Entre a F1 e a carroça

POR GERSON NOGUEIRA

A Eurocopa entra em sua fase decisiva, com quatro semifinalistas já definidos (Alemanha, Portugal, País de Gales e França) e algumas evidências que o futebol brasileiro – para o seu próprio bem – não pode fingir não ver. A mais importante diz respeito à maneira de praticar o jogo. Rapidez, aproximação e intensidade são as palavras de ordem. Acabou o tempo do futebol acomodado, dos passes laterais e das jogadinhas inúteis nas zonas mortas do campo.

0442be9c-c0ff-41cd-b023-3b786ecd2b98Há um choque quando o cidadão termina de assistir um jogo da Eurocopa e troca de canal para ver qualquer confronto da Série A brasileira. É como se os europeus estivessem andando de F1 e o futebol brazuca indo de carroça. A diferença é tão acentuada que por vezes chega a parecer que são esportes diferentes.

Por aqui prevalece a máxima do devagar-quase-parando. A única jogada que os técnicos apreciam é o famigerado chuveirinho, que Oto Glória, Vicente Feola e Gentil Cardoso já usavam lá pelos idos de 1950, 1960.

As datas retratam o marasmo tático que se apoderou do Brasil ao longo das últimas décadas. Enquanto os demais centros se esmeram em evoluir e descobrir saídas para um esporte que parecia estagnado, os treinadores nacionais se fecham nas velhas práticas, agarrados ao defensivismo que em nada combina com a essência boleira do país pentacampeão do mundo.

Há mais de 10 anos os europeus têm adotado inovações simples como a utilização de homens originalmente de meio para jogar na última linha de defesa, para distribuir os passes corretamente desde o começo das jogadas.

Aprenderam também que os bons volantes devem ser tão hábeis e inteligentes quanto os armadores do passado. A rigor, não existem mais volantes exclusivamente marcadores. Times como o da Alemanha jogam com dois meias avançados e um mais recuado, quase como um líbero (também invenção deles) de antigamente. Marcam, mas sabem passar e criar jogadas.

O ataque não tem homens fixos, mas é povoado a todo instante. Os dianteiros podem irromper pelo meio ou reencarnar os pontas que o Brasil aposentou. Todas as seleções, até as mais modestas, atuam assim, mas o fenômeno é particularmente visível na nova Itália de brasileiros como Éder e Pellé; na Bélgica de Hazard; na França de Pogba, Payet e Griezmann; na Alemanha de Müller, Özil e Draxler.

Cabe aqui acentuar que o nível desta Eurocopa não é particularmente brilhante, mas a inventividade merece aplausos. Há um claro período de entressafra num futebol que abraça o novo, fazendo até com que os ainda jovens alemães campeões do mundo já pareçam veteranos.

Outro aspecto que merece reflexão é a inexistência de um fosso técnico entre nós e eles. Essa foi a razão da hegemonia brasileira nas Copas. Os grandes bambas nasciam daqui e eles tinham que se contentar com esquemas fechados para deter os bailarinos da época de ouro do futebol brasileiro. Isso, definitivamente, é passado.

Vi País de Gales e Rússia na fase de classificação da Eurocopa e fiquei bestificado com a extrema habilidade e facilidade para dribles dos jogadores britânicos, algo impensável até o começo dos anos 90.

Isto significa apenas que os europeus se credenciam a dominar o futebol, não só na parte gerencial e administrativa. Para tornar tudo mais difícil, eles também aprenderam as manhas do futebol moleque, a ponto de o antes desengonçado Mario Gomez tentar (e quase acertar) um toque de letra diante do veterano Buffon no clássico do último sábado.

Nenhum atacante brasileiro se arriscou a fazer esse tipo de saudável molecagem nas últimas três Copas.

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Remo estreia técnico no sertão pernambucano

Waldemar Lemos chegou na quarta-feira e estreia hoje no comando do Remo. O jogo é contra um adversário direto na disputa pela classificação. Com 9 pontos, o time paraense precisa derrotar o Salgueiro para chegar ao segundo lugar na tabela. O histórico da equipe na competição é positivo como visitante. Foram sete pontos ganhos nas partidas contra Cuiabá, River e Confiança.

A dúvida é quanto à postura do time, que terá mudanças pontuais, embora sem mexer no sistema. Henrique entra na defesa, Chicão na marcação e Wellington Saci no meio. Marcelo Veiga havia tentado utilizar Saci como meia-atacante contra o Botafogo-PB, mas acabou mudando de ideia ainda no primeiro tempo.

Lemos decidiu levar a cabo a experiência, aproveitando que o antigo titular Allan Dias está lesionado. O ataque tem Patrick e Edno.

