Conexão África (5)

Bola na trave pode ter custado a vaga

Copa do Mundo vira a cabeça, altera o humor, mexe nos horários e afeta até casamentos no Brasil. Na África do Sul, que está descobrindo o que é a paixão pelo futebol, as coisas ainda não são tão complexas assim. A primeira Copa começou de maneira inteiramente diferente de tudo que já se viu antes. A começar pelas duas atrações, pertencentes aos segundo e terceiro escalões do futebol mundial. Quando vi Parreira anunciar sua escalação com apenas um atacante de ofício já vislumbrei suas famosas retrancas no escrete canarinho. No Brasil, era atacado por esse pendor defensivista. Tempos em que filosofava que o gol é apenas um detalhe e outras pérolas do gênero.
Ocorre que, no comando dos Bafanas-Bafanas, não se pode exigir de Parreira ousadias táticas. Tem que dançar conforme a música, ainda que seu adversário seja apenas o México, cuja principal característica é a correria sem objetividade. Além disso, Javier Aguirre padecem de uma marra doentia, certos de que já estão na elite, o que não é verdade. Justamente pela empáfia que caracteriza o México atual, Parreira teve a chance de jogar nos contra-ataques desde os primeiros minutos. Sofreu um sufoco lascado até os 10 minutos, mas, a partir daí, passou a sair de seu campo, tocando a bola e experimentando algumas triangulações, quase sempre puxadas pelo bom Modise (2), um lateral direito que joga com autoridade de meia-armador e é muito mais produtivo que o badalado Pienaar. Apesar disso, o primeiro tempo foi inteiramente nulo em ações ofensivas por parte dos sul-africanos. O México ameaçou por duas vezes. Na segunda, com Vela, a bola foi parar nas redes, mas o auxiliar flagrou corretamente um impedimento.
Foi através de Modise que saiu o primeiro gol da Copa. Correndo pelo meio-campo, ele descobriu o atacante Tshabalala entrando livre pelo lado esquerdo, na diagonal. O lançamento apanhou a zaga mexicana desarrumada e a finalização, num tiro cruzado, foi perfeita. Ali, naquele instante, ficou a impressão de que a Copa iria ganhar um novo impulso, pelo entusiasmo que a vitória certamente iria transmitir à torcida anfitriã. Acontece que o México não se dava por vencido e continuou a insistir, principalmente através do bom Geovani dos Santos, filho de brasileiro e dono de um drible curto infernal. Diante de suas arrancadas, a defesa sul-africana ficava desarvorada, sem saber como marcar. Quando o veterano Blanco entrou e liberou ainda mais Geovani para jogar no ataque, o México adquiriu maior consistência e voltou a sufocar. O cruzamento perfeito que resultou no gol de Rafa Marquez já havia sido tentado pelo menos três vezes antes.
Desta última vez a diferença estava na ausência de cobertura na zaga bafana. Um lance de pura ingenuidade, que não é exclusividade das seleções mais modestas – em 2006, um lance parecido com esse tirou o Brasil da Copa. Para que a partida inaugural não terminasse sob o signo da modorra, ainda houve o lance sensacional de Mphela, que se livrou dos zagueiros e tocou na saída do goleiro Perez, mas a bola bateu na trave. Por segundos, a África inteira prendeu a respiração. O gol não veio, mas o time mostrou força e disposição, além de alguma organização de jogo. Vai dar muito trabalho a franceses e uruguaios, mas tenho a sensação de que a classificação ficou muito difícil.

O antídoto da vuvuzela

Os tampões de ouvido, idealizados para neutralizar a infernal vuvuzela, deve ter enriquecido muita gente em torno do estádio Soccer City. Ao preço de 15 rands (R$ 4,00), vendeu aos milhares e era disputado pelos torcedores de ouvidos mais sensíveis, geralmente estrangeiros. E promete fazer mais sucesso ainda nas próximas partidas. Não duvido que o artefato seja produzido nas mesmas fábricas da vuvuzela. Causa e efeito de mãos dadas. Mas, enquanto a corneta faz dos jogos um espetáculo sonoro, o tampão funciona como desmancha-prazeres.

Torcidas visitantes em pequenos grupos

Não se confirmou na prática a estimativa da embaixada do México em Johanesburgo, que dava como certa a presença de 25 mil torcedores no estádio Soccer City para aplaudir sua seleção. Dentro do suntuoso estádio, a olho nu, prevaleceram mesmo os torcedores sul-africanos dominando mais de 80% das arquibancadas. Na verdade, a presença de turistas na terra da Copa ainda é bem reduzida. As torcidas mais fortes por aqui vêm de Portugal e Espanha. Ingleses e italianos, tradicionalmente assíduos em Copas, estão em pequenos grupos pelas ruas de Johanesburgo. A não ser que haja uma grande mudança nas próximas horas, esta será a Copa com menor número de torcedores visitantes das últimas décadas. Preços salgados, medo da violência e serviços precários desestimularam muita gente.

(Coluna publicada no Bola/DIÁRIO deste sábado, 12)

Enfim, a Copa começou…

A Copa acaba de começar. O jogo Argentina x Nigéria, disputado aqui mesmo em Johanesburgo, mostrou um pouco da técnica e da alegria que se espera ver num mundial de futebol. Com craques em campo, a bola rolou macia, sem grandes atropelos. Messi, Verón e Tevez, principalmente, fizeram dos primeiros 45 minutos um bom espetáculo, arrancando aplausos em vários instantes e obrigando o goleiro Enyeama – que acabou eleito pela Fifa como o melhor em campo. Apesar do evidente poderio ofensivo argentino, no segundo tempo a equipe de Maradona cansou (principalmente Verón) cedeu espaços e quase foi surpreendida pela apenas esforçada Nigéria. Por três ocasiões, o placar esteve a pique de ser empatado. O jogo, equilibrado nos minutos finais, funcionou como um alívio para olhos mais exigentes diante das três partidas anteriores, todas de fraco nível técnico.

Bafanas dominam as manchetes

Como em algumas cidades inglesas, aqui em Johanesburgo as manchetes dos jornais ficam nos postes, para atrair o leitor. Obviamente, os Bafanas-Bafanas de Carlos Alberto Parreira dominam as primeiras paginas. Neste poste, bem ao lado do nosso hotel, a manchete em destaque pertence ao The Star.