
Por Mino Carta
Sou amigo velho de Ciro Gomes e do irmão, o ex-governador Cid. Estiveram ambos à mesa do lançamento do meu penúltimo livro, O Brasil, em 2013. Ciro cuidou de me apresentar ao público de Fortaleza, de forma afetuosa, ao se superar em generosidade. Considero sua candidatura à Presidência da República além de legítima, baseada em uma atuação política coerente na ideologia e irrepreensível moralmente.
Inúmeras vezes CartaCapital apoiou-o em s eus lances políticos e o teve por longo tempo entre seus mais preciosos colunistas. Não posso aprovar, entretanto, seu comportamento em relação ao ex-presidente Lula. Meu excelente companheiro André Barroca!, ao analisar a pré-candidatura de Ciro Gomes, observa que a inspiração em boa parte vem do desempenho de Leonel Brizola, candidato em 1989. O líder do PDT, de quem a reforma partidária do general Golbery surrupiara a sigla que por direito lhe pertencia, PTB, criticava o adversário Lula e seu PT, ao acusá-los de não representarem a autêntica esquerda. Foi Brizola quem apelidou Lula de “Sapo Barbudo”. Outros eram os tempos, contudo. Começava a chamada redemocratização.
À época, a despeito das acusações, a plataforma do PT era bem mais avermelhada do que se deu em seguida com o crescimento do partido. Brizola, no entanto, enxergava em Lula um quadro em formação, ainda atado às lições de negociação apreendidas na qualidade de presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, e partia à conquista de um território que entendia exclusivamente seu. Mesmo assim, Lula foi para o segundo turno, derrotado ao cabo por uma história hedionda, destas que só no Brasil podem prosperar, a da filha Lurian, nascida de uma relação mantida quando viúvo. Inestimável a contribuição da Globo. O próprio Roberto Marinho manipulou o debate final entre o líder petista e o “Caçador de Marajás”, para alegria de Veja e dos editoriais dos jornalões. O Sapo Barbudo punha medo.
Hoje vivemos o estado de exceção precipitado por um golpe de Estado perpetrado, antes de mais nada, para alijar de vez Lula da disputa eleitoral, condenado a 12 anos e um mês de prisão sem a mais pálida sombra de provas. Se o ex-presidente cometeu erros políticos depois da reeleição de Dilma Rousseff, se demorou demais para reagir, nada disso cancela a sacrossanta verdade factual: o único líder brasileiro de dimensão nacional é a grande vítima de uma manobra tipicamente verde-amarela, impensável em um país civilizado e democrático. Resultado: sem Lula, a eleição, se houver, é fraude. E o próprio Brasil está enjaulado, embora, aparentemente, não se dê conta de sua deplorável situação.
Ciro Gomes sabe perfeitamente disso tudo, daí a minha certeza de que não é hora de bater no ex-presidente, o qual, aliás, sempre teve pelo seu ex-ministro notável apreço. Daí a mágoa funda que colhe Lula neste exato instante em relação a quem prezava. A recusa de Gleisi Hoffmann a qualquer conversa com o presidenciável do PDT nasce de um desabafo do líder aprisionado. Dirá Ciro que pretendeu ser sincero, ao se referir à inconveniência da candidatura de Lula, declarada há tempo, antes da condenação. Hoje soa, porém, como se um pedido de graça tivesse sido atendido pelos inquisidores de Curitiba e Porto Alegre com a bênção de uma corte que se diz alta, enquanto fica abaixo do nível do mar.
Nesta moldura cabem certas andanças do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, disposto a se reunir com Ciro e Bresser-Pereira no escritório do professor Delfim Netto, para definir “um programa de centro-esquerda”. Trata-se de um interessante desafio à minha manquitolante imaginação. Mas, confesso, gostaria muito de saber o que o preso de Curitiba pensa disso tudo. Quanto ao amigo Ciro, em nada diminuiria sua candidatura denunciar o assassínio político de Lula, imolado no altar da casa-grande. Pelo contrário, a reforçaria na defesa do Estado Democrático de Direito, demolido pelo golpe de 2016.
Editorial da CartaCapital desta semana.
Mestre Mino perfeito como sempre. Diria apenas que a candidatura do Ciro padece de um atraso que deixa no ar uma sensação de oportunism0. Ciro tinha tudo pra ser candidato em 2014 e, com seu preparo intelectual, contribuir com a consolidação de um discurso de esquerda.
Omitiu-se. Como Marina foi um fiasco e terminou melancolicamente sua participação como mucama dos interesses da privataria; como Luciana Genro desfiou um bizarro udenismo metido a esquerda, restou Dilma, mas essa, na defensiva, fez mais um discurso governista. Sem debate a respeito de aspectos da política que serviriam para desmascarar a farsa viralata, restou o triunfalismo gangsterizado de Aécio e seus miquinhos amestrados, que botaram pra quebrar através de seus respectivos aparelhos excretores, com direito até a flato ao vivo e a cores na cara do janota e faccioso William Bonner.
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Com todo respeito a Mino Carta, mas ele está malhando em ferro frio, como diziam os antigos. Ciro é um errático e oportunista. Nunca foi de esquerda e tem DNA coronelístico.
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