Tragédia expõe pobreza de um porto rico

POR LUIZ OCTAVIO LUCAS

Cinco mil bois naufragados, alguns poucos esquartejados por ribeirinhos miseráveis, outros tantos resgatados, mas a maioria submersa no rio Pará, a espera de um resgate, ainda que já sejam cadáveres em decomposição. Este é o retrato do acidente com o navio que transportava gado em pé, com destino ao exterior, a partir do Porto de Vila do Conde, em Barcarena, nordeste do Pará, nesta terça-feira, 6 de outubro.

O tombamento da embarcação apenas evidencia diversos dramas que um olhar mais atento pode observar: a pobreza da população de Barcarena, que mesmo com um dos maiores produtos internos brutos do Estado, ainda encontra em tragédias como essa uma forma de subsistir e aplacar sua fome, vendendo a carne naufragada? Apenas comendo? Lucrando um parco dinheirinho que pode aliviar o drama financeiro do dia a dia?

E o que fica em troca das cenas atrozes presenciadas na outrora bela praia do vilarejo? Como esquecer aquelas rodinhas em volta do gado morto, mãos armadas com facas e serras, ensanguentadas, a partir a carne entre si, sem se importar com o olhar estupefato de curiosos e câmeras de cinegrafistas? Passos apressados com sacos de tripas e carnes, ostentados como verdadeiros troféus em meio a também famintos urubus e o sol escaldante que, em outra época, servia apenas para bronzear ainda mais a morenice dos habitantes locais.

Intestinos retalhados que derramam quilos de fezes de gado na areia e empesteiam o ar de um ex-paraíso. E como se isso já não fosse tragédia o suficiente, ainda há que se acostumar, mais uma vez, com o derramamento de óleo diesel nas águas, com o odor fétido que isso exala e com a mortandade de peixes que sempre vem quando esses acidentes ambientais impactam a localidade.

Assim foi a terça-feira de Vila do Conde, assim serão os próximos dias. É o preço que se paga pelo estratégico porto, de onde riquezas made in Brazil são exportadas. É o sofrimento de um povo que tem a sina de viver em um polo industrial sujeito a esse tipo de intempérie. Que ganha em troca pão e circo, como shows internacionais e festivais que escondem o “abacaxi” que há muito se transformou esta cidade.

O pesadelo do povo, que por algumas horas pareceu ser sonho, com a carne fácil que já está apodrecendo, ganha mais um capítulo com este triste episódio. Pobre Barcarena! Pobre Pará!

4 comentários em “Tragédia expõe pobreza de um porto rico

  1. Conheço bem Vila do Conde, um lugarzinho pacato e muito bonito.

    Gostei muito da praia ´de lá.

    Sem duvida uma tragédia muito grande, pelos animais, pelos donos dos animais, enfim, algo muito pavoroso mesmo

    Curtir

  2. Eu fico estupefato quando vejo o IBGE afirmar que o estado de Roraima, que não produz nada e vive unicamente do FPE, tem IDH superior ao do Pará, um estado rico, mas condenado à miséria eterna. Até quando?

    Curtir

Deixe uma resposta