POR GERSON NOGUEIRA
Na base do decreto, seguindo à risca o modelo autoritário que sempre pautou seus atos, a CBF baixou ontem o seu regulamento de licenciamento, contendo as regras mínimas a serem cumpridas pelos clubes nacionais (das quatro divisões), de forma escalonada, até 2021. Há quem possa argumentar que o futebol moderno exige mudanças e sacrifícios, mas no Brasil os clubes são tradicionalmente os primos pobres da festa. Antes de baixar regras draconianas, a própria CBF deveria passar por uma depuração mínima quanto a intenções e práticas.
Os clubes da Primeira Divisão terão até o próximo ano para se enquadrar. Já os da Segunda Divisão têm prazo até 2019. Para a Série C, o limite será 2020, enquanto para os clubes da Série D as exigências irão valer a partir de 2021. Para torneios internacionais, as normas já integram o regulamento da Conmebol para o ano que vem.
Tudo seria aceitável se o país do futebol tivesse uma estrutura mais igualitária, em termos de vantagens e patrocínios, para todos os clubes. Isso ocorre nas principais ligas europeias, cujas divisões – mesmo as mais modestas – são aquinhoadas com suporte financeiro que permite uma sobrevivência digna dos filiados.
A CBF usa como discurso a necessidade de estabelecer o desenvolvimento dos clubes através de boas práticas de gestão, transparência e equilíbrio financeiro. Como teoria, a formulação é perfeita. Na prática, porém, é preciso observar que décadas e décadas de atrelamento à entidade tornou os clubes potencialmente pobres e pouco afeitos a comandarem seus próprios destinos.
Não se muda esse panorama de um ano para outro, nem por força de decreto. Os prazos ofertados são razoáveis, mas ainda assim a maioria das agremiações terá imensas dificuldades para se adequar. O regulamento define um conjunto de regras obrigatórias. Os clubes terão, por exemplo, que provar a existência de programas para as divisões de base e para o futebol feminino – obsessão da Fifa, que a CBF está levando a ferro e fogo.
Os clubes terão que possuir também centros de treinamento, estádios ajustados às normais e gestão profissional (com diretorias remuneradas de futebol, comunicação e marketing). Dá até para imaginar o grau de desespero dos clubes mais modestos do país, alguns desprovidos até de campo para treinar e sem nada que possa lembrar uma diretoria profissionalizada.
Anualmente, a CBF promete informar os critérios (metas) que devem ser atingidos para acesso às competições. As punições previstas para os clubes que descumprirem o licenciamento incluem multas e até a proibição de participar de torneios oficiais.
O que se conclui dessas providências oficializadas pela CBF é que, no prazo máximo de quatro anos, as divisões nacionais estarão reduzidas a três, pois a quarta divisão acabará extinta por inanição. Sendo que as séries B e C passarão por ampla reformulação, visto que muitos clubes dessas divisões não conseguiriam hoje cumprir as exigências mínimas.
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Waltinho e a ressurreição do São Francisco
Não foi um jogo qualquer, representou uma façanha. O São Francisco marcou 3 a 0 sobre o Botafogo paraibano, que era apontado como favorito para seguir adiante na Copa do Brasil. É um clube mais estruturado e teve um bom começo de temporada, tendo goleado o Vitória-BA, na Copa do Nordeste.
O mais impressionante é que, até então, o São Francisco só havia decepcionado sua torcida, com tropeços seguidos no Parazão. O responsável pela mudança atende pelo nome de Walter Lima, técnico habituado a montar bons times e que foi chamado para substituir Victor Hugo.
Bastaram alguns treinos sob seu comando para que o time mudasse de corpo e alma. O grupo desanimado de antes passou a confiar nas próprias forças e a desarticulação em campo cedeu lugar a uma postura organizada e taticamente disciplinada. O triunfo salvou o ano financeiro do São Francisco e fez justiça à competência profissional de Waltinho.
(Coluna publicada no Bola desta sexta-feira, 10)