Por Gerson Nogueira
Quatro gols em cobranças de falta decidiram a Copa do Brasil 2012. Em outros tempos, mais exigentes, poderíamos dizer que isso é sinal de futebol tosco, de baixa estirpe. O certo é que a conquista palmeirense leva a assinatura de Luís Felipe Scolari, técnico vitorioso (18 títulos no currículo) e especialista em disputas em mata-mata. Há muitos anos na fila, o Palmeiras consegue levantar finalmente um título nacional após uma campanha invicta e meritória – a não ser pelo primeiro jogo da decisão, quando a arbitragem foi extremamente danosa ao Coritiba.
Nas grandes comemorações, como nos velórios, a ordem no Brasil é elogiar exaustivamente, sem direito a senões. Os narradores se esmeram em valorizar detalhes irrelevantes, tudo para que não restem questionamentos aos resultados. É como se todos se sentissem impelidos a defender os vitoriosos de qualquer reparo ou crítica. Metade do tempo é gasto com louvações ao técnico, aos dirigentes e a jogadores que se destacaram mais pela correria do que pela inspiração. Tudo bem, faz parte do show.
De minha parte, não ligo a mínima para os scripts pré-desenhados e vejo as coisas à minha maneira. Na final de ontem, por mais comovente que seja o esforço operário do Palmeiras, o que saltou aos olhos foi um retrato preocupante do futebol jogado no país da Copa. Não por coincidência, disposição e raça foram as virtudes mais destacadas na conquista palmeirense. E é bom que se diga que se o vencedor fosse o Coritiba a conclusão não seria diferente.
Quis o destino que, há uma semana, outro torneio tenha sido decidido com igual economia de talento e arte. Guardadas as devidas proporções, o Corinthians campeão da Libertadores tem muito mais semelhanças com o Palmeiras de Felipão do que pode supor a vã filosofia. Da mesma forma que o Boca Juniors, vice continental, e o Coritiba, vice brasileiro, têm muito mais pontos em comum do que diferenças marcantes.
Na verdade, o futebol anda muito parecido, nivelado por baixo. Faltas e trombadas adquirem mais peso do que lançamentos e dribles. Antes que alguém reclame de rabugice, reconheço que não é apenas no Brasil que o panorama anda desolador. A recente Liga dos Campeões eliminou o Barcelona nas semifinais e premiou dois esquadrões adeptos do estilo bate-estaca de jogar. No fim das contas, coroou o futebol mais do que limitado e rude do Chelsea. Não estamos sozinhos, portanto, mas a constatação não serve de consolo e nem absolve um país que sempre tratou a bola com extremo carinho.
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Um aspecto em especial despertou minha atenção no jogo de Curitiba, arrastado e desinteressante na maior parte do tempo. Sandro Meira Ricci, árbitro de curta e questionada carreira, exerceu tal poder controlador que pouco restou de opção ao torcedor ou telespectador. Ora sofria com a pobreza técnica das equipes, incapazes de trocar quatro ou cinco passes em sequência. Ora se angustiava com as marcações seguidas, destinadas a travar a partida. Nesse sentido, o maior prejudicado acabou sendo o Coritiba, a quem interessava fazer a bola correr.
É importante notar o requinte da coisa. A influência é quase sutil, pois não se pode acusar o árbitro de nenhum erro cabeludo. Talvez a rigorosa interpretação na falta que originou o empate palmeirense. Ou o cartão amarelo que refugou para Marcos Assunção no primeiro tempo em lance de extrema rispidez. O volante só foi advertido na terceira falta violenta, mas ficou livre para participar do lance decisivo em favor de seu time.
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Como se previa, os técnicos campeões despontam como candidatíssimos ao posto de técnico da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 2014. Depois de Tite, responsável pelo inédito triunfo corintiano na Libertadores, Scolari vai saborear nos próximos dias a condição de nova ameaça para Mano Menezes no escrete. O divisor de águas será o torneio de futebol da Olimpíada de Londres. Um novo tropeço, juntando-se à lembrança do fiasco na Copa América, será fatal para Menezes, que, por ironia, é um legítimo discípulo de Felipão. Como a Copa é um mata-mata por excelência, a opção não deixa de fazer sentido.
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A nova decisão judicial (do STJ) que mantém o Treze da Paraíba na Série C, alijando o Rio Branco da competição, confirma que a CBF não tem mais qualquer força para reverter a bagunça instaurada no campeonato. Depois de tanto resistir por força de recursos, é improvável que o representante paraibano venha a ser excluído. Ao mesmo tempo, a confirmação de um participante não escolhido por índice técnico abre precedente dos mais perigosos para todos os torneios bancados pela entidade.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quinta-feira, 12)