Por Antonio Valentim
Como o amigo e seus leitores sabem, por meio dos meus comentários neste espaço democrático, sou adepto da profissionalização – fora das quatro linhas – do futebol paraense. Alguns se perguntarão: “Como profissionalização, o futebol há muito já é profissional?”. Sob certos aspectos sim, é verdade. O atleta de futebol é um trabalhador contratado e remunerado, e o quesito ‘profissionalização’, a nosso ver, não vai muito além disso e de algumas outras ações burocráticas. Ou seja, somente o lado de lá; do lado de cá, está bem distante.
Acompanho futebol desde os anos 70, e vejo que as ações, a mentalidade reinante, salvo exceções, não evoluiram muito. Naquela época, em que alguns jogadores ficavam no clube por vários anos, a bilheteria ainda sustentava um clube de futebol. As coisas mudaram, o próprio comportamento do torcedor mudou. Naquele tempo não havia estatuto do torcedor, código de defesa do consumidor ou coisas do gênero, e o pobre torcedor se sujeitava a ir a campo, pegar chuva e ainda urina na cabeça. Algumas pessoas, todavia, ainda estão nessa época, pensando igual.
Os resultados em campo, na época, davam a Remo e Paysandu condições de igualdade, para dizer o mínimo, com clubes do Ceará, Pernambuco,Bahia, Goiás, Paraná e Santa Catarina. Nossos times eram respeitados. Com o tempo, a gestão do futebol se tornou bastante profissional, e somente nossos dirigentes não viram, não se profissionalizando junto.
Na década recém-finda, o Paysandu fez bela figura, destacando-se no cenário brasileiro. Porém, como sua diretoria não foi capaz de gerencar profissionalmente todo o sucesso, vê-se agora tudo o que foi conquistado esvair-se através dos dedos como se fosse água nas mãos. O cavalo selado foi montado, porém não se cuidou direito dele e ele … morreu. Do lado remista, o último feito a nível nacional foi a campanha da Copa João Havelange de 2000, sob o comando do técnico Paulo Bonamigo. Depois disso, alguns lampejos, ainda tímidos, a nível local como aquele campeonato 100% em 2004. São as exceções a que me referi antes.
A figura do dirigente torcedor deve acabar. A do abnegado que injeta dinheiro também deve acabar. O primeiro, a reboque do torcedor imediatista, age com muita passionalidade, contratando por atacado, dispensando idem, e assim onerando o clube; isso impede um planejamento efetivo, cujos frutos certamente seriam colhidos no futuro; o segundo acaba se achando o dono do clube, e só ele manda (‘eu pago, eu mando’ – já dizia um ex-presidente de um clube de Belém). As pressões, da parte do torcedor, da parte de uma parcela da mídia – já que esta reverbera a opinião do público -, vão continuar a existir, pois ninguém gosta de ver o seu time perder; o torcedor quer seu time ganhando sempre, de preferência com goleada e não levando nenhum gol. Um dirigente de clube como Remo e Paysandu deve, no entanto, estar preparado para suportar pressões, e agir sempre com a cabeça no seu devido lugar. Deve, para tanto, acercar-se de bons gestores – remunerados, de preferência – de quem deve cobrar os resultados ao longo de um exercício, conforme as metas que se definiram previamente.
Essas figuras, algumas até folclóricas, deviam ter sido extintas nos anos 70 e 80.
Não vejo o futebol paraense – diferente de outras praças – agindo com planejamento, não há investimentos sérios nas categorias de base, tampouco projetos a médio e longo prazos. A cada diretoria que sai, entra a próxima com seus próprios planos e o pouco – ou quase nada – que foi feito é abandonado.
Há pouco tempo a diretoria do Remo tomou, obcessivamente, como bandeira a negociação do estádio Evandro Almeida, sob a forma de permuta por outro, mais moderno, porém mais distante do centro da cidade. A ideia por si era boa, porém a forma como se pretendia fazer era ruim, e o clube acabaria por perder um patrimônio histórico e ficar sem ter onde treinar, pelo menos.
Digo que a ideia não era de todo ruim porque qualquer outra ideia ou projetos só podem ser levadas adiante com dinheiro. E vejam que o Remo, principalmente o Remo, está com um passivo imenso. Só que para ele ainda há solução, e a venda – honesta, transparente, lúcida – de um patrimônio salvará a lavoura e evitará que a vaca vá para o brejo (e olhe que ela está quase lá). E não precisava ser o Baenão, e eu proporia o ginásio Serra Freire.
Ora, anunciando-se no mercado paulista, de maior expressão no país, é bem possível uma negociação a preços próximos do mercado. Tudo isso, claro, com divulgações em jornais, internet, publicações mensais de balanços, como se exige de uma empresa pública.
Ah, um clube não é empresa pública? Sabemos disso, mas clubes como Paysandu e Remo somente são grandes pela simpatia de público que granjearam, pela rivalidade entre ambos, ao longo de quase um centenário.
Quero ainda ver nossos clubes implantando a gestão como se empresas fossem, se gastando menos do que se recebe. Ver ainda o quesito bilheteria ser apenas uma pequena complementação no rol das receitas, privilegiando o associado. Quero ver o associado bancando o clube, que complementaria sua receita eventualmente com a negociação justa de seus craques formados nas divisões de base. Quero ver ainda os clubes explorando devidamente a sua marca…
As ideias estão aí, tanto do lado do Remo como do lado alvi-azul. É o projeto sócio-torcedor, é o famoso CT etc. E cada um de nós tem uma, mas nenhuma vai sair do papel sem o famoso e necessário din-din. Sem ele não se extirpa o câncer das dívidas que asfixiam os nossos clubes, sem ele jamais vai se implantar o verdadeiro profissionalismo de gestão desejado e merecido pelo nosso torcedor, que lamentavelmente ainda verá seus times a tropeçar nos Vila Aurora ou nos Salgueiros da vida. (L.s.N.S.J.C!)