Em mau estado

Por Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo

“Lula livre” se insere em momento muito particular da difícil batalha pela democracia na América Latina.

O povo chileno explode como uma bomba de retardamento contra a opressão econômica, e inovações justiceiras são inevitáveis. No Equador, o eleitorado traído de Lenín Moreno tomou-lhe as forças e cobra a dívida multissecular.

Na Argentina renasce uma ideia de solidariedade latino-americana contra a sufocação imposta pelas políticas econômicas elitistas. O México reencontra com López Obrador uma concepção de soberania real e sentido de democracia. Esse tabuleiro parecia ter uma casa reservada para Lula, em lugar estratégico.

Até onde permanecerá a liberdade de Lula é a primeira incógnita que sua nova condição propõe. Não só pela combinação de pendências judiciais e má disposição de parte do Ministério Público e do Judiciário quanto a esses processos, e outros imagináveis.

O bolsonarismo, no Congresso e fora dele, teve uma derrota que afinal lhe contrapõe um obstáculo na paisagem política, até aqui verdejante, da sua perspectiva.

Além disso, duas manifestações (duas até a elaboração deste texto) transmitem a contrariedade do segmento militar com a nova situação que também o derrota. A liberdade de Lula tem inimigos ativos.

O comentário do vice e general Hamilton Mourão ao restabelecimento do princípio constitucional da presunção de inocência, até que completado o trâmite do processo penal, foi claro na mensagem e no destinatário: “O Estado de Direito é um dos pilares da nossa civilização, assegurando que a lei seja aplicada igualmente a todos, mas hoje, 8 de novembro de 2019, cabe perguntar: onde está o Estado de Direito no Brasil? Ao sabor da política?”.

A resposta é simples: o Estado de Direito está no texto da Constituição. Só nele, em letras. E não em qualquer outra parte mais. Não há Estado de Direito onde um general (Eduardo Villas Bôas) pressiona e intimida a corte suprema do país, contra decisão com eventual benefício a um político preso — por deduzido e improvado crime comum, não por tentativa ou golpe contra a Constituição, como tantos já fizeram aqui tantas vezes.

Nem há Estado de Direito onde o mesmo porta-voz, colhido o efeito desejado na primeira investida, volta à mesma pressão intimidatória antes de nova decisão da corte maior.

Não pode haver Estado de Direito onde o poder militar, poder armado, pretende definir o destino judicial e cívico de um político. Não ao sabor da Constituição. “Ao sabor da política?” Não. Ao sabor da força das armas, fornecidas pelo restante da população para a defesa da nação —esta fusão fascinante de povo, Constituição, leis, território, cultura, costumes, história—, e não só do capital privado.

No Estado de Direito em vão procurado pela pergunta acabamos de saber que ao começar o ano já eram 13,5 milhões os miseráveis, 50% a mais sobre os 9 milhões de quatro anos antes.

Diz o levantamento que são pessoas vivendo com menos de R$ 145 por mês. Menos de. Dispõem em média, portanto, no máximo R$ 4,83 por dia. Como comem, essas pessoas? Como se aguentam por todo um dia, por todos os dias, com a miséria de comida a que têm acesso? É insuportável pensar nisso. É insuportável pensar no tratamento dado aos pedintes, no descaso com esses farrapos de vida. Não vivem em Estado de Direito, estão condenados ao estado de miséria.

Bolsonaro proíbe a queima do maquinário de mineradores clandestinos na Amazônia. Já está claro: há um pedido dele para formulação de medida que legalize essa atividade. No Estado de Direito não se legalizaria o crime. Tanto mais por haver indícios fortes de que o controle dessa mineração está em milícias, com policiais e ex-policiais, não sediadas só na Amazônia. É o novo poder em expansão. Contra o direito do Estado e o Estado de Direito.

Na sessão do Supremo que reconheceu a Constituição e contrariou os defensores, na dura acusação do decano Celso de Mello, prática “própria de regime autoritário e autocrata”, Dias Toffoli puxou uma rodada de informações e considerações, muito impressionantes, sobre a criminalidade, a impunidade e a situação prisional no Brasil.

Mas não precisariam ser todos tão caudalosos. Bastaria lembrar que nem o clamor público, interno e internacional, foi capaz de vencer a barragem entre o assassinato de Marielle e Anderson e o que seria a investigação honesta do crime, seus antecedentes e envolvimentos pessoais: corrupção, milícias, vários crimes, poder, todos vasculhados e revelados.

