Quem interpretar a crise do Senado tão somente pelo olfato, isto é, pelo mau cheiro que exala dos descalabros da Câmara Alta, fará um leitura distorcida. A fetidez é real, todavia é seletivamente usada como arma política. Sem discurso, sem bandeiras, a dupla PSDB-DEM parece ter concluído que a fedentina é o único combustível que lhe resta para tentar reaver o poder no próximo ano.
Nada de novo. Lembra-se o internauta de 2005? O presidente Lula era apresentado como chefe de uma quadrilha, atolado na lama até o meio da canela. E as velhas raposas da oposição, gente inclusive com folha corrida na polícia, apareciam na TV com auréola de anjos & santos.
O presidente do Senado, José Sarney, sofre uma implacável caçada. Na Praça dos Três Poderes, a oposição e a grande mídia ergueram um patíbulo. A sentença já foi lavrada. “Eis o responsável pela sujeira. Que seja enforcado o quanto antes, para o bem do Poder Legislativo.”
O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), apresentado como espécie de guardião do templo, foi o ungido para, em nome do conluio, proclamar o veredicto. Todavia, dias antes, sem rubor no rosto, reconheceu na tribuna, que viajara à França. Merecidas férias. Desafortunadamente, teve “problemas” com os cartões de crédito. De fato, Paris é encantadora mas, lastimavelmente cara. Então, os seus diletos assessores foram ao todo poderoso ex-diretor geral do Senado, Agaciel Maia que, gentilmente, socorreu o senador com um empréstimo de 10 mil reais, ou 10 mil dólares. Há controvérsias. Graças à benevolência de Maia, Virgílio pode concluir seu descanso no Velho Mundo.
Depoimento solene, mostrado no horário nobre dos telejornais. Depois, o âncora diz, “vamos ouvir nossos comentaristas”. E os doutos especialistas não dizem uma só palavra sobre a confissão de sua excelência. E repetem, em ladainha, a sentença que lhes interessa: “Sarney, a bem da sua biografia, do sossego de sua família, do Senado, tem que sair da presidência. Bem está com a razão, o líder do PSDB…” Na manhã seguinte ao episódio, os jornalões fizeram o mesmo. Artur Virgílio, o paladino da moral, pedia a cabeça de Sarney. Nenhuma linha, sobre o empréstimo de Agaciel Maia ao tucano.


