
POR GERSON NOGUEIRA
O Brasil jogou contra o Equador na quinta-feira e a torcida foi reapresentada ao Neymar fominha, preocupado com a própria imagem e obcecado pela ideia de ser protagonista a qualquer preço. Lembrou até o atacante imberbe dos tempos de Santos, cujos pecadilhos e birras eram perfeitamente perdoáveis. O problema é que o garoto virou homem e o aspirante a craque é hoje um dos melhores do planeta, e precisa agir como tal. Mais que isso: é o principal astro da Seleção Brasileira, mas não pode achar que é o dono da companhia.
Diante dos equatorianos, Neymar voltou a exibir a face firuleira e egoísta. Foi o mesmo jogador que enfrentou problemas na chegada ao Barcelona devido ao estilo individualista e pouco afeito ao trabalho de equipe. Sob a batuta de Luís Henrique, foi burilado e atingiu seu melhor nível como futebolista, chegando em certos momentos – como no ano passado – a quase igualar Messi em termos de importância para o time.
Nada disso foi possível ver na partida do Beira-Rio. Neymar apanhava a bola e partia logo para dribles impossíveis sobre três, às vezes quatro, marcadores. Tentou isso várias vezes. Ao perceber que não levaria vantagem sobre os marcadores, perdeu a compostura. Apelou para simulações ridículas, irritando o árbitro e os equatorianos.
Durante todo o primeiro tempo só conseguiu encaixar uma boa jogada. Foi o passe certeiro para Willian bater da entrada da área, com grande perigo. Ficou nisso. Insistia nas jogadinhas pelo meio ou pela esquerda, sempre buscando concretizar “a” arrancada. Parecia disputar um jogo particular, no qual o mais importante não era marcar gol, mas driblar o máximo de equatorianos até deixá-los caídos e humilhados no gramado.
Bem postados e violentos, os defensores não permitiram que ele tivesse êxito, o que redobrou a irritação de Neymar. Logo no começo do segundo tempo, deu um carrinho bobo junto à linha lateral por pura raivinha. Tomou o cartão amarelo. Por reclamações e teatro de quinta categoria, podia perfeitamente ter sido expulso.
Só foi melhorar depois da entrada de Phillipe Coutinho, quando resolveu se espertar e interagir com os demais atacantes e meias. Viu Paulinho abrir o placar e, em seguida, Coutinho liquidar a fatura após inspirada assistência de Gabriel Jesus. A perspectiva de se ver superado pelos dois garotos parece ter mexido com os brios do craque do PSG, que por alguns minutos voltou a ser solidário nas jogadas e quase deixou sua marca, disparando forte à esquerda do gol.
Ficou no ar a sensação de que Tite terá pela frente um espinhoso período de dedicação a Neymar. A conversa precisa começar mais ou menos na seguinte linha: craque de verdade joga futebol e não perde tempo com provocações bobas. Um sujeito que almeja ser o melhor entre os melhores não pode ficar choramingando a cada choque com um equatoriano ou reclamando de tostões. Acima de tudo, tem que se dedicar a jogar bola.
Tite pode até apelar para uma comparação prática: mostrar a Neymar que a melhor referência é seu ex-companheiro de Barça Lionel Messi, de fleuma notável ao ser caçado em campo. Ninguém jamais viu La Pulga se lamuriar das bordoadas que recebe. Na verdade, como acontecia com El Pibe Maradona, as pancadas parecem surtir efeito contrário: atiçam o gênio, que se torna ainda mais destemido e letal.
Na flor dos 25 anos, Neymar precisa domar seus anseios. A saída do Barcelona parece provocar nele a necessidade de provar alguma coisa. Bobagem. Segue como o grande astro do Brasil e o importante agora é mostrar que continua focado na meta de ser melhor do mundo, o que obrigatoriamente inclui conquistar uma Copa do Mundo – coisa que nem Messi, nem Cristiano conseguiram até hoje. E a Rússia é logo ali.
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Bola na Torre
Guilherme Guerreiro apresenta a atração a partir das 21h, na RBATV. Participação de Giuseppe Tommaso e deste escriba de Baião.
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Muralha e os limites do humor no esporte
A confusão envolvendo o goleiro Muralha, do Flamengo, e o jornal Extra recoloca na ordem do dia a discussão sobre os limites do humor no jornalismo esportivo atual. A título de “editorial”, o jornal desceu o malho no goleiro, citando-o como frangueiro e informando que passa a grafar o nome oficial do arqueiro, evitando o apelido por considerá-lo inadequado.
A piada foi boa – para os que não são Muralha. Zoado intensamente nas redes sociais depois da capa do Extra, o goleiro não achou graça da brincadeira. Sentiu-se humilhado e “tratado como bandido”.
Exageros à parte, o Extra talvez tenha pecado por usar o termo editorial como cabeçalho das ironias dirigidas ao goleiro. Piadas até mais infames do que essa são corriqueiras nas páginas do Diário Olé, de Buenos Aires. Mas, no Brasil politicamente correto (para certas coisas apenas), o escracho gera atritos e é visto como prática pouco edificante.
O curioso é que parte da torcida rubro-negra saiu em defesa de Muralha, normalmente enxovalhado impiedosamente nas redes sociais a cada nova barbeiragem debaixo das traves. Coisas da vida.
(Coluna publicada no Bola deste domingo, 03)