Por Nélio Palheta
– Um abraço! Tchau!
Essa é a expressão mais comum quando nos despedimos de uma pessoa íntima – irmão, parente ou amigo. Tão comum, reduz à cortesia, entretanto, a uma formalidade, à boa educação. Há algo mais a dizer quando se trata de uma amizade verdadeira, mas raramente verbalizamos: “-Te amo!”, “-Estou com saudade de ti!”; “- … Deus te abençoe, te proteja!”. Frases como essas revelam mais que amizade. Mas só um coração “límpido como a água da fonte” – diz a Oração do Padre Grandmaison – comporta esse gesto. Não que, necessariamente, se precise ser puro, mas a amizade profunda passa por um coração cheio de fervor.
Há muitos tipos de amigos: aquele com quem falamos no trabalho ou na escola e os que marcamos encontro no bar; outros são convidados para ir a nossa casa e alguns permitem chorar sobre seu ombro. Em cada uma dessas categorias de amizade existe uma hierarquia, é claro, marcada pela família, afinidades diversas, confidência, respeito, sintonia cultural, profissional ou religiosa.
Os amigos amados de verdade fazem-nos pensar naquilo que nos une. Entre estes estão aqueles com quem formarmos família e eventualmente procriamos. Perdê-los impõe sofrimento extremo. Só a amizade verdadeira, passada pela circunstância da convivência mais íntima, quase sempre nos faz sofrer quando a perdemos por não compreendemos – e na maioria das vezes não aceitamos – a razão da separação de alguém que amamos, porquanto o amor seja verdadeiro e completo.
Mas existe o amor completo? Acredito que sim. Nesse contexto não há amizade mais plena que a de Cristo. Quem daria a vida pelo outro? Creio, incondicionalmente, nessa amizade. Amando ao meu próximo, amo a Deus plenamente!
Custa-me muito a perda de um amigo. Sofro quando morre um. Dor maior é ter amigo que não fala a verdade e me abandona. Sofro muito quando alguém, que eu julgava ser meu amigo, maltrata-me e me desrespeita. Ora, quem não sofre? Abandonar o amigo, mesmo na circunstância da dissensão, é um erro muito fácil de ser cometido e o perdão é uma experiência difícil para muitos. Ensina o Livro dos Provérbios: “Não abandones o teu amigo, nem o amigo de teu pai” (27). Abandonar o amigo quer dizer não lhe perdoar as faltas, não pedir a piedade e a proteção divinas. Graças a Deus, herdei muitos amigos de meu pai.
Amizade fiel implica fidelidade, construção mútua; contribui para a humanidade do outro. Quando herdada, representa tradição e atavismo. A fidelidade não é nenhum fardo, muito ao contrário: começa com a confiança em Deus, pois Dele recebemos o sinal mais firme. A amizade inspirada pelas mais caras virtudes e princípios cristãos é a revelação da Presença de Deus na relação com o outro; significa fraternidade. É um bem, um tesouro. Novamente recorro às Escrituras: “Um amigo fiel é uma poderosa proteção, quem o encontrou, descobriu um tesouro. Amigo fiel não tem preço, e o seu valor é incalculável. Amigo fiel é remédio que cura, e os que temem o Senhor o encontrarão. Quem teme o Senhor tem amigos verdadeiros, pois tal e qual ele é, assim será o seu amigo” (Eclo 14-17). Antes, o Eclesiástico ensina ser cauteloso com as amizades: “Se você quiser um amigo, coloque-o à prova. Porque existe amigo de ocasião, que não será fiel quando você estiver na pior. Existe amigo que se transformará em inimigo e envergonhará você. Existe amigo que é companheiro de mesa, mas que não será fiel quando você estiver na pior” (Eclo 7-10). Quem não conhece um assim?
Amizade não deve ter um dia para ser celebrada. “Hoje amo mais fulano” – como se o amor fosse um doce consumido conforme o apetite. Não é crível amar alguém mais hoje e menos amanhã. Comemorar o Dia do Amigo não é exatamente sentar à mesa do bar ou ir à praia junto, mas pensar nele, orar e pedir as graças de Deus; estar junto, dar o ombro e ter liberdade para chorar. E se rolar cervejinha, churrasco, praia, pizza; oração; passeata; passeio ao museu ou um simples encontro de puro lazer… Maravilha!