Por Gerson Nogueira
O futebol, como tudo na vida, permite que se aprenda permanentemente. Sempre achei estranho que técnicos digam que não há tempo para exercitar fundamentos com seus atletas, buscando corrigir vícios de origem que muitas vezes se perpetuam ao longo da carreira. O mesmo vale para os próprios treinadores, que deveriam se atualizar no contato direto com outras escolas de futebol. Dos técnicos em atividade, somente Tite tem demonstrado essa preocupação. Os demais parecem convictos de que já sabem tudo.
Quanto aos jogadores, o raciocínio de que não há tempo para treinar fundamentos não encontra amparo na lógica. Por esse raciocínio, mestre Telê Santana não teria conseguido operar o milagre materializado na figura de Cafu. Daí a importância do anunciado projeto de Tite, que vai visitar e estagiar em clubes da Europa, a título de reciclagem.
O lateral-direito recordista de conquistas, campeão (e capitão) mundial em 2002, era um jogador medíocre, segundo suas próprias palavras. Não dominava fundamentos básicos, como o passe e o cruzamento. Aprendeu a passar e cruzar corretamente pelas mãos de Telê no São Paulo.
Já li relatos de companheiros de Cafu naquele time do Tricolor do Morumbi que atestam o empenho do treinador em ajudar um atleta de grande potencial físico e atlético, mas que tinha o rendimento prejudicado por falhas pontuais quanto a recursos técnicos.
Passar bem e rápido é uma qualidade fundamental para que qualquer atleta tenha êxito na carreira. Cruzar é o desdobramento desse fundamento, pois exige o domínio de força e precisão nos arremates. Cafu foi um aluno aplicado, basta observar o quanto evoluiu depois da passagem do velho mestre pelo São Paulo.
É claro que a insistência de Telê, notoriamente um técnico mal-humorado, não deve ter sido bem recebida pelo jovem lateral ali no começo da carreira. Boleiros costumam se achar meio artistas – e, às vezes, são –, circunstância que compromete a assimilação de ensinamentos, dependendo de quem repassa as lições.
Para sorte de Cafu e do futebol brasileiro, Telê já era um homem respeitado como conhecedor do ofício e cultor da boa técnica. Tivesse ele a mentalidade de alguns técnicos em atividade no Brasil hoje, Cafu certamente seguiria desfilando pelos campos os vícios não corrigidos.
Outro grande craque de sua geração, Ronaldo, sempre admitiu a dificuldade para o cabeceio. Por falta de orientação quando dava os primeiros passos no futebol, terminou prejudicado naquele que é um dos grandes fundamentos disponíveis para jogadores de área, ainda mais aqueles que têm a envergadura de Ronaldo. Com certeza, caso fosse bom cabeceador, teria marcado ainda mais gols em sua vitoriosa carreira.
Ao contrário do Fenômeno, o Rei Pelé sempre foi um exímio cabeceador, fazendo dezenas de gols graças à facilidade de impulsão e a precisão nas testadas. E é bom lembrar que Pelé se tornou futebolista quando as bolas tinham aquele bico por onde o ar era injetado no balão interno.
Em entrevista antiga, o Atleta do Século comentou que seu maior medo era justamente ferir a testa naquela saliência metálica. Por isso, desenvolveu a técnica de cabecear com os olhos bem abertos, o que lhe rendia uma vantagem extra na hora de deslocar a bola do alcance dos goleiros.
São essas lições, pequenas, mas de valor incalculável, que fazem a diferença entre os bons e os fora-de-série. Dentro e fora de campo. Técnicos, como jogadores, não nascem prontos. Precisam aprender mais e mais, até para que possam ensinar também.
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Aberta a temporada das especulações
Sem bola rolando, as torcidas de Leão e Papão se entregam ao exercício de projetar o time dos sonhos para 2015. Mas, apesar do prazer que os boatos despertam, alguns esbarrões na dura realidade se fazem necessários. Na Curuzu, onde a prioridade máxima é a disputa da Série B, o ano começou de verdade quando o técnico Mazola Junior não aceitou a proposta para continuar no clube.
A necessidade de contratar um novo técnico (Ricardinho? Flávio Araújo? Sidney Moraes?) mobiliza os esforços dos dirigentes, que não perdem de vista a busca de reforços para o elenco. Por enquanto, o clube contabiliza mais perdas do que ganhos. Charles, titular absoluto da defesa, optou pelo Ceará. Se o setor já era alvo de preocupações, a partir de agora é motivo de aflição.
Para o meio-de-campo, que perdeu Zé Antonio e Capanema, a diretoria se movimenta para ter Jonathan e Elanardo (ex-Icasa), jogadores que significariam até um incremento em qualidade. Jonathan estaria acertado, esperando apenas a hora do anúncio oficial.
No setor de criação, Rogerinho voltou a ser alvo de especulações e há negociação em andamento com outro meia. No ataque, João Carlos (Macaé) continua nos planos, mas ficou mais difícil. Ruan, que estava confirmado, pode sair.
Nada de tão anormal assim, apesar da pressão que o torcedor faz por novos nomes. A questão é que os dirigentes é que têm a exata medida do que podem ou não fazer, na medida em que o orçamento do clube para a próxima temporada não pode ser comprometido antes de o ano novo começar.
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À espera da decisão nas urnas
No Remo, cuja diretoria exerce mandato-tampão, os problemas são mais sérios. A começar pelo fato de que não é possível firmar contrato com ninguém antes da eleição do próximo dia 13. Sondagens são feitas junto a treinadores, mas tudo depende do resultado das urnas.
Por enquanto, há o confirmado interesse por PC Gusmão, técnico que tem se especializado em dirigir clubes do Nordeste. PC se localiza numa faixa salarial acima dos padrões regionais. Sua contratação significaria um projeto de maior envergadura do clube para a disputa do Parazão, Copa Verde e, possivelmente, Série D.
Quanto a elenco, o atual presidente, Zeca Pirão, acredita em contratações pontuais de impacto e a manutenção de muitos remanescentes da Série D 2014. Em resumo, nada muito diferente do que foi feito este ano, cujo saldo não foi dos mais satisfatórios.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 05)