Sabbath põe 35 mil pessoas em órbita

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Por Jamari França

No peito de um roqueiro também bate um coração, como não diria o pai da bosta nova. O meu ficou em estado de suspensão por duas horas diante dos deuses do heavy metal. Certas experiências transcendem palavras, vão bater direto na alma, como se o corpo fosse deixado de lado. Foi o que senti transportado para não sei onde pelo som lúgubre, poderoso e massacrante do Black Sabbath. Puro êxtase.

São os graves mais poderosos do rock. Tony Iommi produz trovões com o reforço de Geezer Butler. Nos riffs, o baixo dobra a guitarra com um timbre seco e igualmente poderoso. Quando Tony sola, Geezer segura o riff no baixo, quase como uma segunda guitarra, como fazia John Entwistle em The Who. Tommy Clufetos, baterista da carreira solo de Ozzy, igualmente troveja num kit que praticamente tem tambores pra qualquer lado que ele solte as baquetas, além de mil pratos. Muito bem microfonada e amplificada, o som da batera espancava os ouvidos com sua fúria e precisão. Fui até o meio da Praça da Apoteose e o som falava pra caralho, porradão. Na instrumental Rat Salad, a Moby Dick do Black Sabbath, Clufetos fez um longo solo que delirou a platéia, martelando os dois bumbos, atacando caixa, pratos e tons numa primeira parte, depois espancando o surdo e, finalmente, num gesto ganha-multidão, metia duas porradas fuderosas na caixa, uma no prato e se levantava com as baquetas para o alto e o povo respondia com “Hei”. Foi delirantemente aplaudido.

Ozzy Osbourne não é um cantor de muitas inflexões na voz. Seu timbre metálico e gritado complementa o todo com letras em sua maioria de vertente satânica, mas ele realmente não canta aquilo a sério, ou não falaria “God bless you” ao final da maioria delas, como que exorcizando sua pregação maldita. Gente de todas as idades, 35 mil pessoas, se entregaram de corpo e alma ao show de duas horas com 15 músicas muito bem servidas. Longas porque os arranjos são sofisticados com mudanças de andamento, levadas em que Tony e Butler se complementam com perfeição, o baixo trabalhando em função da guitarra e não da bateria. Geezer escorava os riffs de Tony e, entre um e outro, metia uma rajada de notas, sem falar no solo que fez manipulando um pedal de wah wah.

41_1449-alt-abtonyOs três mostraram boa forma física, além da excelência musical. Iommi, em tratamento contra um câncer, se movimentou, ficou em pé o tempo todo e pilotou com maestria três guitarras Gibson SG, sua favorita. Ozzy foi um perfeito animador, dava suas corridinhas ao estilo Valdirene de Amor à Vida ou ela que corre ao estilo dele, regeu a multidão fazendo-a berrar do piano ao fortíssimo e distribuindo suas frases de efeito> “I can’t fucking hear you” e o povo berrava. “I’m fucking crazy. It’s good to be crazy sometimes. Get crazy”, “You are beautiful, you are number one”. E até mastigou um morcego de plástico ou borracha que apareceu no palco.

O setlist foi igual aos das outras apresentações, ênfase nos primeiros discos, já que a proposta dessa volta e do álbum 13 foi recriar o som e a atmosfera dos primeiros anos, claro que com muito mais poder de fogo graças à experiência de 40 anos de estrada. Não sabemos se esta é a última vez que veremos o Sabbath, é provável porque as reuniões levam tempo para acontecer e paira uma incógnita sobre o tempo que resta a Tony Iommi, a Ozzy, a Geezer e a nós, by the way (bate na madeira). Os 35 mil que lá estiveram voaram alto sob uma meia lua que pairou sobre a Apoteose, como que interessada também em ver os deuses do heavy metal.

Enfim, todas as bandas de heavy metal se reduzem a quase pó diante de Ozzy, Butler e Tony. Acho que só o Metallica chega perto, que me perdoem os fãs das outras bandas. Estes são os criadores, os que escreveram a cartilha, os que apontaram o caminho. Black Fucking Sabbath.

9 comentários em “Sabbath põe 35 mil pessoas em órbita

  1. Banda fantástica, como gostaria de estar nesse show!.Como disse o cronista, sabe lá quando se reunirão novamente, até lá quem sabe posso vê-los ao vivo um dia, ainda não perdi a esperança.

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  2. Égua Gerson, Lucilo e amigos! Eu estive com
    meu filho de 15 anos no Campo de Marte em Sampa na sexta-feira. SETENTA MIL admiradores extasiados. Esse texto diz tudo. Fiquei muito mais emocionado do que no RiR de 85, o primeiro. Esses caras são ESPETACULARES! Meu filho, um iniciante no baixo e roqueiro convicto, me agradeceu diversas vezes por tê-lo dado a oportunidade de assistir Black Sabbath. Não é pra qualquer um. Essa lenda nunca tinha estado no Brasil. Foi uma loucura. Sampa tomada por pessoas de todas as idades com camisas do BS. No hotel em que fiquei era só o que se falava. E
    é exatamente isso. Iommi e Butler valem por uns quatro. E o batera não deve nada a Ward, com todo o respeito. Lucilo, vc não poderia ter perdido essa chance. Mas se Deus quiser ainda os verá. Inesquecível.

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  3. Pense Lucilo, num pai feliz, duplamente, por mim e por ele. Eu digo que vi craques do futebol jogar e ele apenas imagina ou vai pro Youtube. Mas dizer pra ele que o BS é uma das melhores bandas de todos os tempos e ele atestar ao vivo, não se compara. As gerações se misturando no mesmo gosto, curtindo a mesma música interpretada com a mesma qualidade de décadas…só o Rock mesmo.

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  4. Eu estava na apoteose e realmente sabia que estava em um momento histórico do rock mundial, pois provavelmente não teremos a chane de uma outra despedida. Um show que jamais coração e mente esquecera.A única frustação foi de estar só, meus camaradas amarelaram, Não se incomodam de gastar grana em botecos, mas se privam de um momento como esse, fui só, mas fui.

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  5. Fui no show de SP da sexta-feira passada. Um marco na minha vida, mesmo que já tenha ido a muitos shows de bandas consagradas. Perfeito é pouco para a performance (mesmo com as capengadas da voz do Ozzy, que nunca foi um grande vocalista, diga-se). Minha crítica fica para o local: péssimo, com o terreno totalmente desnivelado. Só viu perfeitamente quem foi para a famigerada pista “premium”. Lamentável

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