Por Gerson Nogueira
Quando as bolinhas começarem a girar no sorteio de hoje, a segunda Copa brasileira estará começando de verdade. Há quem considere, com certa razão, que o torneio se inicia nas eliminatórias, mas a ambientação da disputa final se esboça mesmo na definição da tabela de jogos. Na divisão dos grupos, teremos a sinalização do que será a Copa em sua primeira fase, permitindo projetar os cruzamentos entre as seleções.
Desde já, antes mesmo de se conhecer o “grupo da morte” e a maior barbada da fase inicial, é possível ter uma ideia da grandiosidade do evento que o Brasil irá sediar a partir em junho/julho de 2014. A presença de grandes personalidades do esporte e jornalistas do mundo todo na Costa do Sauipe, na Bahia, atesta a importância do torneio.
Diante disso, ainda sem contabilizar os lucros de imagem por tanta exposição na mídia, soa esdrúxula a crença que alguns – por desinformação ou má fé – alimentam e defendem quanto à inutilidade de uma Copa do Mundo no Brasil. Bobagem. Todos ganham com o torneio, alguns mais (Fifa), outros menos (país-sede, seleções e torcedores). E não se trata apenas de dinheiro.
É preciso entender sempre que sediar uma Copa é projeto natural de qualquer nação do planeta, até mesmo as menos desenvolvidas. Isso se explica pelo óbvio lucro financeiro e também pelas heranças imediatas, como grandes arenas e obras de infraestrutura. A problemática África do Sul, há quatro anos, teve cidades – como Durban e Porto Elizabeth – praticamente redesenhadas.
Claro que os atrasos e demais entraves de gestão, recorrentes no Brasil desde sempre, impossibilitam que cidades como Natal, Manaus e Curitiba se beneficiem plenamente desse legado, mas, ainda assim, é um tremendo negócio promover o Mundial.
O bom do futebol é que, em junho e julho, todos os demais ganhos (35 milhões de dólares só para o time campeão) serão deixados de lado para que a briga pela taça concentre todas as atenções e esforços. Como meninos, alguns dos mais bem pagos futebolistas do mundo estarão empenhados apenas em jogar bola, para vencer e passar à história. E o encanto do esporte é que tem o poder de, por 90 minutos, transformar homens em crianças.
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Um épico de 120 minutos
A ESPN exibiu ontem o VT completo de Itália x Alemanha, a dramática semifinal dramática de 1970, no estádio Azteca, na Cidade do México. Mais de 102 mil torcedores superlotando as arquibancadas para ver craques como Sepp Mayer, Albertozzi, Seeler, Sandro Mazzola, Domenghini, Overath, Seeler, Rivera, Müller, Facchetti e Beckenbauer.
Peguei o jogo já no final do primeiro tempo. Arbitragem mexicana, enroladíssima e omissa, para um dos mais sensacionais jogos de todas as Copas. O time italiano, tecnicamente inferior, compensava com preparo físico admirável e marcação cerrada, defendendo-se com a força de 1000 legiões romanas.
A vantagem de 1 a 0 para a Itália (gol de Boningsena) se manteve até os acréscimos, quando o zagueiro Schnellinger empatou, no único gol de sua carreira. E veio então a meia hora mais fantástica da história do futebol, pelo menos na minha opinião. De tirar o fôlego.
Sem a proteção das caneleiras, inexistentes à época, os times jogavam de meias arriadas, voando baixo. Beckenbauer havia fraturado a clavícula e apenas fazia número, sem disputar a bola ou correr normalmente. As duas substituições alemãs já haviam sido feitas.
Logo aos 4 minutos, Müller aproveitou cochilada da zaga e tocou para as redes, desempatando o placar. Indômita, a Azzurra não se amofinou. Pelo contrário. Quatro minutos depois, Burnigch igualou outra vez. Aos 13, em contragolpe fulminante, com a zaga alemã exaurida pelo sacrifício do Kaiser, Riva bateu cruzado para desempatar.
O ritmo era cadenciado, mas sempre intenso. Aos 4 da segunda etapa da prorrogação, Müller mergulha para novo empate. Mal comemorou, pois Rivera faz 4 a 3 apenas um minuto e meio depois.
A partir daí, mesmo lutando heroicamente, a poderosa Alemanha saía da Copa, pronta para ganhar o torneio seguinte quatro anos depois. E a Itália se credenciava para encarar o Brasil de Pelé e Tostão na final mexicana. Mas, aí, já é outra história.
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Adeus a um grande homem
Foram 27 anos de cárcere. Quando saiu, Nelson Mandela emergiu como exemplo de luta contra o apartheid. Unificou os sul-africanos e sua cruzada pela liberdade virou referência no mundo inteiro. Em 2010, tive o privilégio de observar de perto a admiração e o carinho dos compatriotas por Mandela. Em Soweto, entrei em sua antiga casa, que hoje é museu. Pai da África, o grande homem se vai, mas seu exemplo permanece.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 06)