Rock na madrugada – Red Hot Chili Peppers, Under the Bridge

Mundo real e irreal

Por Tostão

Nesta época do ano, deveria tirar férias, viajar, já que o futebol para. A exceção é na Inglaterra. Mas prefiro continuar por aqui, escrevendo. Os aeroportos estão um caos, os hotéis abusam dos preços, chove muito ou faz muito calor no Brasil e muito frio na Europa e nos EUA. As estradas estão péssimas e perigosas. Os alemães, que fazem a logística de sua seleção, estranharam os quebra-molas, que, para eles, estragam os carros, congestionam o tráfego e provocam mais acidentes.

Aproveito esses dias para ler mais e ir mais ao cinema. Tiro férias também da televisão. Não suporto as retrospectivas. Difícil é arrumar assunto e leitores para minhas colunas.

Nesta época do ano, as pessoas sonham com o mundo ideal. Nele, os auditores do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) analisariam o caso da Portuguesa com o olhar do que está escrito no regulamento e também com o olhar da justiça, do contexto, com a certeza de que a Lusa não agiu com má-fé nem se beneficiou de seu erro.

Faltava um argumento jurídico à Lusa. Agora, já tem. Segundo alguns advogados, o Estatuto do Torcedor estaria acima do regulamento do campeonato, o que livraria o time do rebaixamento.

No mundo ideal, os gastos com a Copa seriam apenas com dinheiro privado. A CBF, as federações estaduais e os clubes seriam dirigidos por profissionais competentes, transparentes e independentes.

Não existiriam relações promíscuas, e o calendário seria feito para beneficiar a qualidade do futebol. Os clubes não gastariam mais do que arrecadam ou do que podem pagar, e acabariam os astronômicos salários, incompatíveis com as receitas.

No mundo ideal, os torcedores iriam para os estádios só para torcer e fazer festa. Haveria lugares mais caros, para quem quisesse mordomia, e outros mais baratos, populares. Todos teriam conforto e segurança. Os marginais estariam presos ou impedidos de frequentar os jogos. A vigilância seria constante e implacável.

No mundo ideal, os gramados seriam padrão Fifa. O futebol que se joga no Brasil seria muito melhor, individualmente e no conjunto.

O equilíbrio das partidas do Atlético-MG, contra times sem nenhuma expressão, no Mundial de Clubes, é mais uma constatação desta deficiência.

A Seleção é exceção, pelo fato de quase todos os jogadores atuarem fora do país.

No mundo ideal, a imprensa cobraria de técnicos, dirigentes e jogadores mais compromisso com a qualidade do jogo. Os analistas deixariam de ver futebol somente a partir da conduta dos treinadores, dos resultados e como se houvesse sempre uma relação direta entre a história do jogo e o placar final.

Quanto maior a distância entre o mundo real e o ideal, maior é a frustração e o desamparo. O mundo ideal só existe na nossa imaginação, mas serve de referência para se tentar sempre fazer algo melhor.

Flu anuncia Renato Gaúcho, pela sexta vez

1333696O Fluminense confirmou Renato Gaúcho como seu novo treinador para a temporada de 2014. Será a sexta vez em que ele dirigirá o time tricolor. Em 1996, ainda como jogador, treinou a equipe nas duas últimas rodadas do Campeonato Brasileiro, em que o clube foi rebaixado e escapou do descenso por causa de uma virada de mesa. Voltou como técnico em 2002.

Teve mais uma passagem no ano seguinte. Quando retornou, conquistou a Copa do Brasil de 2007 e foi vice-campeão da Taça Libertadores da América de 2008 diante da LDU, do Equador. Seu último trabalho nas Laranjeiras foi em 2009. (Da Folha SP) 

Diálogo de surdos

Por Rodrigo Martins, na Carta Capital

A internet mobiliza a juventude e é capaz de pautar temas ignorados pela mídia tradicional, mas a exagerada polarização ideológica empobrece o debate político

Os analistas políticos ainda se debatem para decifrar os enigmas dos protestos de junho. Mas ao menos um consenso parece estabelecido: tamanha mobilização, em uma sociedade historicamente apática, seria impensável sem o respaldo da internet. As redes sociais disseminaram fotos, vídeos e relatos da violenta repressão policial aos manifestantes convocados pelo Movimento Passe Livre e atraíram centenas de milhares para ocupar as ruas das principais capitais.

Não é a primeira vez que as mídias eletrônicas servem como instrumento de mobilização. Em 2011, operários da usina de Jirau, em Rondônia, iniciaram uma das maiores revoltas trabalhistas da história recente do país e destruíram parte do canteiro de obras. O distúrbio começou horas após os trabalhadores compartilharem insatisfações por torpedos de celular. Naquele mesmo ano, bombeiros do Rio de Janeiro promoveram um motim em pleno quartel, e angariaram apoio da população por meio do Facebook e do Twitter. De lá para cá, são incontáveis os atos que ganharam força após uma articulação online.

O cenário permite supor a emergência de uma democracia digital, na qual os cidadãos conectados à internet tornam-se protagonistas do debate político, sem a mediação da mídia tradicional ou a tutela de partidos ou sindicatos. Essa visão idílica, repetida à exaustão pelos entusiastas da rede, tem sido, porém, cada vez mais contestada.

Se é verdade que as redes sociais têm potencial para atrair milhares de cidadãos às ruas, também é verdade que a mobilização na internet nem sempre ganha vida no mundo offline. Após reunir mais de 800 mil adesões para uma greve geral convocada pelo Facebook, o mineiro Felipe Chamone, músico que nunca teve ligação com sindicatos, surpreendeu-se ao notar que o dia 1º de julho, marcado para a paralisação, amanheceu como outro qualquer. Em 7 de setembro, os esvaziados protestos contra a corrupção (do governo petista, registre-se) só não passaram em branco por conta da atuação dos Black Blocs.

