Todos chegarão lá

Por Ruy Castro

O Brasil está envelhecendo. Segundo projeções oficiais, 20% da população terá mais de 60 anos em 2030. É o óbvio: vive-se mais, morre-se menos e as taxas de fecundidade estão caindo – e olhe que nunca se viu tantos gêmeos em carrinhos duplos no calçadão de Ipanema.

Em números absolutos, esperam-se perto de 50 milhões de idosos em 2030 – imagine o volume de Lexotan, Viagra e fraldas geriátricas que isso vai exigir. Não quer dizer que a maioria desses macróbios seguirá o padrão dos velhos de antigamente, que, mal passados dos 60, equipados com boina, cachecol, suéter, cobertor nas pernas, e mastigando uma dentadura imaginária, eram levados para tomar sol no parquinho.

Quero crer que os velhos de 2030 se parecerão cada vez mais com meus vizinhos do Baixo Vovô, aqui no Leblon – uma rede de vôlei frequentada diariamente por sexa ou septuagenários torrados de sol, com músculos invejáveis e capazes de saques e cortadas mortíferas. A vida para eles nunca parou.

Por sorte, a aceitação do velho é agora maior do que nunca. Bem diferente de 1968 – apogeu de algo que me parecia fabricado, chamado “Poder Jovem” -, em que ser velho era quase uma ofensa. À idade da razão, que deveria ser a aspiração de todos, sobrepunha-se o que Nelson Rodrigues denunciava como “a razão da idade” – a juventude justificando todos as injustiças e ignomínias (como as da Revolução Cultural, na China, em que velhos eram humilhados publicamente por ser velhos).

Naquela mesma época, o rock era praticado por jovens esbeltos, bonitos e de longas cabeleiras louras, para uma plateia de rapazes e moças idem. Hoje, como se viu no Rock in Rio, ele é praticado por velhos carecas, gordos e tatuados, para garotos que podiam ser seus netos. Já se pode confiar em maiores de 60 anos e, um dia, todos chegarão lá.

Uma verdade inconveniente

Por Fábio Seixas

“A quebra da barra de direção foi causa ou consequência da batida?”. Quando alguém como Adrian Newey se dispõe a falar do acidente que matou Ayrton Senna, convém parar e escutar.

O inglês, desde 2006 na Red Bull, foi o projetista da Williams entre 90 e 97. Da sua cabeça e dos computadores da equipe saiu o FW16, modelo da escuderia em 94. Cada parafuso daquele carro tinha sua chancela, era de sua responsabilidade.

Inglês de personalidade reservada, ainda mais após os 13 anos de inquérito sobre aquele domingo de Imola, ele aceitou falar sobre o episódio em entrevista à BBC. Um depoimento histórico. E, aparentemente, sincero. Porque Newey não tem mais motivos para esconder nada.

Em 2007, ele e Patrick Head, ex-diretor técnico da Williams, foram condenados por homicídio pela Justiça italiana. A investigação concluiu que uma modificação mal feita na barra de direção causou a quebra na Tamburello. Mas como o crime já havia prescrito, na prática não deu em nada.

Ou seja, não teria nada a perder admitindo agora que, sim, foi isso mesmo. Mas ele não o faz. Porque diz que, honestamente, não sabe.

E completa: “Talvez nunca saibamos o que aconteceu”.

Nestes quase 20 anos já li todo o tipo de hipótese sobre aquele 1º de maio. Das mais surreais teorias da conspiração, que não valem ser citadas aqui, a estudos técnicos muito bem embasados.

Erro de pilotagem, temperatura e pressão baixas nos pneus no momento da relargada, ondulação na pista, a tal barra de direção, o fim da eletrônica naquela temporada, a pressão exercida por Schumacher, irritação com as supostas trapaças da Benetton…
Tudo isso e muito mais já foi colocado no caldeirão das possibilidades.

A National Geographic chegou a fazer um documentário sobre o caso, dissecando todo o evento, mas sem chegar a conclusões claras sobre o que levou a Williams ao muro –está online, você pode assistir em http://www.bit.ly/natsenna.

Nada disso supera o veredicto do engenheiro inglês: o mistério pode durar para sempre. Convivam com isso.

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Newey falou ainda sobre ele mesmo: sua consciência, seus fantasmas, seus fardos. “O que aconteceu naquele dia ainda me assombra.”

Não pude deixar de estabelecer a relação: é uma maldição que guarda semelhanças com as declarações de Ben Johnson, semana passada.

No aniversário de 25 anos do maior escândalo de doping do atletismo, o canadense visitou o estádio olímpico de Seul e reclamou do peso que ainda carrega. Disse que estupradores e assassinos muitas vezes saem da cadeia antes disso.

Com uma diferença fundamental entre os dois casos: Newey pode não ter feito nada de errado.

Clubes protegem o patrimônio

Por Gerson Nogueira

Um grupo respeitável de grandes clubes brasileiros ameaça não disputar a tradicional Copa São Paulo de futebol júnior se o São Paulo participar. É a primeira vez que isso ocorre em competição importante no país. Pelo menos, nunca se teve notícia de algo semelhante.

