Por Gerson Nogueira
Carlos Bianchi fez o Boca Juniors marchar com impecável perícia tática sobre o Corinthians – sem entrar no mérito dos erros do árbitro paraguaio –, disfarçando meticulosamente as inúmeras rachaduras do time. Essa competência força um olhar crítico sobre a herança maldita legada ao futebol do Brasil por três gerações de “professores” da bola.
De maneira geral, o futebol argentino nem serve de parâmetro nesse departamento. Lá, como cá, os técnicos andaram atrapalhando bem mais que ajudando, mas duas figuras se sobrepõem a todos os seus colegas brasileiros. Marcelo Bielsa e Carlos Bianchi. Ambos posicionam-se, por currículo e notório saber, entre os melhores do mundo.
A indigência nacional se consolidou na transformação operada desde o final dos anos 70. Em pouco mais de quatro décadas, a pátria dos craques virou latifúndio dos treinadores. A transição, mais danosa do que se possa imaginar, passou despercebida de início, mas suas consequências são bem visíveis hoje.
Os times são montados de acordo com a conveniência e os caprichos dos comandantes, o que pode ser muito bom quando os técnicos sabem o que fazem. No caso brasileiro, infelizmente, isso não ocorre. A alta rotatividade de comando nos clubes atesta que a categoria – bem paga, apesar dos maus passos – não prima pela excelência.
Felipão, Luxemburgo, Abel, Muricy, Tite e Cuca integram a elite dos técnicos em atividade no país. Responda rápido: algum deles teria chance de ser contratado por um grande ou médio clube europeu? Qualquer torcedor, por mais desligado, sabe que não.
As últimas chances dadas aos nacionais – Felipão no Chelsea e Luxemburgo no Real Madri – resultaram em rotundos fiascos. Desde então, a Europa parece ter compreendido que o Brasil pode ter bons operários da bola, mas só acumula fracassos na formação de comandantes.
Desgraçadamente, o desprestígio no mercado internacional não arranhou o cartaz interno dos técnicos. Aqui eles agem como reis, ditam ordens, dão entrevistas quilométricas, exigem (e recebem) fortunas. Como ditadores, não permitem espaço para o intercâmbio ou a importação de mão-de-obra qualificada. Quando se falou em Pep Guardiola para dirigir o escrete foi um deus-nos-acuda.
Nem clubes citados como referência em gestão, como o Grêmio, escapam à ação deletéria de treinadores arrogantes. O tricolor gaúcho entregou a Luxemburgo seu projeto para a temporada e, depois de cinco meses, amarga o dissabor da eliminação na Libertadores e a perda do certame gaúcho. Mais grave ainda é constatar que, depois de gastar uma pequena fortuna (por baixo, cerca de R$ 80 milhões), não tem um time pronto.
Na mesma proporção em que os técnicos acumulam poder quase absoluto, os times passaram a jogar de maneira ridiculamente igual e monótona. Defesas fortíssimas se sobrepõem aos ataques, com a óbvia preocupação de garantir o emprego dos treinadores. Não por acaso, o futebol nacional só é bem representado na Europa por zagueiros e volantes – Tiago Silva, David Luiz, Daniel Alves, Marcelo, Ramires, Hernanes…
Dane-se a tradição ofensiva do Brasil pentacampeão do mundo. Os técnicos decidiram que não se pode exagerar com essa coisa de ficar atacando a todo instante. Inteligente é fechar os times, marcar muito e deixar a coisa rolar.
Resulta disso aí a pálida Seleção Brasileira atual e o papelão dos clubes na Libertadores. De seis representantes, restam dois. A exceção à mesmice é o Atlético-MG de Cuca, que troca mais de quatro passes e ataca com até seis jogadores. Joga bonito, faz muitos gols e vence. Tão diferente do resto que lembra até um certo Brasil bom de bola.
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Uma final com jeito de amistoso
Mesmo depois da dura lição que o modesto Naviraiense impôs na quarta-feira, não há como não ver a decisão deste domingo como simples amistoso. Um jogo que só tem a finalidade de cumprir tabela. Os quatro gols de diferença favoráveis ao Paissandu afastam qualquer risco de zebra, mesmo que o PFC tivesse a fibra e o denodo do outro Jacaré, afinal abatido pela incompetência de seus gestores.
A notícia sobre a provável permanência do Papão na Copa do Brasil foi o melhor que podia ter acontecido à final do campeonato. Com o fiasco em campo superado pela iminência de vitória no tapetão, o torcedor alviceleste readquiriu a autoestima e deve prestigiar a partida decisiva.
Para que o time deixe a apatia vista na Curuzu no meio da semana é fundamental que Capanema reorganize a marcação e, principalmente, que Eduardo Ramos volte a jogar bola. Sua atuação opaca diante do Jacaré do Cone Sul foi determinante para o mau resultado. Um meia-armador com o seu talento não pode ficar tão indiferente ao confronto.
Claro que as péssimas condições do campo contribuíram para o pífio rendimento dos jogadores mais técnicos, como Ramos, mas não justificam a baixa participação. Que o gramado quase bom do Mangueirão inspire o camisa 10 a reeditar seus grandes momentos no campeonato, justificando a condição de melhor jogador do campeonato.
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Bola na Torre
O programa começa por volta da meia-noite, depois do Pânico na Band, com apresentação de Guilherme Guerreiro. Giuseppe Tommaso, Cláudio Guimarães e este escriba baionense completam a bancada. Em pauta, o Parazão e a Copa do Brasil.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO deste domingo, 19)