Germânicos marcham para o título
Nada de Messi, Cristiano Ronaldo ou Kaká. Depois do show de bola deste sábado, está mais do que óbvio que o candidato a craque da Copa veste a camisa alvinegra. E não se pode dizer que apenas um nome concorre. Incrível, mas pelo menos cinco jogadores alemães podem reivindicar essa honraria: Philip Lahm, Mesut Özil, Thomas Müeller, Lukas Podolski e Bastian Schweinsteiger. Todos estão jogando o fino da bola, um nível acima dos demais atletas da competição. Demonstram excelência técnica, envolvimento coletivo e capacidade de decidir. Tudo isso a partir de intensa movimentação em campo, até nos minutos finais das partidas.
Ontem, deu pena ver a Argentina de Diego Maradona perdida em meio à intensa rotatividade da seleção de Joachim Löw. O que chama atenção no time alemão, além das figuras acima citadas, é o preparo. Não apenas físico, mas emocional também. Sofrendo faltas violentas desde o começo do jogo, sob a complacência do árbitro Ravshan Irmatov, do Uzbequistão (ô Copa para inventar árbitros estranhos e fracos). Mascherano e Heinze cansaram de distribuir bordoadas nos alemães, que reagiam com fria superioridade. Além do banho de bola e do gol logo de cara (aos 3 minutos), essa postura
segura contribuiu para minar a resistência do time de Maradona, que lembrou durante todos os 90 minutos as fragilidades brasileiras no segundo tempo de sexta-feira. A mesma dificuldade para enfrentar um placar adverso e a ausência de estratégias para buscar o gol. Como Kaká e Robinho na véspera, Messi e Tevez sumiram em campo quando marcados de perto.
Confesso que apostava mais na Argentina, principalmente porque tinha craques para usar como trunfo. Nunca foi um primor como time, mas se
destacava pelas atuações individuais de alguns jogadores. Frente à sólida Alemanha, os talentos alvicelestes murcharam. Como não havia organização tática, o time inteiro ficou desnorteado, sem opções para ressuscitar em campo. A velha fibra estava presente, mas em quantidade insuficiente para dobrar um oponente superior.
Brasil e Argentina desabaram ao se defrontarem com equipes bem armadas. A Holanda e a Alemanha não são equipes imbatíveis, mas têm conjunto e sabem o que fazer em campo. Para um time alcançar esse estágio, precisa treinar muito e adequadamente. Dunga e Maradona, por mais boa vontade que se tenha, não são treinadores, portanto não sabem treinar ninguém. O fracasso dos dois gigantes sul-americanos é também a derrota da improvisação, o que nem sempre é tão ruim assim.
Celeste Olímpica de volta à elite
No fundo, ninguém esperava, mas alguns dos melhores momentos da Copa aconteceram no embate entre Uruguai e Gana. Não falo de técnica, mas de emoção e dramaticidade, algo raro de ver neste Mundial. O lance do bombardeio sobre a meta uruguaia no instante final da prorrogação e as defesas que o centroavante Suárez foram estonteantes. Depois de rebater a bola em cima da linha com o pé direito, o centroavante teve sangue frio para usar as mãos e impedir que a bola, cabeceada à queima-roupa, fosse parar nas redes. Sensacional, ainda, foi a cena do próprio Suárez comemorando intensamente junto ao túnel a perda do pênalti pelo atacante de Gana.
Momentos que entram para o grande arquivo de lances palpitantes da história das Copas. Não satisfeita, a Celeste proporcionaria ainda outra grande cena: a penalidade cobrada por El Loco Abreu, no mesmo estilo do gol que ele havia feito nas finais do Campeonato Carioca contra o Flamengo, à la Panenka, tcheco que inventou a deixadinha sutil nos pênaltis. Se acompanhasse o futebol brasileiro, o goleiro Kingson teria marcado a jogada, o que nos leva à constatação de que informação é tudo, até em futebol.
Sem pretensões maiores, quase como um patinho feio, o Uruguai chegou a esta Copa. Classificou-se na 25ª hora, na repescagem contra Costa Rica, mas desembarcou na África do Sul com a felicidade dos favoritos. Ao contrário de determinadas seleções, a de Oscar Tabárez abriu suas portas à torcida e aos nativos. Conviveu intensamente com os moradores de Kimberly, num ritual que integra o protocolo informal das Copas e quem em outros tempos (58, 62 e 70) o Brasil soube executar muito bem.
Nas oitavas, encarou a Coreia do Sul, que ameaçava repetir a grande performance de 2002 (quando terminou em 4º lugar). Superou os asiáticos, mais pela força que pela técnica, e chegou às quarta-de-final com altivez, para enfrentar a emergente Gana, última sobrevivente da derrocada africana na Copa. Por 120 minutos, o placar ficou empatado, embora os africanos tenham sido bem mais agudos nas tentativas. E, contra uma Celeste visivelmente exausta do combate, quase chegou ao gol no minuto final da prorrogação, no pênalti perdido por Asamoah Gyan. O toque final, de saudável molecagem, viria pelos pés de Sebastian Loco Abreu, ídolo do meu Botafogo e tão aferrado a superstições como Zagallo, a ponto de só usar a camisa 13. Esse conjunto de circunstâncias serve para tornar ainda mais expressiva a reentrada do Uruguai na elite do futebol mundial.
(Coluna publicada na edição do DIÁRIO deste domingo, 4)