo para outro. Em Belo Horizonte, esteve bem na fase inicial do jogo, mas recuou muito na parte derradeira. Em Joinville, o time foi improdutivo nos 45 minutos iniciais e empreendeu uma boa reação no segundo tempo.

Caso reproduza a determinação e o apuro defensivo da vitória contra o América, o Paissandu tem boas possibilidades de conquistar três pontos fundamentais na corrida contra o rebaixamento.

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Braga bate Dragão e ajuda Papão

Os resultados dos concorrentes diretos do Paissandu continuam a ser extremamente favoráveis ao time paraense. Ontem à noite, o Bragantino derrotou o Atlético-GO por 2 a 0, mantendo o Dragão com 35 pontos e abrindo perspectiva para que o Papão saia da zona em caso de vitória hoje em Belém.

A outra partida que interessa diretamente é ABC x Icasa. Um tropeço do alvinegro potiguar seria de extrema valia para o campeão paraense a essa altura do campeonato. Tudo isso, obviamente, só ajuda se o próprio Papão se ajudar.

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Desencanto atinge jovens craques

Lucas, protagonista de uma das transações mais vultosas do futebol brasileiro, pode estar retornando ao São Paulo depois de não conseguir se firmar no PSG. Para a expectativa criada em torno de sua ida para a França, o jovem meia-atacante decepcionou em sua primeira temporada europeia.

Candidato a ídolo do clube parisiense, Lucas deu o azar de disputar a condição de craque do time com o sueco Ibrahimovic. Eclipsado pelo estilo exuberante do sueco dentro e fora de campo, demonstra cada vez mais desencanto com a França e saudades do Morumbi.

Para piorar, Lucas perdeu lugar na Seleção Brasileira de Felipão. De certa forma, caso a volta se confirme, Lucas vai seguir os passos de outro jovem atacante igualmente saudado como grande promessa de craque: Alexandre Pato, que voltou ao país e ainda não engrenou no Corinthians.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO deste sábado, 09)