Pelo pouquíssimo tempo para treinos, é pouco provável que o time já tenha assimilado plenamente as orientações do novo técnico, mas é de esperar que providências urgentes – como a segurança defensiva – tenham sido tomadas para evitar os costumeiros apagões em bolas aéreas.

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Direto do blog

“Penso que a falta de tempo inviabiliza qualquer planejamento para mudanças no setor ofensivo, hoje principal problema do PSC. É bom dizer que Dal Pozzo já fez o primeiro teste no jogo contra o Sampaio, quando lançou três atacantes (dois abertos e um mais centralizado).

Ainda sobre o setor ofensivo bicolor, penso que o caminho são os três atacantes utilizados contra o Sampaio. Sendo que dois deles (os abertos) devem acompanhar os avanços dos laterais. Tal estratégia (4 – 2 – 3- 1) é muito utilizada em times que não tem laterais com força ofensiva. Penso ser este o caso do PSC.”

Carlos Lira, apesar dos pesares, confiante em boa campanha bicolor na Série B.

(Coluna publicada no Bola desta segunda-feira, 04) 

15 comentários em “Entre a F1 e a carroça

  1. Em 1958, o Brasil legou ao mundo gênios como Pelé, Garrincha, Nilton Santos, Djalma Santos, Didi e tantos outros. Mas, inventou também o 4-3-3, quando prevalecia ainda o 2-3-5. Com Zagalo recuando pra ajudar Zito e Didi na marcação e saída pro ataque, o Brasil passeou pela Suécia sendo a primeira seleção a ganhar uma copa fora de seu continente.
    Em 1962, apenas tivemos essa orquestra despedindo-se da cena em grande estilo e o bi-campeonato foi quase uma barbada, apesar da contusão de Pelé.
    Mas, em 1966, com o futebol total criado pelos europeus pra neutralizar os grandes solistas, o Brasil descobriu-se superado técnica e taticamente, parecendo superar esse trauma, em 1970, quando Saldanha colocou o volante Piazza de quarto zagueiro e recuou o meia Gerson para fazer uma espécie de segundo volante, fazendo girar Pelé, Tostão, Rivelino com Jairzinho mais avançado. O grande mérito de Zagalo foi não mexer no que estava dando certo.
    Veio 1974, com ele, mais perplexidade com o ‘Carrossel Holandês’. Pena que esse espanto não tivesse sido acompanhado por evolução da nossa seleção no que toca o jogo coletivo. E isso durou 20 anos, apesar de experiências vitoriosas como as de Rubens Minelli no Inter.
    Pode-se afirmar que 1982, 1994 e 2002 foram dois pontos fora da curva descendente que faz hoje do nosso futebol um qualquer nesse universo, despido da magia de outrora. Ontem, por exemplo, a partida entre Figueirense x Atlético(MG) teve apenas 46 de bola correndo.
    Simples: enquanto os europeus continuam disputando o jogo nos quatro cantos do gramado,nós desenvolvemos o anti jogo com excessivo número de faltas, obstrução da jogada na hora da cobrança de faltas para retardar o jogo, excessivo cai cai, entre tantos outros expedientes escusos para retardar o andamento da partida, parecendo que isso preenche a lacuna que o atraso tático atualmente nos impõe. Por isso nossa seleção é atualmente tão desimportante.

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  2. Gerson,é exatamente essa a impressão que tenho quando assisto o campeonato inglês que sou fanzaço e mudo para o braseiro que tenho pouco apreço…partida sem brilho e valendo míseros 3 pontos…Não perco meu tempo e nem meu sono tentando assistir…E quando vemos um lescester ,time pequeno inglês sendo campeão e jogando um futebol vistoso,rápido e bonito…Temos a real dimensão do fosso entre o Brasil e o resto do mundo em especial a Europa.

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  3. Assisto a Premier League e a Champions League com frequência, assim como venho fazendo com a Euro. Já o Brasileirão, séries A, B e C (ai Leão), só a base de muita paciência. A discrepância é grande, sem comparação. Não à toa, creio ser muito difícil um time brazuca campeão do tal mundial. Quando ganham a Libertadores (quando ganham!), tem enorme dificuldade diante dos times asiáticos e africanos, vide o Inter e o Galo.

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  4. Tanto é verdade que o futebol brasileiro parou no tempo, com raríssimas exceções, exemplifica-se abaixo de nossos “narizes”, no próprio estilo de jogo utilizado hoje, no Paysandu: volantes brucutus, que não acertam passes de meio metro, zagueiros cintura dura, que só sabem dar chutões, laterais obsoletos ofensivamente e meias que não criam nada, puramente por deficiência técnica. Isso verifica-se, não só no Paysandu, mas em 99,99% dos times.

