Uma praga do continente

POR GERSON NOGUEIRA

A América do Sul criou fama e deitou na cama como cenário de futebol técnico, bem jogado e até artístico, graças a alguns dos maiores craques que o mundo já viu. Maradona, Sócrates, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Riquelme, Zico, Francescoli, Falcão, Júnior, Valderrama, Romário, Messi, James Rodriguez, Neymar, Di Maria. Dá para citar mais de uma dezena de nomes, apenas dos que surgiram dos anos 80 em diante.

Paralelamente à justificada fama de malabaristas da bola, os sul-americanos foram acumulando a pecha de violentos em campo e mais selvagens ainda fora dele. Os acontecimentos de quinta-feira no estádio de La Bombonera, mítico caldeirão do Boca Juniors em Buenos Aires, fizeram reviver a era das trevas, quando visitar adversários significava enfrentar uma verdadeira guerra em campo.

unnamed (57)Quando as imagens exibiram as marcas de queimaduras nos jogadores do River Plate, alvejados com gás de pimenta no túnel de acesso ao gramado, esses tristes tempos reapareceram com toda força e nitidez.

A baderna de torcida foi felizmente combatida e extinta na maioria dos países da Europa, depois de um período dominado pelos hoolligans no Reino Unido e pelas gangues neonazistas no Leste Europeu.

Na América do Sul, principalmente na Argentina e no Brasil, persiste uma feroz resistência. Tudo originado das indomáveis e impunes “organizadas”, que fazem do futebol apenas uma desculpa para extravazar os ímpetos de ódio, fúria e bestialidade.

O que ocorreu na Bombonera não é uma exclusividade argentina. Acontece de vez em quando nos demais estádios da Libertadores. Há dois anos, o mundo acompanhou estarrecido a tragédia de Oruro, quando um garoto boliviano de 14 anos foi mortalmente ferido por um sinalizador lançado pela torcida corintiana Gaviões da Fiel.

A Conmebol, lenta como sempre, prometeu medidas que resguardassem a segurança dos torcedores, mas o episódio da Bombonera mostra que tudo continua como dantes. Onde as facções radicais se envolvem não há aparato de segurança que impeça tumultos e cenas degradantes.

As imagens da televisão mostraram um detalhe ainda mais patético na Bombonera. Os policiais tinham receio de mexer com o grupo “barra brava” que permanecia nas arquibancadas depois que a partida foi suspensa e os demais torcedores tinham ido embora. Só deixaram o estádio quando bem entenderam e, pelo visto, ninguém foi preso.

Mais terrível foi a ação das autoridades do jogo e do governo, que no primeiro momento tentaram negar o ocorrido, brigando com as imagens exibidas ao vivo pelas emissoras de TV. O secretário de Segurança Sergio Berni teve a pachorra de dizer que não havia ocorrido qualquer incidente.

O delegado da Conmebol ficou ligando para um médico paraguaio a fim de avaliar se os atletas Vangioni, Ponzio e Mori, do River Plate, tinham ou não condições de jogar. O árbitro esperou uma hora para decidir pela interrupção da partida. A própria Conmebol estabeleceu um inacreditável prazo até 14 horas de sexta-feira para o Boca “apresentar defesa”.

A Argentina enfrenta há mais de duas décadas o terror dos “barra-brava” sem conseguir levar vantagem. Optou até pela medida drástica de torcida única nos jogos oficiais, ação desmoralizada pelo constrangedor espetáculo de quinta-feira. O pânico que as gangues causam é tão visível que os jogadores do Boca se recusaram a voltar aos vestiários junto com os colegas do River, temendo represálias.

Espera-se que, desta vez, a Conmebol não resolva aplicar o esquisito critério usado em jogo entre Corinthians e River no Pacaembu anos atrás, marcado por brigas entre “organizados” e policiais. Na ocasião, mineiramente, a entidade preferiu declarar o estádio como culpado.

————————————————————

A saga cruel dos andarilhos profissionais

Quando saem as listas de dispensas nos clubes, como agora no Remo, que liberou seis atletas de uma só tacada, há quem veja nisso algo inteiramente normal e corriqueiro nesse ramo de andarilhos profissionais. Sob certo ponto de vista, até é normal, levando-se em conta o caráter temporário da maioria dos contratos.

Ocorre que o futebol brasileiro tem uma das estatísticas mais cruéis quanto a desemprego. A cada começo de temporada, logo depois dos campeonatos estaduais e das Copas Regionais, aproximadamente 11 mil atletas ficam sem trabalho. Se for aplicado o cálculo básico de mais três dependentes por cada profissional desempregado, serão 44 mil pessoas em dificuldades.

