A dura missão remista

Por Gerson Nogueira

Jogar para não perder é, desde os primórdios, a maneira mais fácil de entrar pelo cano. Por isso mesmo, nunca apreciei times repletos de volantes e zagueiros. Quase nunca termina em boa coisa. O Remo, que encara o Bahia hoje à noite, precisa empatar para se classificar, mas basear toda a estratégia na defesa é um risco e tanto.
O jogo deve ser muito equilibrado, a partir do que o Bahia mostrou no Mangueirão. Um time rápido e habilidoso, que explora muito o toque de bola e raramente apela para o chutão. Tudo em absoluta coerência com a carreira impecável de seu atual técnico, Paulo Roberto Falcão. Além disso, explora uma jogada aérea sempre temível.
Marcar com eficiência e não ceder espaços. Essas são as alternativas para o Remo anular as forças de um time tecnicamente qualificado. Fazer isso com volantes e beques nem sempre é o melhor caminho, por provocar um recuo excessivo.
Com três zagueiros (Edinho, Diego Barros e Juan Sosa) e dois volantes (Jhonnatan e Adenísio), Flávio Lopes tentará montar um bloqueio eficiente, mas fica sempre a um passo de armar uma brutal retranca.
A fragilidade desse esquema está na movimentação dos ágeis meias do Bahia (Gabriel, Moraes e Lulinha), que no Mangueirão desfrutaram de muita liberdade durante todo o primeiro tempo. Depois, com Gabriel bem vigiado, o Remo corrigiu a falha, respirou e garantiu a vitória. A liberdade permitida no começo do jogo em Belém não pode se repetir em Salvador, sob pena de acarretar sérios prejuízos ao time paraense.
Não há dúvida que a missão remista é dificílima, apesar da vantagem do empate. Caso consiga repetir o exemplo do Paissandu, que resistiu no primeiro tempo e explorou o desespero do Sport na etapa final, o Remo tem boas chances. Só não se pode perder de vista que o Bahia é bem superior ao rubro-negro pernambucano.
 
 
Gabriel, principal articulador do Bahia, comandou a meia-cancha contra o Remo na primeira partida, joga muita bola. É, com razão, visto como a pedra preciosa do tricolor baiano. Tem apenas 21 anos e veio do futebol de várzea, não chegando a passar pelas divisões de base do Bahia. Ganhou chance pelas mãos do próprio presidente, que o viu jogando num torneio amador e o convidou para um teste no clube.
Neto do volante Flávio, campeão brasileiro em 1959, Gabriel é a arma criativa de Paulo Roberto Falcão para derrotar pelo Remo. No Mangueirão, só foi contido quando Juan Sosa entrou para vigiá-lo de perto. É bom tomar cuidado com o moleque. 
 
 
A definição de Lecheva como técnico do Paissandu para o Brasileiro da Série C é uma providência sensata dos dirigentes do clube. O prolongado suspense em torno do assunto só iria prejudicar o trabalho da comissão técnica. A partir de agora, Lecheva terá tranqüilidade para cuidar da montagem do elenco, indicando e testando jogadores. Apesar da pouca experiência, vem fazendo um bom trabalho e merece a oportunidade. 
 
 
Vamos combinar que esse time do Barcelona é tão bom e troca passes com tanta perfeição que até irrita. Até por solidariedade com os mais fracos, a tendência natural é torcer contra a máquina catalã. Tudo tem limite, porém. O embate de ontem contra o Chelsea, em Londres, um gol de Drogba (após passe do brasileiro Ramires) deu a vitória aos ingleses, mas o jogo só teve graça quando Xavi, Iniesta, Messi e Fábregas trocavam passes, driblavam e lançavam os companheiros.
Considero o Chelsea um dos mais broncos times do mundo – e não é de hoje. Seus jogadores parecem escolhidos sob medida para tratar a bola de maneira tosca, é quase pré-requisito. Seu estilo de jogo é tão rude que parece uma equipe de rúgbi. Lampard e Ramires são exceções em meio à limitação geral.
Diante de um Barça azeitado, o Chelsea fez o óbvio. Atuou como time pequeno, defendendo-se com armas, dentes, facas e espadas. Mandou bola pro mato, fez “faltas táticas” e apostou tudo no contra-ataque. E foi justamente num contragolpe que conseguiu seu gol.
O Barça perdeu as três ou quatro oportunidades de praxe e deixou a certeza de que liquida a parada no Camp Nou, sem maiores aperreios.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quinta-feira, 19)

Perguntinha do dia

Se o Águia pode mandar seu jogo pela final do returno no Zinho Oliveira, em Marabá, por que FPF e PM não permitem que o Remo jogue no Baenão a segunda partida?

Papão sonha com Xuxa, Marlon e Somália

A diretoria do Paissandu confirmou o técnico Lecheva no comando do time no Campeonato Brasileiro da Série C. Os bons resultados obtidos desde que assumiu a equipe convenceram os dirigentes quanto à sua manutenção no cargo. Como reforços, diretoria e comissão técnica elegem três jogadores como prioridades: o lateral-esquerdo Marlon (ex-Remo e atualmente no Caxias-RS), o meia Júnior Xuxa e o atacante Somália.

