Conexão África

Sob o signo da balbúrdia
A equipe da Rádio Clube e DIário do Pará desembarcou ontem, às 7h30, em Johanesburgo, depois de 12 horas de espera em São Paulo pelo voo da South African Airways. A verdade é que a expectativa de cobrir uma Copa do Mundo compensa sempre eventuais atropelos e tudo fica em segundo plano diante do privil[egio de acompanhar de perto a movimentação dos principais jogadores de bola do planeta, a partir do dia 11.
Depois do que vimos e passamos neste primeiro dia em Johanesburgo, espero que o futebol compense realmente tudo o que ainda está por fazer – e não será feito (por absoluta falta de tempo) pelos sul-africanos para organizar sua primeira Copa. Tudo o que foi dito pelos repórteres de TV é quase nada diante do caos em que se encontra a principal sede do Mundial a apenas três dias da abertura do evento.
O transporte público, que a Fifa coloca como item prioritário no caderno de encargos para organização do torneio, simplesmente não existe aqui. Não é forca de expressão: não existe de fato. Ônibus sao raros e os que circulam, em condicões precárias, obedecem a itinerários que ninguém entende. São diversas rotas informadas nas placas, mas os jornalistas e pessoas que trabalham na organizacão do mundial só conseguem chegar aos lugares alugando vans e furgões (aqui chamados de kombis).
Quem precisa pegar táxi, não tem como se virar porque eles simplesmente não circulam. Aparecem alguns, no estilo lotação, mas sao pouquíssimos e caros (com preço combinado conforme a cara do passageiro). A partir das 17h, quando o dia escurece, tudo fica ainda mais difícil e perigoso: só se arvora a andar pelas ruas quem sai em grupo ou em automóveis alugados.
Os precos continuam lá no alto, bem diferente do que imaginavam autoridades e agentes de turismo, apostando na normalização de serviços e produtos a partir da baixa procura. Imagino que a coisa funcionou às avessas: como são poucos os turistas, os nativos resolveram aloprar nos precos. Qualquer vuvuzela não sai por menos de 60 hands, que vem a dar algo em torno de R$ 15,00, o que é um valor exagerado.
Estou escrevendo isso depois de ficar por mais de três horas na fila do credenciamento, num terreno poeirento e cheio de obras ainda por concluir no entorno do estádio Soccer City. O barulho permanente das britadeiras e dos operários em ação, além do ruído de um helicóptero sobrevoando a tenda da organização, amplificam o clima de balbúrdia. Tudo isso pode ter influído um pouco no azedume do texto, mas infelizmente não estou exagerando.
Começo a achar que o coronel Antonio Carlos Nunes tinha razão quando desceu a ripa no sistema de segurança. E olha que nem nos aventuramos por Soweto, de onde Nunes saiu aterrorizado, quando lá esteve na Copa das Confederações. Quando se passa pelas ruas de Johanesburgo, é inevitável comparar e concluir que Belém, com sua infinidade de problemas, poderia – sim – sediar jogos da Copa. E se sairia muito melhor, principalmente pela alegria e hospitalidade de seu povo.
 
A babel habitual
de uma Copa
agora é real
A quantidade de estrangeiros reunidos num só lugar, ao mesmo tempo, costuma produzir uma sinfonia de idiomas, que fica evidenciada nas coletivas de imprensa e até mesmo no burburinho dos restaurantes do Centro de Imprensa. Desta vez, a babel existe e vai além da diversidade de línguas. Tem mais a ver com a ausência de sentido mínimo de organização.
Os voluntários sul-africanos, ao contrário de seus similares alemães na Copa de 2006, agravam a sensação de caos, mesmo quando querem ajudar – e, normalmente, querem. Ontem, acompanhamos a tentativa confusa de organizar a espera pelos ônibus credenciados da Fifa, perto do estádio Soccer City. Como também estávamos na fila, foi possível ver que cerca de 10 ônibus chegaram e foram embora sem levar ninguém, embora houvesse pelo menos 20 jornalistas a esperá-los. Por tudo isso, será, de fato, uma Copa diferente. Em tudo – tomara que até na capacidade de surpreender.
 
Fenômeno, Kaká e muito rúgbi
A TV sul-africana tenta entrar no clima da Copa, exibindo enquetes e curiosidades em meio a programas de auditório, gincanas e a transmissão de muitos jogos de rúgbi, o esporte mais popular do país e disputado preferencialmente por brancos. Ontem, por várias vezes, vi perguntas sobre o recorde de Ronaldo Fenômeno (artilheiro máximo das Copas, com 15 gols) e sobre Kaká, o brasileiro mais badalado na mídia (jornal The Times) e nos cartazes espalhados pelas principais ruas de Johanesburgo.    
 
Mauro Silva e Valderrama
O campeão mundial Mauro Silva, um dos bambas daquele time campeão nos Estados Unidos em 1994, viajou no nosso voo para Johanesburgo. Será comentarista do canal Band Sports. Simpático, expressou otimismo na seleção de volantes de seu amigo Dunga. E avaliou que o “clima” lembra muito o daquela Copa. Só não disse quem será o Romário da vez. 
O bom Mauro Silva só não fez mais sucesso do que Valderrama, que mantém a marra e a cabeleira dos tempos de jogador. Passou quase correndo pelo aeroporto de S. Paulo para embarcar no mesmo voo e foi reconhecido por jovens fãs, que saíram correndo em busca de autógrafos. A contragosto, atendeu a uns dois ou três e sumiu na direção da área de embarque. 
 
O homem e
suas crenças
Diante da boa aparição dos reservas Ramires, Gilberto e Daniel Alves na goleada frente à Tanzânia, Dunga fica com uma série de alternativas para tornar a saída de bola mais criativa, menos atropelada. A dúvida é saber se ele prefere isso a abrir mão de algumas de suas apostas mais sagradas: Felipe Melo e Elano.

8 comentários em “Conexão África

  1. Tomara que esse caos se resuma ao fora de campo, pelo menos, para que com a bola rolando essa Copa não seja um fiasco. Já pensou gramados ruins, estádios com problemas estruturais, pane nos sistemas elétrico e de envio de informações com prejuizo de televisionamento e da internet por exemplo? Vc acha que algo assim pode acontecer, Gerson?

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    1. Caro Sylvio, sem patriotadas, o que eu vi aqui nesses poucos dias me deu a certeza de que o Brasil faz a Copa com um pé nas costas, dando show. E Belém também estaria em plenas condições de receber jogos. Quando vejo a ausência de transporte adequado e a insegurança reinante, não tenho dúvida: 2014 será uma Copa inesquecível, principalmente para os que se arriscaram a ver de perto a Copa sul-africana.

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  2. Você deve estar se sentindo em casa. Brincadeiras a parte, este seu relato sobre esta sua primeira impressão sobre essa sede da Copa do Mundo, nós não vemos e nem lemos em nenhuma cobertura que está sendo feita pelos veículos de comunicações que estão transmitindo. Espero que continue a nos abastecer desses relatos.
    Parabens pela franquesa.

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