Há uma semana, quando o Flamengo assumiu a liderança do campeonato pela primeira vez, vaticinei aqui a definição antecipada do Brasileiro. Achava, como quase todo mundo, que a decisão contra o Grêmio já sem ambições, em pleno Maracanã, seria mero cumprimento de tabela. Favas contadas para o time de Andrade, ainda mais depois que o tricolor gaúcho inventou de poupar titulares e lançar reservas e juniores.
Ledo engano. O Grêmio foi o Grêmio de sempre. Marcou o campo inteiro e mostrou apetite ofensivo inesperado. Coisa de visitante interessado em estragar festa alheia. Quase conseguiu. E esse esforço não foi em vão, apesar da derrota: salvou o campeonato.
Refiro-me ao aspecto moral da decisão. Ao longo da semana, o país foi bombardeado por notícias da torcida do Grêmio exigindo que o time entregasse os pontos no Rio, a fim de não permitir que o rival Internacional comemorasse o título – já que teria (como teve) um jogo mamão-com-açúcar no Beira-Rio, contra o Santo André.
Pois o técnico Marcelo Rospide e seus garotos ignoraram a pressão interna e se atiraram à luta como se buscassem o título. Foi o jogo de suas vidas, daquelas pelejas que não deixam dúvidas. Com isso, sepultaram as desconfianças, honraram as cores gremistas e dignificaram a competição.
Do Flamengo, pode-se dizer que ontem não foi o mesmo das últimas jornadas. Nervosismo, pressão e ansiedade pesaram na hora H. Além disso, havia a surpresa pela firme resistência do adversário. Em alguns momentos, parecia até aquele Flamengo opaco do empate com o Goiás e isso deve ter deixado sua torcida com os nervos em frangalhos até o começo do segundo tempo.
Dois coadjuvantes acabariam safando a onça, com gols decisivos, numa tarde em que as estrelas Petkovic e Adriano estavam sem o brilho esperado. Um título merecido, conquistado com justiça a partir da arrancada irresistível no segundo turno. Se os adversários não souberam liquidar a fatura antes – e tiveram condições para isso –, problema deles. O Flamengo fez o que tinha de fazer. Ao Grêmio, menção honrosa pelo belo papel de coadjuvante na festa final.
Andrade, recordista de conquistas do Brasileiro como jogador (cinco vezes), quebra um tabu curioso: é o primeiro técnico negro a levantar a taça. Serve como reflexão para quem não admite o quanto o futebol pode ser preconceituoso.
O Botafogo lutou bravamente para escapar à degola. Com os sustos previsíveis, levando um sufoco no final, conseguiu a salvação e demoliu com o ano palmeirense. De quebra, tisnou o currículo de Muricy Ramalho.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta segunda-feira, 7)