Conexão África (17)

Argentina quer repetir o filme de 86

A opinião agora vem de quem entende do riscado. Zinedine Zidane, que conhece futebol como poucos (dizem aqui que foi dele a estratégia que
conduziu aquele timeco francês ao vice-campeonato mundial em 2006), também acha que a Argentina é a melhor seleção da Copa do Mundo nesta
primeira fase. Jogou um pouco abaixo de suas possibilidades porque os adversários não exigiram muito dos comandados de Diego Maradona. Talvez só tenham tido mais trabalho na estreia contra a Nigeria, quando levaram um sufoco nos minutos finais. Nas demais partidas, aplicaram uma surra na Coreia do Sul e venceram a Grécia usando um mistão – dando-se ao luxo de escalar até Martín Palermo, que quase todo mundo achava que não ia ter chances no mundial.
Zidane gosta do estilo da Argentina porque foi um artista dos gramados. Aprecia naturalmente o futebol clássico, de dribles, lançamentos e passes precisos. Prefere jogos com muitos gols e, apesar de europeu, não é adepto do futebol de resultados. Elogiou o potencial ofensivo dos argentinos e observou que até no setor mais frágil do time já é possível ver evolução no trabalho da dupla Demichellis e Samuel. Não vejo tanta segurança na dupla de defesa, mas desconfio que Maradona também percebeu essa limitação e resolveu apostar tudo no poder de fogo de seus homens de meio-campo e ataque.
Ao usar o veterano Juan Sebastián Verón como maestro do time, Maradona conseguiu empalmar dois trunfos. Em primeiro lugar, deu estabilidade à
distribuição de jogo, visto que Verón é um dos melhores médios em atividade no planeta, se não for o melhor. Ao mesmo tempo, deu personalidade ao grupo, que tem muita gente nova e impulsiva. O próprio Messi é facilmente provocado e não tem sabido reagir à marcação mais áspera. Tevez também é imprevisível, bem como Diego Milito e Higuaín. O jovem Di Maria, aposta pessoal de Maradona, é um debutante em Copas.
Em conversa com jornalistas argentinos, todos destacam a preocupação do técnico em criar um cinturão de apoio para escoltar Messi e deixá-lo livre para jogar e dar espetáculo. Num time recheado de jogadores de alto nível técnico, somente um semideus como Maradona teria autoridade e peito para estruturar a seleção nesse formato. E há uma lembrança histórica importante, sempre ressaltada pelo comandante: o título mundial conquistado no México, em 1986, com um time em que Maradona tinha total liberdade. Podia transitar entre defesa e ataque, sem obrigação de marcar e com autonomia para conduzir a bola e driblar à vontade.
Todos na Argentina recordam o êxito daquela experiência, talvez a única Copa vencida por um homem só na história do futebol. Chama atenção que um ídolo consagrado como Maradona tenha a humildade de aceitar repetir a dose, tendo Messi como solista. Em nome do título mundial como treinador, ele resolveu montar um esquema que repete, em quase tudo, aquela seleção vitoriosa. Com a vantagem de possuir hoje pelo menos cinco outros excelentes jogadores para compor a orquestra.

Eminência parda na Seleção

Nenhuma seleção usa tanto o mistério como arma de guerra quanto a de Dunga. A simples substituição de Kaká virou uma novela porque o técnico simplesmente não revela quem será o escolhido, se Júlio Batista ou Nilmar. Até a Jabulani sabe que esse tipo de expediente não altera a Bolsa de Tóquio ou o mercado de capitais. Trata-se da velha e manjada birra, como é do estilo do Capitão do Mato. Em conversa com pessoas ligadas à assessoria de comunicação, soubemos hoje que ninguém no staff da CBF aguenta mais a marra da dupla Dunga-Jorginho. Este último, por sinal, é apontado como principal influência por trás do técnico, capaz de abraçar uma postura intransigente em relação a tudo e todos. A fonte assegurou que até os jogadores lamentam, pelos cantos, o radicalismo dos dois.

Dramaticidade e justiça em campo

Nunca a TV americana conquistou tanta audiência com transmissão de futebol como nesta Copa. E quis o destino que Donovan fizesse um gol
carregado de emoção e suspense, exatamente como os americanos gostam. Com a presença do ex-presidente Bill Clintou nas tribunas, o time ianque fez brotar uma valentia digna de seus combatentes mais famosos. A classificação, mesmo diante da fraca Argélia, teve contornos dramáticos, que valorizam ainda mais o feito. No aspecto puramente futebolístico, seria uma tremenda injustiça se os EUA fossem despachados na primeira fase. O gol marcado por Edu contra a Eslovênia, erradamente anulado pelo árbitro de Mali, seria uma mancha sobre a Copa do Mundo, quase na mesma proporção do gol francês que tirou a Irlanda do torneio.

