Senta que lá vem história!

Em entrevista à italiana Oriana Fallaci na década de 60, o general Giap enumerou os invasores que foram expulsos do Vietnam desde o primeiro milênio: chineses, mongóis, franceses. A jornalista pergunta:
— Por que o senhor tem tanta certeza de que vão expulsar a maior máquina de guerra que já houve?
Resposta de Giap:
— Porque nós somos vietnamitas.

(Por Palmério Dória)

Rush, a força de uma rivalidade

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Por André Barcinski

Não tenho nenhum interesse por carros. Zero. Acho que o mundo seria um lugar melhor se cada trinta automóveis fossem substituídos por um ônibus. Também acho Ron Howard um dos piores diretores de cinema dos últimos 30 anos. Certamente o pior, na relação ruindade/prestígio. Um filme sobre corridas de carro dirigido por Ron Howard, portanto, deveria ser o programa de índio do século. Mas até que “Rush – No Limite da Emoção” surpreendeu. Continuo abominando qualquer coisa relativa a carros e a Ron Howard, mas me diverti com o filme.

Para quem não sabe, “Rush” conta a história da rivalidade entre o austríaco Niki Lauda e o inglês James Hunt. Em 1976, os dois protagonizaram um dos duelos mais acirrados da história da Fórmula 1, decidido na última prova, no Japão (na verdade, o duelo só foi tão acirrado porque Lauda havia sofrido um pavoroso acidente e ficara de fora por várias corridas).

james-hunt-com-sua-mulher-suzi-miller-durante-o-gp-da-inglaterra-de-1974-em-brands-hatch-1287497580139_615x300Lauda era um “nerd” perfeccionista que não mexia um dedo sem analisar minuciosamente as conseqüências. Hunt era um beberrão mulherengo que agia por impulso. Se acreditarmos nos tablóides britânicos, Hunt dormiu com cinco mil mulheres e levou para a cama nada menos de 33 comissárias de bordo da British Airways nos dias antes da prova final de 1976. Era um rockstar das pistas.

Segundo especialistas em Fórmula 1, “Rush” tomou algumas liberdades poéticas: Lauda e Hunt não eram tão inimigos assim – chegaram a morar juntos uma época – e algumas sequências do filme foram “adaptadas” para realçar o drama e a rivalidade. De qualquer forma, o filme fala de uma era em que a Fórmula 1 ainda trazia personagens interessantes. A exemplo do boxe, que sempre teve lutadores carismáticos, mas que nos últimos anos tem sofrido com a falta de ídolos, a Fórmula 1 parece passar por uma crise de personalidade.

Voltando ao filme: “Rush” é mais um exemplo do cinemão careta de Ron Howard: música agitada nas partes agitadas, música melosa nas –muitas – cenas melosas, roteiro feito para ser compreendido por crianças de cinco anos, diálogos obtusos que não deixam margem a interpretação (“James, você é um louco!”; “Niki, você é um chato!”). Quando um corredor aparece pensando no outro, Howard dá um close na cara do pensativo e superimpõe imagens do rival, exatamente como novelas de época da Globo.

Há uma cena que merecia ser estudada em escolas de cinema, para ensinar aos alunos os perigos da pieguice: a que mostra Lauda no hospital, se recuperando do acidente, com um tubo de meio metro enfiado na garganta para limpar os pulmões, enquanto chora vendo James Hunt ganhar uma corrida na TV. Sorvete na testa é pouco. Mas nem Ron Howard consegue estragar personagens tão bons quanto Niki Lauda e James Hunt. Agora, imagine esse filme na mão de Michael Mann…

Pragmatismo na veia e morte da Rede

Por Renato Rovai

1379745_554377281297217_1930467473_nA notícia da vez em relação à decisão de Marina Silva é de que ela vai se filiar ao PSB. E que pode ser candidata a vice na chapa de Eduardo Campos. O PSB é um partido muito melhor do que a ampla maioria dos partidos políticos no Brasil. Mas não é diferente da maior parte deles. Ao contrário, talvez tenha como maior vocação o governismo. Onde há governo, o PSB é a favor. Tem sido um partido mais pragmático que o PMDB, que é acusado disso o tempo todo na mídia.

O partido de Eduardo Campos apoiava o PT no governo federal, no Rio Grande do Sul, na Bahia, em Brasília. O PSDB, em Sâo Paulo, Minas e Paraná. E o PMDB no Rio de Janeiro. Brasil afora, em quase todas as cidades onde o PSB está montado, ele ou é governo ou é governo. São raros os lugares onde se acha um PSB de oposição.

A decisão de Marina parece ter levado esse pragmatismo em conta. Ela se filia num partido que de alguma forma não é de direita, nem de esquerda e nem de centro. É governo. O que a leva a ter na vida real um espaço concreto para operar politicamente.