O manifesto dos clubes tem um motivo: o São Paulo é visto como um emérito aliciador de jovens valores formados pelos outros clubes. Além de investir nas divisões de base, mantendo um centro especial de treinamento em Cotia (interior paulista), o clube notabilizou-se por garimpar bons jogadores que surgem em outras agremiações.

Oscar, armador revelado pelo Internacional e cooptado pelo Tricolor paulista, é talvez o caso mais emblemático. Ele só retornou ao clube gaúcho após tumultuada batalha judicial, que proporcionou desgaste e desperdício de dinheiro, além de atrapalhar a carreira do jogador. Em seguida, Oscar foi transacionado pelo Inter com o Chelsea.

bol_sex_041013_11.psOs valores movimentados no negócio ajudam a explicar a preocupação dos clubes em preservar suas promessas. Além dos quatro grandes do Rio, a lista inclui Cruzeiro e Atlético-MG, Internacional, Coritiba, Goiás e Vitória, todos conhecidos pelo zelo e tradição na formação de craques. Ontem, o Corinthians juntou-se ao protesto, quebrando o que parecia um pacto informal dos representantes paulistas.

No documento, os clubes condicionam sua participação na Copinha à exclusão do São Paulo. O imbróglio se formou e a organização do evento ainda não se manifestou. A principal consequência disso até agora é o reaquecimento de um debate que se mantinha amortecido, embora sempre tenha rondado o universo do futebol.

É importante observar, porém, que não só o São Paulo age sorrateiramente para tirar jovens craques de outras agremiações. Hipocrisias à parte, quase todos os demais clubes da Série A adotam a mesma prática, embora sem constância e método. A pressão se exerce de forma ainda mais clara quando envolve equipes mais humildes. Se a discussão servir para ordenar esse mercado negro, o protesto já terá valido a pena.

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A (quase) redenção de um técnico

Quando Ney Franco saiu escorraçado do São Paulo e responsabilizado diretamente pela má campanha inicial do time no Campeonato Brasileiro – afirmações do maior ídolo do clube, Rogério Ceni – ficou aquele imenso ponto de interrogação no ar. Teria Franco, de fato, culpa pela degringolada que o Tricolor experimenta? Fez as escolhas erradas nas contratações e optou por um sistema de jogo retrógrado?

Franco, em sua defesa, criticou a excessiva influência de Rogério na gestão do clube. Sempre é bom entender que, no São Paulo, há quem veja com bons olhos e até defenda essa interferência do herói de tantas jornadas. O técnico tocou, porém, num ponto crucial: o peso que o papel do goleiro e capitão tem no dia a dia do elenco, influindo (para o bem ou para o mal) com seu posicionamento. Mete-se em tudo, ensaiou dizer Franco.

Como muitos sabem, o tempo é senhor da razão. O São Paulo chamou Muricy Ramalho de volta, ensaiou uma reação e voltou a tropeçar. Aos poucos, em silêncio, Franco iniciou a reconstrução de sua carreira. A demissão de um grande clube da forma como ocorreu é quase sempre arrasadora no competitivo mercado nacional de técnicos.

Assumiu o Vitória, que vinha em queda livre rumo ao rebaixamento, flertando com o Z4. Ao longo das últimas seis rodadas, venceu três partidas, empatou duas e perdeu uma. Com isso, alavancou a recuperação do rubro-negro baiano, que fechou a última rodada colado no G4. Sem nenhuma contratação de vulto, apenas com mexidas de posicionamento e trocas no time titular.

O exemplo de Franco confirma a máxima de que o futebol não pode viver das primeiras impressões. O óbvio costuma ser atropelado pelos fatos.

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Direto do blog

“Sou bicolor e vi o jogo. Não moro em Belém há tempos. Fiquei honrado em ver daqui do Rio que, apesar de tudo, ainda somos apaixonados por futebol. Só nos falta uma gestão decente! Hoje vi no meu trabalho torcedores cariocas reclamando da hostilidade da torcida remista com o Flamengo e pediram respeito. Definitivamente eles se acham o centro do universo. Mas nesse nosso Norte tão distante pra eles, nós é que somos a estrela guia! Quando me perguntam aqui qual meu time eu respondo com a boca cheia: PAYSANDU! Assim deveriam se mostrar todos os paraenses. Se nossos times não são fortes no campo eles são no coração. Vida longa a Re x Pa!”.

De Alexandre Fonseca, orgulhoso da pujança da torcida paraense.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 04)

O passado é uma parada…

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Fotografia de Marta Rodríguez Santamaria flagra o poetinha Vinicius de Moraes abraçando um gatinho da vizinhança. Rio de Janeiro, 1976. Rara imagem do poeta em momento doméstico, na sala de jantar de sua casa, na Gávea. A foto foi tirada por Marta (oitava mulher Vinícius), que o poeta havia conhecido em Punta del Este um ano antes, quando ela tinha 23 anos de idade. Vinicius, segundo Marta, tinha muito amor e respeito pelos animais.