Ganso e Neymar dão show nos telões

Ironia do destino. Os garotos Paulo Henrique Ganso e Neymar têm tido a chance de aparecer mais na Copa do Mundo do que a maioria dos jogadores que está disputando de verdade a competição. Em todas as partidas realizadas até aqui, a torcida presente aos estádios assiste ao video de um dos patrocinadores com malabarismos da dupla, juntamente com Robinho. A sequencia deixa todo mundo ligado e costuma ser repetida três ou quatro vezes. Acho que, nessa batida, Ganso e Neymar serão muito mais vistos durante o torneio que Josué, Kleberson e Grafite, que dificilmente entrarão em campo. Mesmo sem terem sido convocados por Dunga.

A difícil recuperação britânica

Acompanhei o jogo dos ingleses no Centro de Imprensa e fiquei com a clara sensação de que Fábio Capello, aos trancos e barrancos, vai dando consistência ao English Team. Não será, porém, tarefa tranquila. Lampard, Gerhard e Rooney, as estrelas da companhia, parecem desafinados. Não consequem afinar os intrumentos. Rooney, em particular, parece acima do peso. Não conseguiu acompanhar a correria dos eslovenos. Tentou poucas vezes as jogadas em diagonal que o consagraram no Manchester United. Há possibilidade de evolução, mas qualquer chance de sucesso passa necessariamente pela recuperação de Rooney.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quinta-feira, 24)

Campeã de 2006 eliminada na 1ª fase

Vejo na TV do hotel a Itália perder para a Eslováquia por 3 a 2 e se despedir melancolicamente da Copa do Mundo. Classificaram-se nesse grupo Paraguai, em primeiro, e Eslováquia. Uma zebraça nesse mundial meio esquisito. Saiu de cena, logo na primeira fase, a seleção campeã do mundo. Sem esquecer que a vice-campeã (França) também já rodou. Que me lembre, é a terceira vez que o campeão sai sem chegar às oitavas. Antes, foram eliminados o Brasil em 1966 e a França em 2002.

Viagem longa e interessante até Durban

Amigos do blog, um pedido de desculpas pelas várias horas sem atualizações e a explicação devida na forma de uma pequena reportagem ilustrada. Tivemos que sair muito cedo de Johanesburgo com destino a Durban, que fica a 588 quilômetros de distância. Equipe formada (Valmir Rodrigues, Giuseppe Tomaso, Walmir Jorge/Rádio Paiquerê e eu), decidimos deixar nosso hotel por volta de 7h (2h aí de Belém), mas acabamos encarando um forte nevoeiro, por mais de 200 quilômetros. Na rota, alguns sustos diante da visão de acidentes feios entre caminhões, com vítimas fatais na estrada.

Aos poucos, a neblina foi se dissipando e conseguimos pegar estrada boa, com céu aberto (sem azul, como é próprio dessa época do ano por aqui) e paisagens deslumbrantes, que o visitante não imagina existir na África. A todo instante, um novo detalhe chamava atenção de todos. Montanhas belíssimas, formações naturais e vales imensos, tendo sempre como pano de fundo a savana a perder de vista. Viagem facilitada pelas excelentes condições da pista, que permitem a Tomaso desenvolver até 190 km/h (não há limite de velocidade nas auto-estradas) para tentar compensar o tempo perdido (cerca de 1h30) sob a neblina.

À altura da metade do trajeto, paramos num posto para reabastecer e deparamos com três camelos, pastando num cercadinho, para observação de visitantes curiosos, mas com uma tabuleta avisando para manter cuidadosa distância de 3 metros. Na manhã desta quinta-feira, quase todos os carros ali eram de brasileiros e portugueses, que se dirigiam a Durban para ver o jogo do Brasil. No melhor estilo turista oriental, mais fotos para mostrar em casa.

A paisagem, que normalmente se imagina árida, é rica em vegetação. À margem da estrada, cidades belíssimas, gente risonha e franca, bares exóticos, como se vê nos filmes “Paris, Texas” e “Bagdá Café”. Avançamos cada vez mais e, já pertinho de Durban, os primeiros sinais de uma subsede da Copa, com direito a bandeiras das seleções participantes e uma imensa bola junto à estrada.

Seis horas depois de deixar o tranquilo Booysens, em Joburg, adentramos finalmente a moderna e acolhedora Durban. Cidade de 3 milhões de habitantes, com imensos viadutos e auto-estradas, fica à beira do oceano. O estádio Moses Mabhida (para 70 mil pessoas), de arquitetura imponente, fica à margem de uma imensa lagoa natural. Passamos por lá antes de procurarmos nosso hotel, Petit Provence, junto à praia, no distrito de Ballito. Daqui a pouco, mais informes sobre essa viagem em torno da Seleção Brasileira.