O Vasco, que ostenta o melhor desempenho na temporada brasileira depois do Santos (que levantou a Taça Libertadores e vai disputar o Mundial de Clubes), carregava injustamente há até bem pouco tempo a pecha de clube mais antipático do país. Essa triste condição derivava da rejeição provocada pelo presidente-ditador Eurico Miranda, que controlava o clube com mãos de ferro, como se fosse propriedade sua. São Januário parecia uma república das bananas, exoticamente retratadas naquelas comédias hollywoodianas. De suspensórios, charuto em punho e aquele ar petulante dos capos, Eurico tinha até camarote exclusivo, de onde acompanhava os jogos furtivamente. Fazia o diabo com os recursos do clube, promovia negociatas de jogadores e troca de técnicos que o desagradassem. Enfim, um coronel à moda antiga tomando conta do terreiro cruzmaltino.
Os associados e torcedores vascaínos eram impotentes de influir nos destinos do clube, cujos estatutos favoreciam a permanência infinita do cartola, apoiado ainda pela velha guarda da colônia lusitana. Da insatisfação generalizada, porém, nasceu uma ampla mobilização, encabeçada pelo ídolo Roberto Dinamite, que se encarregou de derrubar nas urnas a ditadura instalada nos arraiais do clube da Colina. A reconquista do Vasco pelos vascaínos consumiu quase uma década de esforço inquebrantável e trabalho árduo dos oposicionistas.
Refiro-me à odisséia vascaína para citar a situação atual do Paissandu, entregue a uma gestão caótica, cujo dirigente máximo tem a pachorra de admitir que o clube está cheio de dívidas (fala em R$ 1,2 milhão, mas as contas mais sérias sinalizam algo superior a R$ 2 milhões) e que “todo ano é assim mesmo”, admitindo que pretende se endividar ainda mais para tentar sair do atoleiro. A realidade desmente esse anseio e descortina um horizonte dos mais sombrios para o clube, caso seus apaixonados torcedores e associados mais conscientes não tomem as rédeas do processo.
Não adianta ficar deplorando o gesto autoritário e ignóbil de barrar a entrada de profissionais dos veículos do grupo RBA na Curuzu, como se a punição ao sofá resolvesse o problema do adultério. Aliás, a lei da mordaça imposta aos jornalistas e radialistas é apenas um dos muitos traços que equipara os diretores do Paissandu aos métodos de Eurico no velho Vasco. O ex-sultão de São Januário também tinha pretensões de calar seus críticos, impedindo-os de acompanharem a vida do clube. Bobagem. Qualquer garoto medianamente informado sabe que, nestes tempos de informação digital, é suprema burrice sonhar com censura.
Cabe observar, porém, que a represália dos coronéis bicolores aos veículos que não os bajulam é café pequeno diante da montanha de abacaxis que o Paissandu terá que descascar até o recomeço das competições oficiais, marcado para 14 de janeiro, com a abertura do Campeonato Paraense. Até lá, essa diretoria – que tem mandado até o fim de 2012 – terá que quitar as dívidas acumuladas junto a jogadores, técnicos, funcionários e agências de viagens. Ao mesmo tempo, precisará ter competência para montar um novo elenco e contratar outro treinador.
O drama é que não há dinheiro, muito menos competência. Só resta ao Paissandu e a sua nação de adeptos, a essa altura, rezarem para que os deuses do futebol abreviem essa aloprada gestão. Até o momento, a única ideia surgida foi a de borrifar água benta na Curuzu. É ridículo, mas, de certa forma, significa um progresso para quem ressuscitou a extinta prática do “bicho” pago em vestiário, contratou uma fieira de atletas por imagens de DVD e já manifestou (a sério) a intenção de surrar técnico e jogadores com vara de marmelo. O Paissandu, que está às portas do centenário, precisa urgentemente rejuvenescer.
Samuel Cândido e Charles Guerreiro encabeçam a pequena lista de técnicos regionais cogitados para assumir o Paissandu. O primeiro, por ser mais disciplinador, leva ligeira vantagem na preferência dos cartolas.
O Remo curte recesso, por força de suas cabeçadas no primeiro semestre, mas a crise não tira férias. Informações oriundas de Antônio Baena indicam que cinco jovens atletas – entre os quais os talentosos Betinho e Tiago Cametá – já estão sob assédio direto de agentes e a um passo de deixar o clube que os revelou. A teimosia, irmã gêmea do destempero, continua a marcar a ferro e fogo a maioria dos gestores do nosso futebol. Parece que jamais aprendem. Errar, nesse caso, é uma sina.
Direto do blog
“A mesma ladainha e chororô de perdedor de sempre, será possível que esse presidente vai querer entregar o clube na 4ª Divisão? Os erros permanecem e esse nefasto ‘planejamento’ de timinho só é engodo para nós, torcedores. O mesmo ciclo se repete e vejo-me longe dos jogos, pois já sei qual é o verdadeiro final. Deixa-se 20 e depois contratam mais 80 para manter a média de 100 pernas-de-pau no elenco. Mais dívidas e pouca honraria com as cores do Bicola. É melhor encomendar o enterro, pois o caixão ele vai selá-lo no final do mandato. Coitado da torcida, te dizer!”.
De Douglas Moraes, injuriado com as desculpas esfarrapadas que já duram seis anos.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quarta-feira, 23)