Sessenta anos de amadorismo

Por Gerson Nogueira

O atraso vem de longa data e se eterniza a cada temporada. A profissionalização, que bateu às portas do futebol brasileiro em meados de 1940, levou pelo menos mais 10 anos para se estabelecer precariamente no Pará. Nos primeiros anos, conforme relatos dos jornais daquele período, prevaleceu o sistema semi-amadorista. Alguns jogadores recebiam gratificação por partida, espécie de avó do “bicho” que se tornaria moeda corrente nos anos 60 e 70.

Os atletas eram recompensados com empregos em repartições públicas, graças à influência de dirigentes influentes no mundo da política. Com arranjos e improvisos, o futebol adentrou a era profissional sem que os clubes tivessem receita suficiente para remunerar seus jogadores, que precisavam ganhar a vida com outras ocupações.

Estádios acanhados, com capacidade máxima de 5 mil espectadores, produziam arrecadações modestas, apesar da simpatia crescente que Remo e Paissandu já angariavam junto à população. Eram tempos de pós-guerra, com romantismo à flor da pele e atletas que se comportavam como torcedores de chuteiras.

Frequentes eram as demonstrações de amor incondicional pelos clubes e raríssimas as trocas de jogadores entre os rivais. Interessante notar, nesse mergulho aos arquivos do Pará boleiro, que a maioria dos técnicos também era diletante, contentando-se com alguns caraminguás pela função.

Já os dirigentes eram abnegados que dedicavam horas de seu dia a acompanhar a vida dos clubes, sem direito a remuneração. Como naquele tempo não havia importação ou exportação de pé-de-obra, nem empresários de atletas, os baluartes não tinham a chance de descolar um ganho extra, como virou prática contumaz até os dias que correm.

Com o surgimento de torneios regionais e nacionais entre seleções, cujo auge ocorreu na década de 60, iniciou-se o intercâmbio entre praças estaduais. De forma tímida, jogadores paraenses começaram a buscar espaço no Nordeste e no Sul maravilha. Craques como Quarentinha, Assis, Oliveira e Manuel Maria foram aproveitados em grandes clubes do Rio e de São Paulo.

Organizo esses apontamentos há algum tempo, a fim de estabelecer um paralelo entre o modus operandi da cartolagem do período amadorista e a atual. Grosso modo, pode se deduzir que, nos últimos 50 anos, o mundo evoluiu rapidamente, surgiram novíssimas tecnologias e estabeleceram-se novos pactos de relação trabalhista no futebol, mas o Pará teimosamente permaneceu atado ao passado.

Os jogadores tornaram-se profissionais, os técnicos também. O único lado que se mantém imutável é o dos dirigentes. Os de hoje parecem bizarras figuras de cera a representar antepassados. Como acontecia nos tempos de JK, remistas e bicolores continuam a dedicar tempo mínimo à gestão dos clubes, são centralizadores ao extremo e comportam-se como se estivessem sempre na arquibancada.

As diferenças, sutis, se revelam apenas na forma de remuneração, que se disfarça sob comissionamentos e ardis contábeis. Portanto, em comparação com os baluartes de antanho, os novos dirigentes representam um retrocesso. E, a cada nova exibição de despreparo, irrompe a mais urgente necessidade de uma escola – ou curso – que prepare gestores capazes de aliar paixão e pragmatismo com equilíbrio e eficiência. A ideia, por ironia, é bem antiga. Era defendida pelo grande Edyr Proença nos idos de 1960.

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O torcedor precisa ir logo se acostumando. Conforme o script desenhado pela Fifa, a Copa do Mundo de 2014 terá um indigesto pacote de jogos às 13h, alguns das fases decisivas. A escolha do horário mais quente do dia atende ao público europeu. Será a sexta Copa com partidas sob sol a pino. Antes, os boleiros penaram nos mundiais de 1930 (Uruguai), 1970 (México), 1978 (Argentina), 1986 (México) e 1994 (EUA).

A história mostra que seleções sul-americanas levaram sempre a melhor quando os torneios foram disputados sob céu ensolarado. Brasil e Argentina ganharam duas Copas e o Uruguai levou a primeira de todas.

Com essa escala de jogos, a Copa brasileira deve beneficiar equipes jovens, com velocidade e pulmão para superar seus adversários e as altas temperaturas. Renovação, portanto, é uma das chaves do sucesso.

