Por Gerson Nogueira
Houve um tempo, mais ou menos até meados dos anos 80, em que a gente acreditava de verdade que o Brasil era o país do futebol. Nossas convicções seriam seriamente abaladas com a era Maradona e, posteriormente, com a evolução técnica dos europeus. O que o talento brasileiro produzia de façanhas em campo, justificando a fama de pátria da bola, os gringos passaram a fazer a partir de dedicação febril ao aprendizado dos macetes e do maciço intercâmbio com boleiros sul-americanos.
O tema é fascinante, pois foca em várias virtudes humanas a partir da prática do futebol. É admirável que um povo pouco dado a dribles e filigranas tenha conseguido, em pouco mais de duas décadas, assimilar os movimentos que sempre fizeram dos sul-americanos (brasileiros em especial) verdadeiros artistas do esporte.
Quem vê um confronto entre Bayern e Barcelona, como o de ontem, não distingue mais brasileiros de europeus quando a comparação é meramente técnica. Está tudo nivelado, com evidente vantagem para o lado deles, que aprenderam as manhas e não desprezaram a disciplina e o método.
Ao longo de 90 minutos o mundo teve a oportunidade de se deliciar com os passes e fintas de craques como Robben, Ribéry, Pedro, Iniesta, Xavi, Müller, Lahm. Dos latinos presentes, algum destaque para os talentosos Dante e Daniel Alves. Detalhe: ambos defensores.
O mais incensado dos astros em campo, porém, não tinha condições de desfilar nem um terço de todo o seu talento. Messi, visivelmente fora de jogo, pouco se movimentou e foi figura decorativa na partida vencida com sobras pelos alemães.
Mais do que ressaltar a espantosa disciplina tática do Bayern, cuja vigilância em tempo integral não permitiu ao Barcelona muitas chances de gol e nem a infernal troca de passes, o confronto reafirma a condição europeia de protagonismo no futebol. Espanhóis e alemães têm as melhores seleções do planeta e é natural que tenham também os clubes mais vitoriosos, condição espelhada nas semifinais da Liga dos Campeões.
É importante notar que os avanços que permitiram aos europeus igualarem e superarem a vocação natural dos sul-americanos para o esporte não nasceram do dia para a noite. A evolução foi conquistada aos poucos, dentro e – principalmente – fora de campo. É simbólico lembrar que quando os holandeses assombraram o mundo em 1974 havia técnico brasileiro desdenhando das inovações. A Alemanha se sagraria campeã naquela Copa e, mesmo sem a badalação dada à Laranja Mecânica, mostrando ao mundo um punhado de craques.
Hoje, a pouco mais de um ano da Copa do Mundo, muitíssimo bem representadas por clubes de primeira linha, duas seleções canalizam o favoritismo, por motivos mais do que justificados. Têm uma geração fabulosa de jogadores e conseguiram montar excelentes seleções. Acima de tudo, jogam como o Brasil antigo jogava. Sem freios ou receios. O medo passou para o lado de cá, desgraçadamente.
———————————————————-
Felipão em mais um pré-teste
Contra o Chile, hoje, Felipão terá mais uma chance de avaliar o poder de fogo da seleção nativa em novo pré-teste para a Copa. Se deu uma espiada no jogaço de ontem entre Bayern e Barcelona certamente deve ter se assustado. Os gringos estão correndo muito, jogando em velocidade e trocando passes praticamente sem errar. Tudo o que o Brasil não tem hoje. Para piorar, eles têm craques aos montes, coisa que também é passado entre nós.
Acima de tudo, a Seleção Brasileira terá que romper o estágio da arrogância, que começa pelo próprio técnico, autor de frase assustadora em recente entrevista à Folha. Para Felipão, volantes inteligentes (que saem jogando) são o sonho de consumo apenas dos jornalistas. Os técnicos, segundo ele, preferem mesmo os brucutus.
Disse isso antes do show de colocação dos volantes do Bayern, que jogam tão bem que quase nem cometem faltas.
———————————————————–
Até parece que foi ontem
O mais significativo feito internacional do futebol paraense ocorreu há exatos dez anos, no tradicionalíssimo estádio de La Bombonera. Naquela noite, o Paissandu superou o temido Boca Juniors por 1 a 0, gol de Iarley, perpetrando uma façanha reservada somente a alguns poucos clubes brasileiros na história. Não faz tanto tempo assim, mas não se pode descuidar de sua comemoração, sob pena de cair no esquecimento, que é uma de nossas pragas mais danosas.
O time alinhou Ronaldo; Rodrigo (Gino), Jorginho, Tinho, Luís Fernando; Vânderson, Lecheva (Bruno), Sandro, Vélber (Rogério); Robson e Iarley. O técnico era Dario Pereyra. Iarley e Vânderson, heróis daquela jornada ainda jogam pelo clube. Lecheva e Ronaldo, também baluartes da vitória, integram a atual comissão técnica. Que as comemorações desta data sirvam de inspiração para futuras proezas.
———————————————————–
Expectativa para a grande decisão
Depois da surpresa que Flávio Araújo aprontou na escalação para o primeiro jogo, os bastidores do próximo Re-Pa estão alvoroçados. O que antes era tranquilidade absoluta no Paissandu já se transformou em justificada preocupação para sábado.
Alguns jogadores admitiram que o 3-6-1 anunciado no Mangueirão pegou Lecheva de surpresa e que mudanças de última hora foram orientadas quanto ao posicionamento, mas é fato que os primeiros 45 minutos foram inteiramente favoráveis ao Remo. Em alerta, o Paissandu deve ter nos próximos dois dias treinos variando simulações em relação ao adversário.
Do lado remista, apesar dos reiterados elogios à mudança feita por Araújo, há quem garanta que a maior transformação operada foi no aspecto emocional. Algumas declarações de jogadores do Papão foram muito exploradas e teriam funcionado como combustível para a gana com que os remistas entraram em campo.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quarta-feira, 24)