Sem o Estado de Direito, o que viceja é o Estado de direita.

Talvez agora a Folha aprenda a lição

Por Leandro Fortes

No início de 2009, quando a corrida presidencial de então se anunciava com uma candidata escolhida por Lula – Dilma Rousseff – para sucedê-lo, a mídia brasileira havia se convertido em um esgoto de mentiras e meias verdades. 

Em abril daquele ano, a Folha de S.Paulo, disposta a superar os inenarráveis O Globo e Veja, publicou, na primeira página, uma ficha falsa de Dilma. Um pseudo documento do DOPS, alusivo à ditadura militar, dando conta de supostas atividade terroristas da candidata do PT.

Era lixo puro, roubado de um site de extrema direita frequentado pela turma de Bolsonaro, que já circulava pelas incipientes redes sociais de então. 

Mas a Folha bancou, na primeira página. 

Dilma reagiu com civilidade, a Folha reconheceu o erro de forma canalha, sem assumir a culpa pela divulgação, e ficou por isso mesmo. 

Eleita, Dilma ainda se deu ao desfrute de ir discursar no aniversário de 90 anos do jornal, em 2011 – um daqueles ataques de republicanismo que iriam ajudar a direita a moer os governos petistas. 

Ou seja, a Folha foi cruel, infame, mentirosa e cínica com Dilma, como já havia sido com Lula, mas jamais sofreu retaliação ou ameaça dos governos petistas. Seus jornalistas continuaram a ser tratados com respeito e consideração, no Palácio do Planalto. 

Uma década depois, ao fazer uma reportagem verdadeira sobre o presidente da República eleito no rastro de destruição nacional que a Folha, em nome do antipetismo, ajudou a construir, o jornal passou a ser tratado como inimigo da nação.

Bolsonaro insulta publicamente o jornal e seus jornalistas. O secretário de imprensa do governo, um zé-ninguém, insinua cortes de publicidade.

E, ironia do destino, a Folha é, tardiamente e pelos motivos errados, chamada de esgoto.

Talvez, agora, aprenda a lição. 

Os dois aniversários de Lula

Luiz Inácio da Silva, o ex-presidente Lula é mesmo síntese do seu tempo. Nascido em 27 de outubro de 1945, em Vargem Comprida, localidade de Caetés, no interior de Pernambuco – na época um distrito do município de Garanhuns, o sétimo filho de Aristides Inácio da Silva e Eurídice Ferreira de Melo, a “dona Lindu” só foi registrado anos mais tarde e acabou com a data de nascimento no documento diferente: 6 de outubro.

Na casa de dois cômodos e chão de terra batida no Semiárido pernambucano onde Lula nasceu não tinha luz, água encanada ou banheiro. Foi com sete anos que veio de pau-de-arara para o Sudeste, cumprindo o mesmo caminho de milhares de outros brasileiros, “despencou” para São Paulo com a mãe e os irmãos, a fim de reencontrar o pai, que havia migrado semanas antes de Lula nascer, em busca de uma vida melhor longe da seca e da miséria.

Segundo conta o irmão mais velho em entrevista, José Ferreira de Melo, o Frei Chico, responsável pela filiação do ex-presidente ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo anos mais tarde, em 1966, a dificuldade de mobilidade, a precariedade da localidade no interior de Pernambuco e da família na época fazia com que as crianças nascidas só fossem registradas de tempos em tempos.

Enquanto não tinham o documento oficial, eles usavam o que se chamava de batistério, documento que comprova a execução do sacramento do batismo católico, onde constava data de nascimento e local. Foi com este documento que as crianças da família Silva viajaram de Pernambuco para Vicente de Carvalho, no litoral de São Paulo, em 1952. A viagem de pau-de-arara durou 13 dias.

Frei Chico conta que Dona Lindu também sé teve documento de identidade original pouco antes de ir para São Paulo, providenciado exatamente por conta da viagem. As crianças da família tinham somente o batistério. Foi já no estado de São Paulo que os documentos foram providenciados.

