
POR GERSON NOGUEIRA
Engana-se quem pensa que a goleada sofrida pelo Papão anteontem em Juiz de Fora foi produto de mero acaso. Na verdade, ela se materializou no jogo contra o Tupi, mas vinha sendo gestada aos poucos, precisamente desde a decisão do Parazão frente ao São Francisco.
É importante notar que, diante do Leão santareno, o título estadual veio de um gol meio sem querer de Lombardi em partida duríssima. Os dez minutos finais foram amplamente dominados pelo time interiorano.
Contra o Gama o título tão almejado da Copa Verde só não foi parar em mãos candangas graças ao felicíssimo disparo de Raí logo na abertura dos trabalhos. Apesar da vantagem de 2 a 0 estabelecida em Belém, o transcurso daquela partida mostraria um Papão perigosamente apático e desplugado.
Quase pedia para levar a virada, tamanha a desconexão entre os setores. O placar de fato foi revertido, embora em quantidade inferior às necessidades do Gama. O detalhe é que o adversário atuou desde o primeiro tempo com um jogador a menos.
De qualquer modo, a perda da longa invencibilidade naquela noite brasiliense acendeu luzes alaranjadas de alerta na Curuzu. Talvez os festejos junto à torcida em Belém não permitiram que o problema fosse enfrentado com a ênfase exigida.
Logo a seguir, a equipe embarcou para a estreia na Série B diante do Ceará e os apagões voltaram a se manifestar, como sina, desta feita sobre o miolo de zaga e setor de marcação. Nos três primeiros minutos do segundo tempo, o Papão sofreu dois gols e bambeou, quase entregando os pontos. Apesar dos vacilos, a equipe se reergueu emocionalmente e teve brios para buscar o empate, terminando o embate em ligeira superioridade técnica.
Contra o Operário-R, pela Copa do Brasil, novos e eloquentes sinais foram emitidos, como se a engrenagem pedisse socorro. Algo já não ia bem e impunha a necessidade de providências. O comportamento dos bicolores na fria Ponta Grossa beirou a inércia. Uma única chance de gol e um festim diabólico de passes errados, marcações equivocadas e nenhuma criatividade. Mesmo com 10 jogadores desde o primeiro tempo, o adversário não só venceu como foi mais focado – o extremo oposto da representação paraense.
Veio a segunda rodada da Série B e o Papão tornou a titubear. Desta vez, dentro de casa. Contra o arrumadinho Oeste-SP, projeto imberbe (e louvável) do futebol conceitual que o Barcelona de Pep Guardiola praticava, os bicolores passaram por vários aperreios.
Em nenhum instante foi possível ver em campo a habitual força de marcação do duo Capanema-Recife. Ambos pareciam travados diante da frenética movimentação de Mazinho Loiola, Clébson, Ricardo Bueno, Léo e Francis, principalmente. Só paravam as jogadas com faltas.
Mais do que um problema a ser atribuído exclusivamente aos volantes, estava exposta ali uma falha sistêmica, que abrange alas, atacantes e meias, principalmente. Os armadores Celsinho e Rafael Costa não jogaram e nem ajudaram a combater o organizado meio-campo do Oeste. Em consequência desse descompasso, o Papão tomou um gol de futebol de salão e só foi empatar na metade da etapa final.
Veio, então, Juiz de Fora. Todos os problemas acima mencionados foram potencializados contra o Tupi. A mesma lentidão, o impasse no avanço dos alas, o sumiço de vida criativa no meio e o isolamento dos atacantes. Tudo o que já havia sido mostrado nos seis jogos anteriores materializou-se de uma só tacada. O escore de 5 a 1 foi exagerado, mas a derrota foi justa e até previsível pelo retrospecto recente.
A Série B terá ainda 35 rodadas. Há tempo suficiente para ajustes que permitam alimentar o sonho do acesso, mas a goleada deixou claro que algo precisa ser feito – e já.
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A escolha de Veiga
A notícia passou quase em brancas nuvens no fim de semana, mas aos poucos foram surgindo os detalhes. O Bragantino-SP havia procurado o técnico Marcelo Veiga para voltar a comandar o time depois que Léo Condé entregou o cargo.
O gesto, apesar de normal nas relações de trabalho no futebol, não deixa de revelar o comprometimento do treinador com o projeto azulino de acesso à Série B, prioridade máxima no clube depois do retumbante fracasso nas três primeiras competições da temporada.
Partiram de Veiga as indicações dos principais reforços do Remo para o Brasileiro. O técnico foi buscar a experiência de Edson, Allan Dias, Brinner e Fernandinho para lustrar o time com um verniz competitivo que inexistia no Parazão e, mesmo, na Copa Verde. Decidiu fazer uma aposta no jovem meia Héricles e no volante Lucas. Além desses jogadores, o clube trouxe Michael Schmoller, avalizado por Veiga.
Na comparação direta com o antecessor, apesar de nenhum resultado relevante até agora, Veiga leva a vantagem de ter conseguido dar uma lapidação tática à equipe. A marcação à frente da zaga melhorou, embora o setor defensivo permaneça instável nas bolas aéreas.
O desafio está localizado na produção ofensiva, onde Patrick, Edno, Ciro, Fernandinho, Silvio e Luís Carlos brigam por duas vagas, pois Veiga já deixou claro que dificilmente utiliza três atacantes de ofício. Como antes, toda a articulação do ataque passa pelo trabalho de Eduardo Ramos e Allan Dias, até porque os alas ainda não têm o dinamismo necessário para contribuir com cruzamentos e jogadas de fundo de campo.
Na estreia contra o Cuiabá, a dupla de armação não funcionou a contento, dando a impressão de que todo o esforço de Veiga deverá se concentrar agora na consolidação do rodízio entre Ramos e Dias nas investidas rumo à área adversária, pois enquanto continuarem a atuar no mesmo espaço o Remo terá a repetição do problema que ocorreu quando Athos dividia a zona de criação com Ramos.
(Coluna publicada no Bola desta quinta-feira, 26)