Não é apenas a dificuldade de transformar o ativismo virtual em realidade que alimenta as críticas. A mesma plataforma mobilizadora abriga manifestações de ódio contra negros, nordestinos e gays. “Em 2006, havia pouco mais de 20 células neonazistas ativas na internet brasileira. Hoje, são mais de 300”, alerta Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente da Safernet Brasil, entidade dedicada a monitorar crimes na rede mundial de computadores.

Além da atuação de criminosos, tornou-se corriqueira a ação de provocadores, os chamados trolls, para interditar o debate político com comentários agressivos, repletos de acusações e xingamentos. Os ataques movidos pelo fígado afastam do debate quem busca argumentos racionais. Nos jardins murados do Facebook ou do Twitter, os mais comedidos optam por selecionar criteriosamente sua lista de amigos ou seguidores, uma forma de assegurar um debate mais civilizado.

Mas com quem? “Normalmente, com quem compartilha dos mesmos valores e posições partidárias”, avalia Oliveira. O fenômeno é apontado por diversas pesquisas, como os mapas relacionais elaborados pelo Labic.net da Universidade Federal do Espírito Santo. Temas como a importação de médicos estrangeiros e o voto do ministro Celso de Mello no julgamento do “mensalão” resultam em um Fla-Flu com as torcidas separadas por alambrados virtuais, a reforçar suas próprias convicções e sem qualquer ponto de convergência.

A avaliação não é, porém, consensual entre os especialistas. “Hoje, o jogo é muito mais democrático. Antes da internet, o cidadão era um mero receptor de informação e o oligopólio da mídia sempre foi avesso à diversidade de opinião”, avalia o sociólogo Sérgio Amadeu, professor da Universidade Federal do ABC. O debate tende a ser mais agressivo nas redes sociais, ele reconhece, até pelo fato de os interlocutores estarem distantes ou protegidos por perfis anônimos. Não vê ameaça. “Não devemos debelar o conflito, e sim conviver com a divergência. Há troca de acusações na web, mas espaço para a defesa. Antidemocrática é a censura imposta por certas empresas, que bloqueiam conteúdos a pedido de indivíduos ou empresas mesmo sem ordem judicial.”

Professor de Teoria da Comunicação na Universidade Federal da Bahia, Wilson Gomes admite ser comum a formação de guetos ideológicos, mas ressalta que a exposição inadvertida a pensamentos divergentes é muito mais comum no mundo virtual. “Antes da internet, só havia discussão entre amigos, geralmente da mesma classe social. Nas redes sociais, o sujeito pode até buscar esse isolamento, mas vai acabar se deparando, cedo ou tarde, com a opinião diferente de um parente distante ou seguidor desconhecido.”

Na avaliação de Renato Lessa, cientista político da Universidade Federal Fluminense, uma das maiores virtudes das redes sociais é a capacidade de pautar temas ignorados pela mídia tradicional. Não fossem as denúncias disseminadas pela web, por exemplo, poucos dariam atenção ao desaparecimento de Amarildo de Souza, após ser levado para averiguação policial na Favela da Rocinha, no Rio. O caso ganhou o noticiário após a repercussão nas redes sociais e cinco policiais militares devem ser indiciados pela tortura, morte e ocultação do cadáver do pedreiro, ainda que seu corpo não tenha sido encontrado. A desvantagem, pondera, é a falta de aprofundamento das discussões em um ambiente no qual a instantaneidade da informação impera. “Não há um debate político de fato. O que existe é muita mobilização, mas com uma polarização exagerada”, diz Lessa. “Nos protestos de junho, não havia pauta de reivindicação clara, tampouco emergiram novos atores políticos.”

A tese é rechaçada pelo antropólogo Antonio Risério. “Há muita confusão entre crítica e pessimismo. Aristóteles acusava a escrita de ser responsável pela destruição da memória. Uma grande bobagem, não?”, provoca. “A surdez e a cegueira ideológica existem desde sempre. Sou da geração de 1968, e posso te garantir que os grupos políticos só pregavam para seus convertidos. Hoje há muito mais debate do que naquela época.”

O Natal permanente

100_6236

Natal é algo tão bom que deveria ser fatiado, como diria o poeta Daniel Drummond de Andrade. Penso da mesma forma e gosto, à minha maneira, de achar que todo dia nos reserva um quê de Natal. A festa é tão prazerosa que não pode se restringir a um único dia. O sorriso de uma criança, o abraço de uma pessoa amiga, uma palavra de carinho ou compreensão. O sentido da renovação natalina se concretiza assim. São os pequenos acontecimentos que fazem a existência valer a pena e que às vezes passam despercebidos, suplantados pelos eventos mais grandiosos, embora nem sempre mais grandiosos.

Nos últimos tempos, o meu Natal de verdade se materializa quando reencontro meus pais, Benedita e José, e minhas irmãs em Baião. É quando recarrego energias, bebendo nas fontes originais. Em 2013, foi em março. Pretendo repetir a dose no mesmo período em 2014. Sorte de quem pode se conceder mais de um Natal por ano.

Parabéns a todos os companheiros de blog, com a certeza de que Deus olha por todos nós e – em sua suprema sabedoria – procura unir os desiguais e pacificar os corações conflitantes. É graças a este Deus misericordioso que todos estamos aqui, vivendo mais um Natal. É um prazer imenso estar aqui com todos vocês, todos os dias, celebrando a vida.

Som na madrugada – Milton Nascimento, Bola de Meia Bola de Gude