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A capa do caderno Bola da última sexta-feira, sobre o imbróglio Marcelinho Paraíba, dividiu opiniões e teve o mérito de suscitar debates acalorados quanto ao papel da crítica jornalística. Além do caráter informativo, propôs discussão inédita em torno da divisa entre humor e achincalhe, escracho e desrespeito.

Recebi centenas de manifestações, via e-mails, telefonemas e mensagens no blog, Twitter e Facebook. Muitas mostravam irritação pelo uso da figura do mascote do clube sentado sobre o vaso sanitário. Outras tantas traziam elogios aos editores, lastimando apenas que o verdadeiro trapalhão da história não tivesse sido “homenageado” no desenho.

Em comum, o reconhecimento de que as trapalhadas da diretoria mereciam um tratamento forte. Aproveito para, em nome da equipe, agradecer aos que apoiaram e lamentar pelos que não entenderam, sentindo-se atingidos pela ilustração. A todos, a promessa de que continuaremos a conduzir a linha editorial do Bola pelos caminhos da crítica saudável e construtiva.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO deste domingo, 30)

19 comentários em “Sessenta anos de amadorismo

  1. Gérson, dá raiva de tanto amadorismo como as coisas são tratadas por esses dirigentes. A dificuldade pra ser sócio, a dificuldade pra escolher o presidente do seu clube de coração daqueles que preferem a míngua e o amadorismo do que perder poder e espaço dentro do clube. É triste. Parabéns pela coluna perfeita, tu te destaca inclusive de outros colegas jornalistas no Pará pela lucidez e pela força como combates o principal problema do futebol paraense: a má gestão.

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    1. O maior esforço dessa gente, amigo Víctor, é no sentido de manter o torcedor longe do centro de decisões. Quanto menos povo, melhor. É mais ou menos a lógica dos ditadores. Querem o povo apenas como massa de manobra e, às vezes, até conseguem. Mas, nada como um dia após o outro, já ensinam os livros de História.

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  2. O erro grosseiro e desrespeitoso foi colocar o mascote do PAPÃO alí , a marca Paysandu ou Paissandu deve ser sempre respeitada.
    Deveria ser uma charge do LOP no vaso.O Remo é motivo de chacota nacional por sua decadência e adminsitração pior que a do papão e não é tratado de forma jocosa
    !Imparcialidade e isenção jornalistica? Bem como sempre serei moderado ou nem isso.Mesmo sendo um dos que mais pede que se escreva com respeito e civilidade sou um dos moderados.Espero que o nobre escriba reavalie posições que o estão tornando “comum’.

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    1. Pastor, respeito sua opinião, como a de todos aqui. Entendo também os que se chatearam com a ilustração do Bola. Quanto a ser um jornalista comum, é justamente o que sou, com muito orgulho. Sou um trabalhador da notícia e luto pelas causas que acredito, apenas isso.

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  3. Parafraseando o genial Caetano Veloso, essa turma que criticou a charge do “Papão” sentado no torno, não entendem nada, pois quem deveriia, ficar sentado no Trono, seria o Dr. Luis Omar, e se isso aocntecesse, Ele poderia ajuizar uma ação reparatória por danos morais à sua Imagem. Voltando ao asunto “Amadorismo” dos dirigentes de Remo, Payssandu e Tuna ( sou torcedor da TUNA), pela leitura do tema, diversas vezes abordado em sua coluna e do Carlos Ferrreira, entendo que os Clubes citados, deveriam contratar Empresas especilaizadas para gerir o departamento de Futebol, estabelecendo Cláusula(s) que, se não impedissem, pelo menos minimizassem a interferência dos chamados Beneméritos, Grandes Beneméritos, “Aitolás” e similares, que, com raras excessões, mais atrapalham que ajudam.

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  4. Estas charges são feitas há décadas sem provocar qualquer problema. Por que toda essa confusão agora? Já vi coisa até pior, como remo e paysandu dentro da cova, e não se viu qualquer manifestação de desagrado. Agora, faz-se essa barulheira inteiramente desproporcional. Está muito claro que é manobra do atual mandatário e seus amigos para distrair os ingênuos. Não seja tolo, torcedor… Continue com as charges, Gerson!

