
POR ANDRÉ FORASTIERI
Manchete de hoje incendeia a internet brasuca: o Washington Post prevê que os próximos bilionários da internet virão do Brasil!
Está lá, no jornal oficial da capital do império: empresas do porte do Facebook em breve nascerão no nosso País, capitaneadas por jovens inovadores e geniais, os Marks Zuckerberg brasileiros.
Aí você faz diferente da maioria das pessoas que fica repercutindo manchetes no Twitter como zumbis, e tira cinco minutos para efetivamente ler o texto. Aqui.
A foto que ilustra a matéria é de dois caras na praia, seminus, na contraluz de um sol dourado, ao longe uma canoa. Começou mal, mas pelo menos não é mulata requebrando no Carnaval. O autor é o colunista Vivek Wadhwa, ou seja, não é reportagem, é opinião.
Dr. Wadhwa é acadêmico respeitado. No primeiro parágrafo, ele descreve Campinas como uma pequena cidade universitária na periferia de São Paulo. Piorou. E depois piora.
Ele conta algumas anedotas sobre experiências de empreendedores em Campinas, como eles se ajudam e como adotaram alguns princípios das start-ups americanas (lean start-up, uma maneira chique de dizer gaste pouco, bote logo seu produto no mercado e aprenda com seus erros).
Aí Mr. Wadhwa declara que as empresas que viu em Campinas são de qualidade melhor das que tem visto no Silicon Valley, e que por isso ele prevê que elas têm mais chance de sobreviver que as americanas.
Devo ter ouvido besteira maior na vida, mas não me lembro. A qualidade da inovação das novas empresas brasileiras é o de menos. Nosso colunista pode entender tudo de start-up na Califórnia, mas não sabe o be-a-bá da economia tupi.
O investimento mais conservador que se pode fazer no nosso País, que é botar dinheiro em uma aplicação careta no banco da esquina, rende dez por cento ao ano. Com um pouquinho mais de recursos e ousadia, dá pra chegar a quinze ou vinte. Sempre que conto isso pra gringo, eles caem para trás.
Neste ambiente, não há nenhuma boa razão para termos um ambiente propício a investimentos produtivos, muito menos no nascedouro. Novos empreendimentos automaticamente são mais arriscados, e quanto mais nova a ideia, mais novos os problemas que ela vai ter que enfrentar.
Não vou nem começar a detalhar a indigesta salada de pepinos que um empresário iniciante tem que engolir no Brasil, impostos, cartelização, legislação, corrupção… Por isso tudo é que o cenário de start-ups no Brasil é tão frágil, comparado ao tamanho e ao crescimento do País.
Mark não ia dar em nada no Brasil; o Facebook jamais teria recebido investimentos; o jogo aqui é outro. Os maiores crânios do Brasil, diferente da Califórnia, não vão trabalhar em start-ups. Vão trabalhar em bancos. E pela mesma razão: é onde está o dinheiro.
No final, o colunista diz que os próximos Marks Zuckerberg virão das favelas de Nova Déli, na Índia, de Valparaíso, no Chile, e de Sao Paulo (assim mesmo, sem acento)… Ora faça-me o favor.
Quando os gringos começarem a botar o til em São Paulo, começo a levar a sério suas profecias.
(Escrevi esse texto em 21 de março de 2012, quatro anos atrás, quando a economia brasileira estava bombando. Se era verdade naquela época, é mais verdade ainda agora, com juros ainda mais altos e recessão brava. É por isso que países minúsculos têm cenas vibrantes de start-ups, e aqui não temos. Isso não quer dizer que você não possa ou não deva empreender no Brasil, mesmo no meio da crise. Tenho 22 anos de empresa aberta nas costas e não me arrependo não. Só que, da mesma maneira que no Silicon Valley as cartas estão a favor de quem se arrisca, aqui estão sempre contra – e agora mais ainda. Mudar esse cenário é chave para a recuperação do país, para o Brasil virar o país moderno que todos queremos. O Estado tem que cumprir seu papel de estimular a inovação, como faz nos EUA e nos principais países; mas precisa também, principalmente, fundamentalmente, parar de atrapalhar quem quer criar, arriscar, produzir).
Convido você a me acompanhar no Twitter: @forastieri.
O André tem razão. Brasileiro é empreendedor, mas o governo e a legislação não ajudam. Por isso, que o sonho de 10 entre 10 jovens é se tornar funcionário público, ou seja ter estabilidade no emprego e ganhar em média mais do que o trabalhador da empresa privada. Em outros lugares, o padrão é o inverso, com o setor privado pagando mais do que o setor público.
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