Felipão e a dura lição para técnicos veteranos

POR ANDRÉ ROCHA, na ESPN

Fim do sonho para a torcida gremista. Luiz Felipe Scolari, o messias, o Sebastião ferido pelos 7 a 1 que voltou para Porto Alegre redimir seu povo falhou mais uma vez. Pediu o boné sem títulos ou ao menos uma participação na Libertadores que venceu por lá em 1995.

Em 51 jogos, 26 vitórias, 12 empates e 13 derrotas, aproveitamento de 59%. Nem tão ruim, mas muito pouco para tamanha espera e tanta esperança. Mesmo com atenuantes como limitação financeira do clube, questões políticas, crise técnica de um elenco enfraquecido.

O técnico campeão mundial pela seleção em 2002 voltou ao Brasil em 2010 como um mito no Palmeiras, no escrete canarinho e no Grêmio. Em maio de 2015, aos 66 anos, parece sem idolatria e mercado. Pior: com a imagem arranhada por fiascos seguidos que uma Copa do Brasil no Alviverde e a Copa das Confederações não apagam.

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A mais dura constatação, porém, é que Felipão parece mesmo ter um perfil de treinador que ficou para trás. Não exatamente ultrapassado. Ele entende como funcionam os mecanismos do futebol atual dentro de campo.

O Brasil da Copa das Confederações, mesmo descontando todo o contexto favorável, jogou com intensidade. Novidade nenhuma para Scolari, produto da escola do sul do país que atua assim desde sempre. O Grêmio do último ano tentou investir em volantes mais qualificados, que tornassem mais dinâmico o 4-2-3-1 quase imutável da equipe.

No entanto, a impressão é de que o técnico conhece, mas não consegue transmitir os conceitos modernos. Talvez falte uma metodologia mais atual nos treinamentos. Felipão é de uma escola de treinadores que sempre investiu mais na intuição e na motivação dos atletas do que no exercício, na repetição.

Também confia no talento natural do brasileiro para atacar. Se a defesa estiver arrumada e não sofrer gols, lá na frente os atacantes resolvem. Acima de tudo, fazia o jogador correr por ele.

Só que o atleta de futebol mudou no século 21. Em geral, ele agora tem a família mais próxima, que investiu no seu talento. Alguns já sustentam pai e mãe desde garotos, com salários de profissional. Possuem agentes, empresários, aspones…Se o técnico for amigo e honesto, ótimo. Mas ele quer um treinador, não pai.

Felipão é de uma época em que jogar futebol não era exatamente a profissão dos sonhos. O jogador chegava com baixa autoestima, origem humilde, contra tudo e todos precisando de um colo, do ombro amigo. Ou de uma bronca para acordar. Agora, o profissional quer salário em dia, estrutura para trabalhar e um comandante que lhe diga o que fazer em campo.

Sem churrasco na casa do técnico para “unir o grupo” e bilhetinho embaixo da porta do hotel, porque o cara quer ficar com a namorada modelo ou nas redes sociais publicando selfies. Outros tempos. Uma lição.

Por isso a crise com vestiário rachado no Palmeiras, a briga com Kléber Gladiador. O fracasso na Copa do Mundo passa pela fidelidade canina a seus jogadores que não teve resposta em campo.

Quando Fred e Paulinho não corresponderam como no ano anterior, era hora de mexer na escalação. O treinador preferiu alterar a estrutura, avançando Neymar para compensar na frente e transferindo Oscar para o lado do campo.

Efeito dominó: cratera no meio-campo e Luiz Gustavo, que atuava perto dos zagueiros par ajudar a cobrir os ofensivos Daniel Alves e Marcelo, precisou ocupar mais a intermediária e a seleção desandou de vez. Nem as entradas de Maicon e Fernandinho corrigiram.

Os problemas técnicos e táticos influíram no emocional e não o contrário, como quiseram fazer acreditar. Jogadores que trabalharam com treinadores como Guardiola, Mourinho, Ancelotti, Heynckes e Van Gaal percebiam o time mal armado e não queriam ser os vilões da Copa em casa. Por isso o choro e os nervos em frangalhos.

Na tragédia do Mineirão, Felipão deu de ombros para os relatórios de Gallo e Roque Júnior que sugeriam o óbvio: sem Thiago Silva e Neymar, o melhor a fazer seria congestionar o meio-campo e reduzir os espaços para a técnica seleção alemã.

A torcida aceitaria até uma retranca, pelo contexto da semifinal. Scolari preferiu ouvir sua intuição: com Bernard, ídolo no Atlético Mineiro e “alegria nas pernas”, o time ofensivo chamaria a massa e intimidaria o rival. O resto é história…

Felipão é um personagem eterno do futebol brasileiro. Multicampeão, carismático, controverso, explosivo. Querido por muitos dos que trabalharam com ele. Vencedor no trabalho e na vida.

Exatamente por isso o momento parece, para quem está de fora, mais adequado para uma pausa. Refletir, ficar com a verdadeira Família Scolari que talvez esteja precisando do patriarca mais presente.

Sair de cena e deixar o tempo reavivar as muitas boas lembranças, cicatrizar as feridas. Ainda que algumas manchas fiquem para sempre.

Um comentário em “Felipão e a dura lição para técnicos veteranos

  1. Concordo com muito do texto, só que na parte da explicação dos 7 x 1 eu me lembrei de uma entrevista do Delfim Neto em que dizia que todo modelo econômico era bom pra explicar só o passado, é mais ou menos por ai com relação a esses “modelos futebolístico” que explicam os 7 x 1 e principalmente a teoria de congestionar o meio campo, só explica o que já aconteceu.

    Uma coisa que tem que ficar claro é que o Felipão assim como todos nós, envelheceu, no mundo das competições, seja ela a natureza que for, é difícil para um individuo se manter no auge, dificilmente ele vai se adequar as novas demandas táticas/técnicas do futebol atual, Felipão venceu o que tinha de vencer, só vai continuar no ramo, por que pelo que eu saiba não é o técnico que se aposenta é o mercado que aposenta ele, enquanto isso ele vai engordar a conta bancária com algum clube que consiga vender a esperança de que nesses tempos esse Felipão seja o Felipão de outrora, tudo isso por que as pessoas não entendem que envelhecem, os mais jovens vão se nutrindo dos avanços produzidos pelas gerações anteriores, eu olho pro retrovisor e vejo gente que na minha idade tem um conhecimento ( na minha área ) maior do que o meu quando eu tinha aquela idade, porém eu vejo que essas pessoas tiveram acesso a informações e a toda uma estrutura que eu não tive.

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