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    1. Obrigado, Luiz. Quero dizer que o Bola sempre teve um estilo livre, gozador e crítico. Temos os melhores chargistas da imprensa paraense e o humor não pode ser patrulhado. A cada segunda-feira, o torcedor se acostumou a ver uma super edição pautada em gracejos, sarros e gozações transpostas das ruas. Este é o segredo do sucesso do caderno, que guarda muito da irreverência do Diário Olé. Quando AK destroçava o Remo, fomos implacáveis com ele e suas presepadas – muito mais até do que com o aloprado que infelicita o Paissandu no momento.

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  5. Gérson,
    Talvez haja uma ligação de algumas pessoas insatisfeitas com a charge encomendada pelo Romário em relação ao Zagalo, o que, entretanto, não se assemelha ao caso em discussão. Também nem cabe que alguém lhe imponha a pecha de preconceituoso com o Paysandú porque em outras oocasiões já foram utilizadas charges relacionadas com o Clube do Remo. Então, tudo normal.
    Não sou sócio do Paysandú e continuarei não sendo, pelo simples fato de que não teria sequer tempo para ajudar de qualquer forma meu ÚNICO CLUBE DE CORAÇÃO.
    Sentimento, Gérson, não se forma da noite para o dia e, sem dúvida, o Paysandú faz parte da minha história, desde quando ouvia as transmissões dos jogos com Meu Avó Afonso (e escutava os comentários do Grimoaldo Soares que já me encantava com seu modo firme e opiniões precisas sobre o jogo), ia para a Curuzú com meu Pai (ainda criança), bem como quando fui a primeira vez ao Mangueirão (um jogo contra a Tuna Luso, à noite), e, inesquecível o primeiro Paysandú e Remo com o Mangueirão ainda bandola.
    Não percebo a charge da capa como capaz de agredir a Instituição, entretanto, como já disse, não sou sequer sócio do Paysandú. Na verdade, ela retrata um sentimento natural de todo aquele que acompanha o futebol do Pará, seja azul-celeste ou azul-marinho, pois é certo que ambos vivem numa inveja mútua e copiam erros históricos e administrativos há décadas.
    Acredito que existem muitos outros problemas relevantes dentro do Paysandú, como a situação de desigualdade narrada nos noticiários de que apenas os jogadores de fora tem respeitados os prazos de pagamentos de salários e que os empregados do clube que não são jogadores profissionais está há meses sem receber salário, não obstante estes sejam valores infinitamente menores do que os concedidos aos atletas.
    Agora, imagine o que poderia acontecer com o Marcelinho Paraíba aqui, recebendo o que foi noticiado pela imprensa: guardadas as devidas desproporçõs entre as situações, é o mesmo que está enfrentando o HULK no time russo onde está jogando, no qual os jogadores já demonstraram (e com salário em dia) enorme insatisfação com os astronômicos valores destinados ao brasileiro.
    Há muito lembro de uma notícia divulgada pela imprensa, de que o bicho prometido antecipadamente aos jogadores pela conquista do Campeonato Paraense quando o Édson Gaúcho foi campeão como treinador não foi pago… ora,ora, prometer bicho para ganhar o Regional é dose pra elefante: ser campeão Paraense para Paysandú e Remo é obrigação. Injeção de ânimo deveria haver para subir de divisão, mas, infelizmente, parece que não há equilíbrio para ver o óbvio.
    Agora, Gérson, vou tomar a liberdade de voltar a um assunto que Você insiste em não dar o braço a torcer: o nome é PAYSANDÚ SPORT CLUB e não Paissandu, como Você insiste em escrever. Você gostaria que alguém escrevesse seu nome como Gérxon ou Jérson? Acredito que não.
    Para finalizar, a Imprensa Esportiva do Pará só cresceu e se agigantou em virtude de baluartes e, principalmente, pela da paixão do Paraense pelo futebol, entretanto, hoje, acredito que Paysandú e Remo somente ainda impõe atenção de muitos torcedores pelo trabalho que Vocês da Imprensa fazem, pois tendo um time atualmente brigando para não cair para a Série D e o outro sem divisão, só com muita coragem e determinação para continuar dourando uma pílula que já está opaca há muito tempo.
    Continuarei seguindo o blog e ratificando que seus textos são de qualidade e que, apesar de alguns poucos pensarem na Imprensa Esportiva como representantes menores da Imprensa em geral, aqui em Belém, isso não tem nada de verdadeiro, pois, em verdade, sua presença nas diversas mídias é reconhecidamente uma das melhores impressões sobre o futebol que temos em nosso Estado.
    Um abraço e siga em frente.
    José Maria Eiró Alves.