Quando o Bom Senso F. C. iniciou mobilização para interferir no projeto de regulamentação do esporte no Brasil mostrou particular preocupação com a dura realidade dos boleiros sem glamour, aqueles que não frequentam o noticiário dos grandes centros e nem têm seus gols mostrados nos principais canais de esporte.

São deserdados da sorte. Brasileiros como tantos outros de áreas diversas que convivem com o fantasma do desemprego e das incertezas.

Algo precisa ser feito, já.

————————————————————

Bola na Torre

O programa analisa a segunda rodada da Série B e a estreia do Águia na Série C. Guerreiro comanda, com participações de Tommaso, Rui Guimarães. Começa logo depois do Pânico na Band.

————————————————————

Perguntinha (im)pertinente

Que fim levou o inquérito do Ministério Público sobre a máfia da falsificação de ingressos nos estádios de Belém?

———————————————————–

Até breve

A coluna concede folga a seus 27 baluartes. Até mais ver.

Sigam-me os bons!

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO deste domingo, 17)

27 comentários em “Uma praga do continente

  1. Sobre a derrota do Paissandu e o início claudicante na série B, fica a lição para Maia e companhia: Trabalho que está ganhando se mexe pouco.

    Digo isto, pois é visível que o Paissandu, na figura dos seus diretores, pecaram em não manter uma base mínima para este ano, pecaram contratando jogadores de fora para fazer experiência no paraense (Leandro Canhoto, Aylon, Carlinhos, Romário e companhia) e pecaram mais ainda trazendo medalhões que pouco ou nada fizeram na ultima temporada (Rogerinho, Souza, Alves e Radames).

    Ps.: pecaram também ao trazerem Sidney Moraes no início do ano, menino dos sonhos de Roger.

    Curtir

  2. Égua, o Gerson já gosta de férias! srrsrrs brincadeiras a parte, é que essa coluna tem qualidade, analisar as coisas em geral com muitas palavras sem cansar o publico não é pra qualquer um.

    Aliás ontem teve uma coluna nova no Bola, o que eu gostei foi da parte última, “toques finais” hehehehe

    Curtir

  3. Acho que a punição justa ao Boca, seria apenas a eliminação da competição.
    E começar uma reeducação do seu torcedor.

    Esse negocio de afastar o clube de 1 ou 2 anos de competições sul-americanas seria um abuso.

    E assim sucessivamente, penso que tirar clubes de competições, só em caso de morte. No abordado do Corinthians, tiveram essa oportunidade, mas como disse o Gerson, o culpado foi o concreto.

    Curtir

  4. Amigo Lira, acho que o Maia se arrepende do pó até hoje, assim como eu lamento, de ele ter mandando o Mazola embora.

    Só dizendo que apesar de tudo, o Paysandu está tentando se refazer, pra isso vai precisar da paciência de todos em modo geral.

    Esse negocio de pedir cabeça de técnico é burrice, a metade deste elenco foi montando por ele,logo se trazer outros, virão novas contratações, e aí começa tudo de novo.

    Os 20 clubes da série B estão todos na mesma canoa ainda, claro que o Bota e o Sampaio se destacam por terem 6 pontos e o papão negativamente, por não ter nenhum, mas não existe esse negocio de zona de rebaixamento ou de acesso.

    Só a partir da 6° ou 8° rodada que atingem quase o 1° quarto do campeonato, é que já começará ser feito o mapa do Z4 e do G 4, pois já teremos equipes se distanciando e em campo mostrando que realmente chegaram pra subir, agora todo mundo é igual, e o papão tem muito a mostrar e tudo pra crescer

    Curtir

  5. Gerson desejo a você um bom descanso.

    Quanto à “defesa” do Boca, esse não deveria ter nem o direito de se defender não pelo clube em si e sim por sua torcida acostumada a apraticar esse tipo de “papelão”.

    Sobre os andarilho do futebol, como sou suadosita incorrigível, gosto de lembra os anos 80, quando o Paysandu trouxe das categorias de base do Fluminense, se não estou enganado oito jogadores que passaram mais de três anos no clube.

    Desses jogadores posso citar: Mario Fernando, Roque e Zezinho que depois de jogar muitos anos pelo Paysandu foi para o Remo.

    Curtir

  6. Aproveite bastante às férias amigo Gerson, eu também estarei curtindo alguns dias no Rio de Janeiro a partir de amanhã e o museu do flamengo está entre os lugares que vou visitar se Deus quiser.
    Até breve aos amigos do blog.

