Por Gerson Nogueira
Não há receita confiável e imune a erros quando o assunto é encarar confrontos decisivos. De todos os esportes coletivos, o futebol é o mais imprevisível e as razões são bem conhecidas. Há o espaço, os objetivos, as regras e 22 agentes em campo. O imponderável, porém, pode aprontar das suas. Sempre gostei das explicações de Pepe, o canhão da Vila e que também foi bom treinador (inclusive do Remo), referindo-se às incontáveis possibilidades que podem surgir de um inocente desvio na trajetória da bola.
E há o fator humano, sempre ingrato e capaz de erros inesperados. Campeonatos podem ser decididos pela furada de um zagueiro ou pelo chute travado de um atacante. Nunca se pode estabelecer onde a bola vai parar. O mistério está, literalmente, no ar e não há jeito de calcular todas as variáveis, nem criar mecanismos para se prevenir a respeito.
As diretrizes que os técnicos criaram para enquadrar e disciplinar as ações dos atletas não garantem que todas as jogadas e deslocamentos sejam programados. Alguns pobres pretensiosos até se iludiram com a ideia de controlar o jogo. Felizmente, não conseguiram essa triste façanha, até porque a essência do futebol é a liberdade de movimentos.
Parto desde introito, como gostavam de dizer os antigos escribas, para o assunto que realmente importa hoje. O Paissandu está diante de um desafio monumental. Há sete anos batalhando para retornar à Série B, tenta desta vez dar o salto definitivo. Já viveu situações bem menos inglórias, como há dois anos, quando esteve bem próximo do acesso, mas sucumbiu dentro de casa frente ao Salgueiro.
Neste campeonato, desde o começo turbulento para os bicolores, as chances sempre se apresentaram mínimas, mas talvez por isso mesmo há um quê de confiança de que desta vez vai. A base dessa esperança não está na lógica, mas o sentimento é legítimo justamente porque o futebol não é um jogo cartesiano.
Vai daí que, contra o Macaé, primeiro colocado da outra chave e com campanha bem superior, os prognósticos frios não apontam o Paissandu como favorito para avançar na competição. O site Chance de Gol projeta Chapecoense (71%), Duque de Caxias (70,4%), Macaé (68,5%) e Fortaleza (61,9%) como mais cotados.
Claro que se baseia na contabilidade de vitórias, empates e derrotas ao longo do campeonato. Pode acertar, mas há sempre a janela para um resultado imprevisto. A beleza e o encanto do futebol estão justamente nessa encruzilhada entre realidade e fantasia, juízo e delírio. Graças a Deus.
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O triunfo da simplicidade
O que mais chamou atenção no curto período de preparação que o Paissandu cumpriu em Paragominas foi a constatação pelos jogadores de que o campo da Arena Verde é excessivamente duro, o que aumenta riscos de lesões e deve interferir na velocidade de passes e lançamentos. A descoberta valoriza ainda mais a chegada antecipada da equipe à cidade, pois já elimina (ou atenua) um problema que podia surpreender a todos na hora da partida.
Quanto ao time, não há qualquer alteração em relação à formação titular que Lecheva desenha desde que substituiu Roberval Davino por um jogo (contra o Cuiabá) lá na metade da competição. Depois, chegaria Givanildo Oliveira implantando seu jeito de trabalhar e suas preferências.
Por uma dessas questões insondáveis, desde então o Paissandu não venceu mais, passando sete jogos em jejum e patinando na classificação. Bastou Givanildo sair para a situação clarear novamente e Lecheva botar em prática a escalação que se consagrou como a mais equilibrada de todas.
Com as peças certas nos lugares adequados, o Paissandu passou a evoluir em campo como se jogasse há anos assim. Não houve inovação tática, apenas aplicação efetiva do 4-4-2 e seus desdobramentos.
No máximo, Lecheva se permite a recuar Tiago Potiguar para o papel de terceiro homem de criação e, por vezes, libera Pikachu para ser mais um avante, deslocando um dos volantes para se revezar na cobertura do lado direito.
O papel do atual técnico do Paissandu, já enaltecido aqui em outras ocasiões, ainda será devidamente reconhecido pela capacidade de simplificar as coisas. Deve-se a isso, talvez, a incrível transmutação de um grupo de jogadores que parecia disposto a se rebelar a qualquer momento quando Givanildo era o comandante. Milagre que os subterrâneos do futebol nem sempre esclarece, mas que tem a ver certamente com sensibilidade e capacidade de entender a alma dos boleiros.
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Atacantes em xeque
Apesar do retrospecto negativo para clubes do Rio em embates com paraenses – o próprio Macaé se deu mal, em 2009, derrotado pelo São Raimundo na primeira edição da Série D – o Paissandu sabe que o atual cruzamento favorece o adversário, que ganhou em campo o direito de decidir a vaga dentro de seus domínios.
Cabe inverter essa situação, também dentro das quatro linhas, marcando os gols que tornarão o Macaé refém do desespero na partida de volta. O papel dos atacantes é primordial, obviamente, pois a sucessão de gols perdidos não pode se repetir hoje à tarde.
Kiros é o centroavante titular, mas Rafael Oliveira e Moisés, que neste retorno, ainda não justificou a condição de artilheiro, podem ter oportunidade de mostrar serviço. Nos pés desse trio pode-se dizer que repousam as chances do Paissandu continuar vivo na disputa.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 02)