    O cenário futebolístico brasileiro é assustador. Estamos na contramão tática e técnica do que se pratica no futebol mundial atualmente.

    Acredito que muitos técnicos estejam bem atualizados, porém a pressão por resultados, instabilidade no cargo e alguns outros problemas influenciem negativamente para uma mudança conceitual, que sabidamente se faz necessária.

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  5. O problema dessa discrepância é da ordem tática e técnica. Não adianta bradarmos que temos que mudar rapidamente o futebol, se a formação de técnico e jogador ainda é retrógrada e sem caráter educativo.

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  6. Pegando o PSC como exemplo, sob o ponto de vista do futebol de hoje, é inadmissível termos volantes que cumprem basicamente a função de marcação (Recife e Capanema). De modo Geral, o que teríamos que ter era vários jogadores com a capacidade de Jonhatan e Rodrigo Andrade que, analisando friamente, ainda estão em formação.

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  7. Outra, a categoria de base seria o local adequado pra aperfeiçoar os fundamentos e questões táticas. Seria, porque aqui no estado (focando o Remo e o Papão) nossas bases são inexpressivas, praticamente não gerando nenhum fruto.
    Lembrei do Audax-SP do Fernando Diniz quando começou a fazer algo diferente e interessante. anos atrás. A imprensa paulista desceu o malho no cara devido, entre outras coisas, exigir que o chutão fosse abolido, prevalecendo o toque de bola. Ele até lembrou disso, quando da final de 2016. Importante também que ele teve apoio da diretoria. Exceção pura. Ademais, o futebol brasuca e papa-chibé tende a piorar. Será que uma não classificação à copa de 2018, não poderia dar uma forcinha pra mudança? O 7X1 não deu…!!!

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  8. Eu acho que ainda estamos descobrindo a roda. O futebol brasileiro foi mestre quando o esporte lá fora não tinha tanto apelo popular. Depois que virou negócio, os grandes abriram os cofres visando aperfeiçoar e atualizar o esporte bretão.
    Só o Brasil se fechou nesta ilha encantada achando que as cinco estrelas dos mundiais conquistados imporiam respeito aos seus adversários.
    Atualmente nem mesmo a antes frágil Venezuela teme o escrete canarinho.

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  9. Bela coluna, mais uma vez, amigo Gerson…

    Penso que essa distância entre o Futebol Europeu e o brasileiro, já vinha se desenhando, havia anos… Os estudos dos esquemas táticos, são criados por lá… Aqui, só copiamos, e as vezes, muito mal… Vamos aguardar mais alguns anos, ou quem sabe outra Copa do mundo, aqui no Brasil, para que tenhamos mais arenas, nos padrões FIFA, como os estádios europeus… Aqui, sempre esperamos por eles… Nada se cria, tudo se copia

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  10. Impressionou-me muito ter visto a última linha defensiva alemã jogando praticamente além do círculo central, praticamente na intermediária italiana. Para tanto, é preciso ter zagueiros que passem muito bem, sejam rápidos e que possam até armar eventualmente o jogo com viradas de bola ou lançamentos longos. O time alemão, de Müller a Neüer sabe passar bem. Uns muito bem e outros com maestria, como Özil e Kroos. Como fazer isto num futebol onde 1 a 0 é goleada e ainda se joga em 70 metros e com uma visão compartimentalizada de futebol onde zaga é zaga, meio é meio e ataque é ataque? Onde zagueiro deve zagueirar e volante deve baixar o cacete e no mínimo tocar de lado para os meias?

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  11. Impressionou-me muito ter visto a última linha defensiva alemã jogando praticamente além do círculo central, ocupando a faixa inicial da intermediária italiana. Para tanto, é preciso ter zagueiros que passem muito bem, que sejam rápidos e que possam até armar eventualmente o jogo com viradas de bola ou lançamentos longos. O time alemão, de Müller a Neüer, sabe passar bem. Uns passam muito bem, como Draxler, e outros passam com maestria, como Özil e Kroos. Como fazer isto em um futebol onde 1 a 0 é goleada e que é jogado ocupando 70 metros do campo? Em um futebol onde ainda prevalece a visão compartimentalizada dos setores das equipes, onde zaga é zaga, meio é meio e ataque é ataque? Onde zagueiro deve “zagueirar” e volante deve baixar o cacete e no mínimo tocar de lado para os meias? Os gramados brasileiros parecem latifúndios improdutivos se comparados aos europeus, mas há que se constatar que quase todos os gramados nacionais tem as mesmas medidas dos campos do velho mundo (padrão prescrito pela FIFA), sobretudo após o Mundial 2014. Por que será?

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