Ministro lucra com benefício contestado pelo CNJ

Por Rubens Valente, da Folha de S. Paulo

Crítico dos gastos do Judiciário, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, recebeu R$ 414 mil do Ministério Público Federal por conta de controverso bônus salarial criado nos anos 90 para compensar, em diversas categorias, o auxílio-moradia concedido a deputados e senadores. Chamado de PAE (Parcela Autônoma de Equivalência), o benefício já foi repassado para 604 membros do Ministério Público Federal, incluindo Barbosa. O pagamento consumiu R$ 150 milhões.

Embora legalizados, auxílios do gênero provocaram polêmicas ao longo dos anos. A mais recente é travada no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), presidido por Barbosa. Em breve, o conselho vai analisar uma proposta que pede a suspensão do pagamento de auxílio-moradia a juízes trabalhistas.

No mês passado, o CNJ autorizou o pagamento de cerca de R$ 100 milhões a oito tribunais de Justiça nos Estados relativos a auxílio-alimentação. Barbosa foi contrário, e sua posição contra os penduricalhos salariais ganhou amplo destaque. Ele chamou de “esdrúxula” e “inconstitucional” a resolução do CNJ.

O ministro ironizou o benefício ao dizer que “não cabe a cada Estado estabelecer auxílio-moradia, auxílio-funeral ou auxílio-paletó”.

Em 2010, o próprio Barbosa foi relator de pedido da Associação dos Juízes Federais que buscava reconhecimento do direito dos juízes ao auxílio-moradia em ação no STF. Ao negar a liminar, o ministro escreveu que o auxílio “não serve para complementar a remuneração do magistrado federal, mas sim para indenizá-lo por despesas que surgem da sua designação para o exercício em localidade distante”.

Em 2000, a Procuradoria Geral da República estendeu aos procuradores os efeitos de resolução do STF que determinava o pagamento da PAE aos ministros do tribunal. Em 2002, a resolução virou lei. Além desse auxílio, o presidente do STF recebeu, em 2007, R$ 166 mil (ou R$ 226,8 mil, em valores corrigidos) mediante a conversão em dinheiro de 11 meses de licenças-prêmio não gozadas.

Esse benefício, não mais em vigor, permitia que um servidor recebesse três meses de folga a cada cinco anos de vínculo empregatício. A ideia era estimulá-los a efetivamente tirarem as folgas, mas muitos, como Barbosa, preferiram não usá-las, deixando que elas se acumulassem. Em outubro de 2007, o Conselho Nacional do Ministério Público autorizou a conversão em dinheiro, no ato da aposentadoria, das licenças-prêmio e férias não gozadas.

Somando os dois benefícios, o presidente do STF recebeu do Ministério Público Federal R$ 580 mil referentes ao período em que ele foi procurador. Corrigido pelo IPCA, o total atinge R$ 704,5 mil.

OUTRO LADO

A assessoria do STF informou que Barbosa, após ser empossado na corte, “viu-se impossibilitado” de tirar licenças a que tinha direito e “requereu, com êxito, ao procurador-geral da República” o pagamento delas, o que teria sido feito também “por antigos membros do MPF que ingressaram na magistratura”. A resposta é diferente da fornecida pela Procuradoria Geral da República, que afirmou: “A conversão do saldo de licença-prêmio não foi feita a pedido do servidor, mas por decisão administrativa”.

Sobre a PAE, o STF informou que “o presidente esclarece que não recebeu nada ilegal, e nada além do que foi recebido por todos os membros do Judiciário do país, do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União”.

Faça como eu digo, mas não faça como eu faço.

7 comentários em “Ministro lucra com benefício contestado pelo CNJ

  1. Ainda as mágoas do mensalão?!

    Certamente!

    Mas, a questão é que sobre o mensalão ninguém pode dizer que é legal, mas é controverso.

    Já sobre a verba recebida pelo Barbosão, o máximo que pode ser dito é que é controverso. O que é uma pena, pois devia ser ilegal, de modo que ele tivesse que devolver a que já recebeu e não pudesse receber nenhuma outra mais. Ele e os milhares de juízes de outros, que como ele também recebem. Era muita verba que poderia ser economizada pelo governo federal, e, quem sabe, ser mandada para os estados e municípios aplicarem na saúde, por exemplo.

    Nem dizer que é caixa 2 (como se isso fosse pouco), ninguém pode.

    Já o mensalão, é incontroverso que é ilegal.

    Curtir

  2. E o imposto de renda não é tudo. Há a previdência, há o icms, há o iss, o ipi, o iptu. Isso sem falar na iluminação pública. Aliás, até prá se endividar você paga imposto. E ainda há mais, muito mais.

    E tudo isso pra que? Cadê a contrapartida do Estado arrecadador?

    Às vezes, penso que o culpado sou eu, que devia ter seguido certos conselhos de minha mãe e ir estudar para galgar determinados cargos. Mas, depois me convenço que não posso assumir a culpa de um Estado historicamente mentiroso, tampouco valorizar extremamente determinadas notícias que representam muito mais uma ressentida cortina de fumaça para a verdadeira origem dos problemas do país, do que uma autêntica preocupação com as distorções político-administrativas brasileiras.

    Curtir

Deixe uma resposta