“Um dia minha mãe foi ao cartório em Santos registrar os filhos. Levou anotado todos as datas e os nomes. Mas acredito que ficou intimidada pela atitude da escrivã, que sugeriu mudar o nome da minha irmã, ali, na hora de Sebastiana para a Ruth, seu próprio nome [neste momento Frei Chico ri] em sua “homenagem”, e ela acabou se atrapalhando com tantas datas”, disse o irmão, que também tem data errada anotada em seus documentos.

Com clareza do equívoco cometido no ato do registro, Dona Lindu manteve a tradição de parabenizar o filho Lula sempre no dia 27 de outubro, ao invés do dia 6. “Não havia festa nem nada, claro. Éramos muito pobres. Mas Lula sempre considerou seu aniversário o dia original, 27, e depois de adulto passou a comemorar com os filhos na data correta”, diz. “Foi só depois de ter nossos próprios filhos que aniversário passou a ter algum tipo de comemoração, festa.”, explica.

Com família grande, o ex-presidente Lula acostumou-se a ter filhos, noras e netos reunidos em pequenas comemorações caseiras coma presença de bons e poucos amigos. Já presidente, no Palácio da Alvorada, a residência oficial, festas foram organizadas pela sua família e equipe, sempre no dia 27 de outubro.

A militância costuma comemorar e parabenizar Lula nas duas datas. Este ano não será diferente, a começar com as este domingo, 6, com manifestações na Vigília, mas assim como a família, os admiradores do ex-presidente também concentram esforços para o dia 27 de outubro e torcem para que a festa seja com a presença do aniversariante.

Livro de Lula concorre ao Prêmio Jabuti

Do Comitê Lula Livre.

“A verdade vencerá” pode fazer de Lula o primeiro ex-presidente com o Prêmio Jabuti na estante

Assine o abaixo-assinado para anular os julgamentos de Lula

A 61ª edição do prêmio Jabuti divulgou a lista dos dez livros indicados para cada uma das 19 categorias da principal premiação da literatura brasileira. Entre os finalistas está “A verdade vencerá”, de autoria do ex-presidente Lula e publicado pela Boitempo e El Viejo Topo. Com a indicação, Lula se junta a FHC entre os ex-presidentes indicados ao prêmio.

Na publicação, o ex-presidente concede uma longa entrevista, de mais de 100 páginas, à editora da Boitempo, Ivana Jinkins, e aos jornalistas Gilberto Maringoni, Maria Ines Nassif e Juca Kfouri. Além da conversa, há textos de Luis Fernando Veríssimo, Luis Felipe Miguel, Eric Nepomuceno, Rafael Valim e Camilo Vannuchi.

“A verdade vencerá” foi lançado no Brasil em março de 2018, pouco antes do TRF-4 expedir mandato de prisão ao ex-presidente, e chegou a constar entre os mais vendidos. Foram horas de conversa aberta e sem temas proibidos, divididas em três rodadas, que aconteceram no Instituto Lula, em São Paulo, nos dias 7, 15 e 28 de fevereiro.  Entre os principais temas discutidos, está a análise inédita do ex-presidente sobre os bastidores políticos dos últimos anos e o que levou o Partido dos Trabalhadores a perder o poder após a reeleição de Dilma Rousseff. Lula também fala sobre as eleições de 2018 e suas perspectivas e esperanças para o País.O livro concorre na categoria “Inovação – Livro Brasileiro Publicado no Exterior” ao lado de obras como “Brasil: Uma biografia”, de Lilia Schwarcz e Heloisa Murgel Starling, e “A resistência”, de Julián Fuks. Se vencer, Lula será o primeiro ex-presidente brasileiro a levar a premiação.

Fonte: Fórum

Vote no mico da semana

Escolha seu macaco preferido e se agarre a ele, com argumentos…

1) Meia Tiago Galhardo, do Remo, reclama da chuva e do mau estado do gramado durante pré-temporada em Castanhal. Coitado, não viu nada ainda. Deixa ele pegar aquele barranco do Zinho Oliveira e o pântano do Parque do Bacurau.

2) Marcelo Nicácio conversou com os dirigentes do Paissandu, encaminhou proposta, pediu tempo para pensar e nessa enrolação toda passou três semanas. Para, no fim de tudo, fazer beicinho e ficar no Vitória.

3) Presidente da FPF justifica o não-patrocínio do Parazão pela Chevrolet, alegando que a grana era mixaria e que já havia contrato com o Governo. Potoca. Vários outros campeonatos patrocinados por governos fecharam com a montadora.