Flor de melancolia

Por Armando Nogueira

As moças de hoje em dia parecem gostar, cada vez mais, de futebol. Conheço algumas que torcem, fervorosamente. Neusa, botafoguense, é uma dessas. Por sinal, bonita e brilhante. É a própria versão mulher da Estrela Solitária. Enfim, deixa pra lá que o assunto é outro. Neusa pergunta se vi jogar Quarentinha, campeão com o Botafogo, em 57.
Como vi! Quarentinha era uma atacante de respeito. Tinha na canhota o que, então, se chamava um canhão. Chutava muito forte, principalmente, bola parada. Era de meter medo. Nos jogos Botafogo-Santos, era ele, de um lado, o Pepe, do outro. Ai de quem ficasse na barreira.
Quarentinha nasceu no Pará, filho de um atacante e lhe herdou, intactos, o chute poderoso e o apelido. Não sei se o pai era tão tímido quanto o filho. Quarentinha jamais celebrou um gol, fosse dele ou de quem fosse. Disparava um morteiro, via a rede estufar, dava as costas e tornava ao centro do campo, desanimado como se tivesse perdido o gol.
“Sempre que o via voltando da área, cabisbaixo, eu o imaginava a parodiar, bem baixinho, os versos de Manuel Bandeira: ‘Faço gol como quem chora / Faço gol como quem morre.’ Era uma flor de melancolia o Quarentinha. Que Deus o tenha.” (Contribuição oportuna do amigo Fernando Jares Martins, do excelente blog Pelas Ruas de Belém)

6 comentários em “Flor de melancolia

  1. Caro Gerson,

    Homenagem pra lá de merecida a que você vem fazendo ao grande jornalista Armando Nogueira.
    Ouso aqui repassar crônica sobre o Paysandu, do ano de 2002 intitulada “A alma paraense” que “roubei” do excelente blog http://paysandu.tumblr.com/, que fala das conquistas do time naquela ocasião, e que mostra com clareza como o cronista era amante do esporte, independente de que região ele fosse.
    Grande abraço

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  2. A alma paraense – crônica de Armando Nogueira

    O Paysandu está pegando um Ita no Norte e desembarca com toda corda no Campeonato Brasileiro. É tricampeão dentro de casa, é campeão do Norte e acaba de ser pra sempre consagrado na Copa dos Campeões. Pra mim, que também sou daquelas bandas, o Paysandu é bem mais que um bom time de futebol. Se o Flamengo é um estado d’alma, o Paysandu é a própria alma paraense. É pimenta de cheiro, é o Círio de Nazaré, é tacacá com tucupi, é Eneida de Morais, tia de Fafá, mãe de Otávio, campeão botafoguense. É palmito de bacaba, é Billy Blanco, é açaí, é Jayme Ovalle, inventor do Azulão, tom profundo do azul-celeste, campeão dos campeões. E sempre será também Fafá de Belém, Leila Pinheiro, Jane Duboc, canto e contracanto ao violão de Sebastião Tapajós, fluente como o rio que lhe dá o sobrenome.

    O Paysandu é feijão de Santarém, é farinha de mandioca, é jambu, é manga-espada, é maniçoba que Raimundo Nogueira servia, declamando Manuel Bandeira:

    “Belém do Pará, onde as avenidas se chamam Estradas. / Terra da castanha / Terra da borracha / Terra de biribá bacuri sapoti / Nortista gostosa / Eu te quero bem. / Nunca mais me esquecerei Das velas encarnadas, Verdes, Azuis, da Doca de Ver-o-Peso / Nunca mais / E foi pra me consolar mais tarde / Que inventei esta cantiga: Bembelelém, Viva Belém! Nortista Gostosa / Eu te quero bem.”

    Paysandu, permita-me parafrasear Caymmi, cantando teu troféu de imensa glória: Agora, que vens para cá/ Um conselho que mãe sempre dá/ Meu filho, jogue direito que é pra Deus te ajudar.

    Crônica publicada em 07 de agosto de 2002.

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  3. José Luiz, você poupou-me um grande esforço em encontrar essa belíssima crônica e espero que ela chegue até os atletas alvi-azuis que encontram-se em São Paulo, para que eles tenham uma pequena idéia da força e da tradição que a camisa do “prá sempre consagrado Campeão dos Campeões” tem.
    Valeu, José Luiz.

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