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  6. Chega a ser inacreditável chamar aquilo de “crítica jornalística”. Bola perdeu uma grande chance de ser de fato diferenciado, ao invés disso preferiu o caminho mais fácil da escatologia e do baixo nível, sem qualquer aprofundamento do debate.

    É uma pena que as pessoas contrárias ao que foi feito por esse jornal sejam vistas apenas como “torcedores fanáticos que só avaliam as coisas pelo coração e não pela razão.”

    É sempre essa a desculpa da imprensa quando o leitor, ouvinte ou telespectador não concorda com alguma abordagem jornalística. A verdade é que aqui do outro lado há seres pensantes que não engolem algo como verdade só porque é a imprensa que está mostrando ou dizendo.

    Continuo com minha opinião sobre aquela capa horrenda e que nunca em tempo algum poderá ser chamada de “crítica jornalística” mas apenas uma forma de retaliação, tão próprio quando o 1º poder (a imprensa) sente-se ofendido por algo ou alguém.

    Será que isso que vcs chamam de “tratamento forte”?

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    1. O exagero em torno da capa do Bola está chegando às portas da paranóia. Como “forma de retaliação”, Marlene? Não agrida minha inteligência. Se ainda não percebeu, não perco tempo brigando com dirigentes, principalmente os desqualificados e irresponsáveis. Ao contrário dele, tenho um nome a zelar, sou alfabetizado e tenho a capacidade de pensar. Minha resposta às diatribes dele foi dado em coluna assinada, pois jamais tive medo de cara feia e assumo posições abertamente. Portanto, me respeite e não confunda as coisas. Além do mais, a equipe do Bola tem autonomia para trabalhar. São profissionais dignos, que não se pautam por interferências ou imposições (e eu jamais imporia qualquer coisa a um companheiro de Redação). Esta foi minha última manifestação sobre esse tema, cujo debate só convém ao próprio presidente, que sempre busca desviar o foco dos verdadeiros problemas do clube. Fico impressionado como ainda há quem dedique esforço a isso e feche os olhos para todos os males causados ao clube pelo aloprado cartola.

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  7. “VIVA A LIBERDADE DE EXPRESSAO”.
    COMO SE ISSO EXISTISSE DE FATO NA IMPRENSA.

    GERSON, VC FALA EM RESPEITO, MAS É ISSO QUE FALTOU NA FAMIGERADA CAPA DO BOLA.

    DE NOVO VEM A HISTÓRIA DE QUE FECHAMOS OS OLHOS PARA AS DIABRURAS DO LOP E NOS DEDICAMOS A FALAR MAL DA CAPA DO BOLA.

    DE NOVO VEM O ARGUMENTO QUE TEIMA EM NÃO ENTENDER NOSSA REAÇÃO CONTRÁRIA À CAPA ESCATOLÓGICA.

    CONCORDO QUE OS CHARGISTAS PARAENSES SÃO UNS DOS MELHORES E QUE HÁ NA IMPRENSA CABEÇAS PENSANTES, POR ISSO FIQUEI SURPRESA COM A HORRENDA CAPA.

    AGORA, PELO QUE VEJO, TEMOS QUE APLAUDIR TUDO QUE A IMPRENSA FAZ, SENÃO É CENSURA. ORA, ORA!

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  8. Gerson, amigo querido, estou contigo e não abro!! Deixa as marlenes da vida dizer o que quiserem, a vida segue… Remista que sou, já fiquei muitas vezes muito pdavida com algumas charges do Atorres, meu amigão querido, mas não posso deixar de te dar meu apoio. A paranoia toma conta do futebol no Pará porque chegamos ao fundo do poço: a tal de série D (que só está esperando um vacilinho pra engolir o papão, aliás, papão deve papar e não ser papado, né?)… Um forte abraço e conte comigo pra enfrentar essa batalha contra o pior dos dirigentes que já passaram pelo meu rival. Quem diria que um dia eu ia achar que um “tourinho” era melhor do que um “asno aLOPrado”!! Que o Paysandú (concordo totalmente com o amjgo Eiró: o nome original é Paysandú) consiga sair desse aperto, para alegria de todos nós torcedores paraenses que ainda acreditamos no futebol paraense.
    Amigos bicolores, estamos de braços abertos, esperando-os no “fora de série”! Quem sabe, juntos, não somos mais fortes pra sair dessa terrível situação?

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