    Curtir

  7. Boas férias e aproveite o tempo para se recompor pois o seu trabalho exige muito do profissional fazendo os comentários com muita precisão. Ficaremos órfãos nestes dias, kkkk, mas vida que segue, um grande abraço!

    Curtir

    1. Valeu, amigo Miguel. Preciso mais do que nunca desses dias (12, na verdade) para resolver algumas coisas que estavam paradas. Mas continuarei aqui no blog desfrutando da companhia desta imensa família de fãs de futebol.

      Curtir

    1. Obrigado, amigo Harold. Meu infante João tem planos de me levar com ele até aí, já vai iniciar inclusive um curso de Japonês em agosto.

      Curtir

  8. O futebol sulamericano sempre se sobressaiu dentro das quatro linhas. Fora delas, em termos organizacionais e comportamentais (sobretudo das facções organizadas) sempre foi um horror. A barbárie imperou, ainda reina e não se sabe quando passará o cetro à civilidade. Enquanto na Europa se discute o clima gélido de algumas torcidas por causa do afastamento de torcedores mais fervorosos em detrimento dos mais abonados que veem no futebol apenas um lazer como outro qualquer (Inglaterra e Espanha principalmente) e a necessidade de se resgatar o torcedor mais aficcionado, por aqui ainda se discute o por quê da proteção do escudo policial aos atletas dos times visitantes quando da cobrança dos tiros de esquina. Será que o grande Gilberto Gil estava certo ao dizer, lá no fim dos anos 60, que “aqui é o fim do mundo”?

    Curtir

  9. Avatar de Nelio(PAYSANDU, ÚNICO CLUBE DO NORTE QUE CONSEGUE COLOCAR MAIS DE UM MILHÃO DE RENDA NA BILHETERIA EM UM JOGO) Nelio(PAYSANDU, ÚNICO CLUBE DO NORTE QUE CONSEGUE COLOCAR MAIS DE UM MILHÃO DE RENDA NA BILHETERIA EM UM JOGO) disse:

    Esta tragédia que ocorreu com jogadores do river Plate que também é argentino é so uma mostragem real da dificuldade que é vencer naquele estádio mitológico onde eu já fiz uma pesquisa e de forma espantosa cheguei a estatatística que pouquíssimos clubes de toda a América do Sul ( incluindo clubes argentinos) e Mexico em 55 anos de Taça Libertadortes conseguiram vencer esse Boca la nesse estádio. Não chega a 9 clubes e entre estes poucos está o PAYSANDU SPORT CLUBE, o qual venceu com autoridade e sem lance de sorte, O Papão jogou muito e venceu merecidamente. Eu nunca gostei de comemorar ou consagrar tanto somente vitórias e 3 pontos, acho que isto é obrigação dos clubes. Eu gosto de comemorar e consagrar títulos porque, ninguém tira mais da gente, fica pra história e ninguém esquece mais. Porém aquela vitória bicolor sobre o Boca merece destaque pela carreta de difilculdade que é vencer na La BONBONERA VALENDO PELA LIBERTADORES. OS ATLETAS DO RIVER PLATE QUE O DIGAM E FALEM POR SI SÓ.

    Curtir

  10. 1 – A punição do Boca saiu muito barata, não vi qualquer função punitiva-pedagógica na eliminação automática imposta pela conmebol, para um ato desumano e flagrante como foi cumulado com a postura dos jogadores do boca que ainda aplaudiram a mesma torcida que promoveu ato tão vergonhoso (incitação à violência) saiu barato, aaaaa saiu muito barato.

    2 – A FPF bem que podia retomar aquela competição que tivemos anos atrás de sub-23 ou então realizar um campeonato de 2/3 meses com as equipes que vão ficar sem atividade pelo resto do ano, terminaria justamente quando começaria a segundinha.

    3 – Boas férias Gerson.

    Curtir

  11. A América do Sul tem hoje os principais jogadores do mundo. Messi. Cavani. Tevez. Neymar. James Rodrigues. Vidal. Luiz Suares. etc. Merece um futebol melhor organizado.

    Curtir

  12. Boas férias. Pena que vamos ficar esse período sem uma visão crítica sobre a preparação do Leão para o Brasileiro e sem a analise das derrotas do Paissandu nas próximas rodadas.

    Curtir

  13. Obrigado Gerson. Aqui no blog dá gosto de ler as notícias do nosso futebol, sempre tem uma novidade e não deixa o leitor cansado, parabéns pelo trabalho e boas férias! Em Julho é a minha vez se Deus quiser, estarei indo para o interior de Cametá, abraço!

    Curtir

Deixar mensagem para Édson do Amaral. Torcedor do Paysandu. Cancelar resposta