POR GERSON NOGUEIRA
O torcedor é antes de tudo um ser atormentado, movido pela febre da paixão e impelido pelos ventos do exagero. Não há meio-termo, é oito ou 80, sempre. Quando ganha, arma festança digna de Champions League. Se o seu time perde, jorra um toró de lágrimas e juras de ódio ao técnico, aos jogadores, ao árbitro e seus cúmplices, cartolas, imprensa etc.
O dia seguinte ao Re-Pa, disputado em clima de fortes emoções, foi marcado pelas zoações de praxe, com aplausos e elogios entusiasmados entre os vencedores e lamúrias intermináveis do lado dos derrotados.
Para um campeonato que mal começou, o jogo foi até acima da média. Contra um Papão que parecia confiar na maior qualidade individual de seus jogadores, o Remo optou por um jogo de espera, matreiro e pragmático.
Levou a melhor quem soube executar melhor a estratégia escolhida. Como precisava sufocar o adversário, o Papão necessitava ter laterais velozes e armadores participativos. Não teve nem uma coisa, nem outra.
Para piorar, seu ataque foi quase sempre capenga. Bergson corria muito, procurava alternativas e precipitava chutes de fora da área, acusando a ausência de jogadas. Leandro Cearense limitava-se a ficar entre os zagueiros, com pouca movimentação e erros de domínio de bola.
Já o Remo foi mais atento aos seus próprios limites. Léo Rosa avançado pelo lado direito, mas Jaquinha e Tsunami ficavam atentos a Sobralense e Jonathan. Parte desse esforço tático ajuda a explicar a melhor atuação remista e a própria vitória.
O ataque fez toda a diferença no fim das contas. Edgar, além de marcar duas vezes, manteve-se sempre junto à área inimiga e levou vantagem em todos os lances contra marcadores bicolores. Por isso, terminou como grande destaque do clássico. O Remo contou com a força de Val Barreto entre os zagueiros Pablo e Gilvan. Não teve nenhuma oportunidade clara de gol, mas prendeu a atenção da dupla o tempo todo.
Josué Teixeira armou seu time para ganhar o jogo no contra-ataque e permaneceu com esse plano até o final, não abrindo mão da presença permanente de cinco defensores junto à sua área.
Chamusca quis vencer envolvendo o adversário. Errou ao não conseguir que suas peças correspondessem. Por desentrosamento ou má condição física, o Papão não jogou tudo o que poderia jogar. Talvez seja um problema exclusivo dos jogadores, mas logo alguém vai lembrar de cobrar responsabilidades do técnico.
Amanhã, contra o São Francisco, o Papão tem a chance de reabilitação junto ao torcedor e na tabela do campeonato. Chamusca não está ameaçado, mas os próximos compromissos podem mudar a situação.
Josué saiu vencedor, mas teve pecados também. A escalação de Caio se mostrou um equívoco. Foi envolvido por Leandro Carvalho e esteve a pique de ser expulso. O próprio técnico acabaria excluído por reclamações ostensivas. Falhou ao mostrar desequilíbrio e destempero.
O Re-Pa, como se vê, não termina nos 90 minutos. Segue indefinidamente na memória de todos.
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Uma capa para ficar na memória
A belíssima capa do Bola, edição de ontem, virou tema de debates nas redes sociais e repercutiu em rede nacional. Sportv e ESPN elogiaram a sacada de descrever Edgar como “craque raiz” e Leandro Cearense como “craque nutella”. Em suma, cumpriu seu papel de botar o dedo no suspiro.
Exceto pela perdoável liberdade poética no uso da expressão “craque”, a composição foi perfeita, combinando imagem e título de maneira muito feliz. Um sopro de bom gosto e arejamento de ideias num jornalismo que às vezes esquece o próprio passado glorioso.
O clássico foi intenso, como todo bom Re-Pa, e o Bola lhe fez justiça através do talento do editor Carlos Eduardo Vilaça, supervisionado pelo editor executivo Clayton Matos. Mauro Cezar Pereira, da ESPN, disse no Twitter que foi “uma capa épica”. Concordo com ele.
(Coluna publicada no Bola desta terça-feira)