O jogo das eleições de 2014 fica muito diferente com essa sua decisão. Porque a candidatura Campos passará a ser muito mais forte. Mas ao mesmo tempo, Marina acaba de matar o que poderia vir a ser a Rede Sustentabilidade. Porque não fará sentido para muitos daqueles que a acompanharam integrar um projeto como o do PSB, que em vários lugares tem no comando do partido políticos altamente vinculados com o conservadorismo e a velha política. Em Santa Catarina, por exemplo, Campos acaba de entregar o partido aos Bornhausen.

O fato é que Marina se pintou. Se pintou para a guerra. Sua decisão de ir para o PSB é muito mais uma ação pragmática para tirar o PT do governo federal do que qualquer outra coisa. Ela faz parte de um projeto onde estarão não só Campos, mas Roberto Freire, Serra, Aécio, Borhausen etc.

Por fim, se Marina se filiou ao PSB por “questões programáticas”, imagino que a questão ambiental não esteja entre elas. Na votação do código florestal o partido liberou sua bancada para votar a favor ou contra o código. E a bancada se dividiu praticamente ao meio. Ou seja, metade votou com os ruralistas. É esse o programático de Marina? Ou seria o pragmático…

O começo do segundo turno

Por Paulo Moreira Leite
O ingresso de Marina Silva no PSB tem implicações sobre o conjunto da campanha presidencial para 2014. Na prática, o segundo turno já começou.
Vamos entender o que aconteceu. Ao oferecer o PSB para Marina Silva, Eduardo Campos trouxe, para dentro de sua legenda, a candidata que é segunda nas pesquisas de intenção de voto. O próprio Eduardo Campos está em quarto lugar, não sai do chão e acaba de sofrer uma derrota interna importante. O governador do Ceará, Cid Gomes, deixou o PSB. Em matéria de dissidência, seria equivalente, no PSDB, a Geraldo Alckmin romper com Aécio Neves e abandonar o partido, levando embora os votos de São Paulo.
Acabo de ouvir um líder importante do PSB. Ele me garante que Campos e Marina vão formar uma chapa e que o governador de Pernambuco será o titular, deixando para a nova aliada será a vice. O acordo é este, garante. Também é isso que dizem pelo lado de Marina.
1011730_10201269155705111_64613642_nPor mais respeito que tenha por essas pessoas, sei que os segredos fazem parte da política. Duvido e dou risada. Não acho que Marina foi ao PSB para ser vice de um candidato que tem 25% de suas intenções de voto. Se fosse para isso seria melhor ficar em casa em nome dos princípios da Rede de Sustentabilidade e pronto.
Em segundo lugar, a experiência demonstra que ninguém vota em vice-presidente. Vota-se no titular, obviamente. Desse ponto de vista, a aquisição de Marina não acrescentaria muita coisa a Eduardo Campos. Outra questão: você acha que o neto de Miguel Arraes poderia beneficiar-se do discurso anti-político de Marina?
Na verdade, essa composição resolve muitos problemas para as partes. Assegura uma legenda a candidatura de Marina. E pode abrir uma saída para seu novo parceiro.
Enfraquecido e sem perspectivas de crescimento na eleição presidencial, Eduardo Campos fica liberado para disputar uma eleição que pode vencer, para senador, em vez de correr o risco de ficar sem um único mandato para chamar de seu depois de 2014.
Mas não é só isso. Se Marina era a única candidata da oposição que não fazia água, um eventual crescimento de sua candidatura nos próximos meses pode provocar outra mudança. Estou falando de Aécio Neves.
Até março de 2014 será possível definir, oficialmente, quem concorre a qual posto eleitoral. Imagine se, até lá, Aécio estiver no mesmo lugar de hoje, em terceiro, mas a uma boa distancia do segundo lugar. Estará diante do mesmo cenário de Eduardo Campos: sofrer uma derrota e ficar sem mandato.
O apoio a Marina, em nome do conhecido discurso de “unidade das oposições”, pode ser uma excelente oportunidade para Aécio mudar o rumo de sua campanha. Teria a benção de boa parte dos empresários e, com certeza, dos meios de comunicação. Poderia reforçar o coro anti-petista, cada vez mais estridente e reacionário, com a voz suave de quem esteve lá, como Marina.
Basta olhar para a disputa pelo governo de Minas, onde o PT apresenta-se com um ministro e um dos maiores empresários do Estado, para constatar uma novidade. Pela primeira vez em sua história, o PSDB encontra-se sob o risco real de uma derrota por falta de candidato a altura. Se ficar sem chance na luta presidencial, Aécio poderia ser levado a salvar os móveis do PSDB na disputa estadual e voltar para Minas. Essa possibilidade, que parece muito remota agora, delirante até, explica a permanência do eterno candidato a presidente José Serra no PSDB.
Por trás de tantas mudanças, encontra-se uma situação real, que é o risco da oposição sofrer uma quarta derrota consecutiva para o condomínio Lula-Dilma desde 2002. Com 38% das intenções de voto, contra 32% para a soma dos adversários, Dilma ameaça os concorrentes com uma possível vitória no primeiro turno. É essa musica adversa que provoca movimentos entre seus adversários.