Só um absoluto bloqueio criativo justifica a destrambelhada idéia de negociar o mais valioso patrimônio físico do Remo, propósito manifestado na quinta-feira (17) pelo presidente do clube com a sem-cerimônia de quem avisa que vai até a esquina vender camisas e quinquilharias.
Para quem até então só havia se aventurado a operar mudanças no formato do escudo e no desenho do mascote, a pretensão de vender o estádio Evandro Almeida representa plano dos mais ambiciosos – e controvertidos. Nem a firme reação popular à tentativa do ex-presidente Raimundo Ribeiro de se desfazer, a preço de banana, de um pedaço da sede social em Nazaré, esmoreceu Amaro Klautau de empreender essa campanha justamente num dos piores momentos da história da agremiação.
Mais ou menos como na canção do recém-resgatado Belchior, o Remo vive sem dinheiro no banco, não tem parentes/padrinhos importantes e passa mais tempo perambulando pelo interior. Ausente de certames nacionais, sem divisão, o time sofre com o endividamento geral do clube.
Privatista até a medula, como todo bom tucano, Amaro Klautau só enxerga alternativa para levantar recursos vendendo o Baenão. Há, no próprio Leão, quem conteste os argumentos técnicos do mandatário. Encravado em área nobre da cidade e alvo de antiga cobiça de incorporadoras e cadeias de shoppings, o velho estádio inspira números contraditórios. Segundo Klautau, o clube deve aproximadamente R$ 15 milhões.
Conselheiros respeitáveis apresentam valores mais modestos – o débito seria de, no máximo, R$ 8 milhões. A parte mais delicada do anúncio feito pelo presidente diz respeito, porém, à avaliação do estádio: R$ 40 milhões. Cálculos de construtoras e imobiliárias indicam que a área vale, no mínimo, R$ 70 milhões.
Apesar de apregoar um começo de negociação com “duas empresas interessadas”, a diretoria só poderá levar a cabo qualquer transação se convencer os 138 conselheiros. Terá o venerando Conselho o desprendimento de passar à história como responsável pela venda do Baenão?
Não acredito em soluções fáceis. Um exemplo dos descaminhos desse tipo de iniciativa foi o leilão da sede campestre, ainda na administração de Raimundo Ribeiro. O valor arrecadado serviu para abater parcialmente os débitos trabalhistas do clube. Eleito na esteira da desastrosa gestão de RR, Klautau ameaça repetir um dos maiores equívocos do ex-presidente. Com um dado grave a considerar: não expressou a intenção de vender o estádio durante a campanha eleitoral.
Vender o Baenão é, grosso modo, algo assim como se a Igreja Católica decidisse negociar a basílica de Nazaré, sob a justificativa de sanar dívidas. Certamente existem outros meios, menos drásticos, de solucionar as pendências remistas sem golpear seu patrimônio, construído ao longo de um século de existência pelo esforço de inúmeros baluartes.
Passar em frente um bem tão valioso – e afetivamente importante para milhares de torcedores – é aderir à lei do menor esforço e fechar as portas para qualquer outra opção criativa.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO deste domingo, 20)