O ano da jovem guarda

Por Gerson Nogueira

Paulo Rafael (Jader); Pikachu (Tiago Cametá), Perema (Igor João), Tiago Costa e Pablo (Alex Juan); Jhonnatan (Alan Peterson), Neto (Djalma) e Betinho (Paulo André); Lineker, Ricardinho (Bartola) e Reis (Jaime). Este é o respeitável time de revelações do Campeonato Paraense, com direito a um banco de reservas dos mais decentes.   
Não há mais dúvida quanto ao principal legado (ô palavrinha desgastada pelas ditas autoridades…) deste campeonato. Pouco importa quem venha a ser o campeão. Interessa mesmo é que o futebol paraense conseguiu renascer nesta temporada, apresentando um punhado de bons e promissores jogadores. A maioria brotou nas escolinhas de Remo e Paissandu, mas vale destacar os atletas revelados pelo São Francisco, de Santarém.
Longe de ser uma maravilha no aspecto técnico, sem um time que realmente cause comoção, o torneio já é um dos mais importantes das últimas décadas por ter revelado tantos jogadores de uma tacada só.
Depois de anos seguidos, o torcedor andava cansado das importações em massa de veteranos, jogadores lesionados ou simples pernas-de-pau. O caso Finazzi, que veio “reforçar” o Remo no Parazão 2011, é emblemático.
Quase aposentado, o atacante tinha lesão na costela, mas os dirigentes insistiram em sua contratação. Passou mais tempo no departamento médico do que jogando e, quando entrou na equipe, não marcou nenhum gol. No fim das contas, recebeu cerca de R$ 150 mil e ainda processa o Remo, tentando arrancar mais R$ 200 mil do clube.
O Paissandu bateu o recorde de contratações no ano passado, chegando a montar e desmontar o elenco duas vezes. O cúmulo da bagunça administrativa foi a contratação de três técnicos (Roberto Fernandes, Edson Gaúcho e Andrade) para a Série C. Gastou o que não podia e terminou a disputa eliminado pela quinta vez consecutiva.
Patacoadas dessa natureza esgotaram a paciência das torcidas e esvaziaram ainda mais os cofres dos clubes, levando a uma tomada de atitude que inicialmente só foi visível no Paissandu.
Depois de sonhar com a volta de Andrade, a diretoria terminou optando por Nad, encarregado das divisões de base do clube. As portas então se abriram para Bartola, Pikachu, Neto, Luan, Djalma e outros moleques formados na Curuzu. O ciclo se completaria no returno, já sob o comando de Lecheva, quando a garotada mostrou maturidade e ganhou a confiança do torcedor.
No Remo, Sinomar Naves teve todas as condições de fazer o mesmo, mas preferiu abraçar a antiga cartilha, indicando quase uma dezena de importados para compor o elenco. Pior que isso: priorizou seus indicados na hora de escalar o time, deixando de lado promessas como Tiago Cametá, Betinho, Alan Peterson, Jaime e Reis. Todos, mais Jhonnatan, só seriam prestigiados no returno, depois que Flávio Lopes assumiu o barco.
Como se vê, bem ao estilo paraense, o sucesso da molecada não acontece pelas vias normais. Só se tornou possível por força das necessidades financeiras dos dois grandes da capital.
Que ninguém se iluda: se houvesse grana em caixa, a cartolagem certamente teria continuado a fazer as besteiras habituais, encomendando caminhões de ex-jogadores em atividade, certeza de dívidas trabalhistas mais à frente. Por acaso ou não, o certo é que os garotos provam que a solução está dentro de casa.
 
 
Remanescente da era Sinomar, o centroavante Rodrigo Aires, vive situação desconfortável no Baenão. Fora dos planos de Flávio Lopes, limita-se a treinar para manter a forma, à espera de um acordo para tomar o rumo de casa.
 
 
Para os que amam números, o confronto entre Paissandu e Coritiba já contabiliza 10 jogos, válidos pelo Campeonato Brasileiro. Pequena vantagem paranaense: quatro vitórias do Coxa, duas do Papão e quatro empates. Felizmente, não há risco de aparecer algum pascácio falando em tabu ou escrita. 
 
 
Recebo em primeira mão a nova edição de “Nunca Houve um Homem como Heleno” (editora Zahar), de Marcos Eduardo Neves, obra que deu origem ao filme “Heleno”, já em cartaz. Narra a saga de Heleno de Freitas, um dos mais importantes e carismáticos jogadores da história do Botafogo. Presente de tamanho bom gosto só podia vir de mãos alvinegras – no caso, as do amigo desportista Ronaldo Passarinho, a quem aproveito para agradecer.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quarta-feira, 18)

Adriano toma chope para ajudar na recuperação

O futebol não sorri para todos, mas é generoso com algumas figuras. O atacante Adriano , que se recupera acompanhado por médicos do Flamengo e deverá assinar em breve com o clube da Gávea, apareceu em público pela primeira vez depois da cirurgia no tendão de Aquiles, realizada na última sexta-feira. Ele almoçou nesta terça-feira em uma churrascaria na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro. O “Imperador” pediu chope para acompanhar os aperitivos e depois mudou para refrigerante, ao saborear o rodízio de carnes. O atacante chegou ao local de muletas, sem colocar o pé no chão, conforme relatou um cliente do estabelecimento. Segundo a reportagem do jornal O Dia, “na primeira aparição após a cirurgia no tendão de Aquiles, o jogador mostrou que tem seguido as orientações médicas”.

Consultado pelo iG, o médico José Luiz Runco, que supervisiona o tratamento de Adriano, afirmou que o “Imperador” não está tomando nenhuma medicação e que “pode e deve” sair de casa e andar com auxílio de muletas.

Então tá…

A sentença eterna

“O perigo de uma meia verdade é você dizer exatamente a metade que é mentira”.

De Millôr Fernandes.

Bob Dylan, de gorro, nas ruas de Copa

Por Jotabê Medeiros

Procurar por Bob Dylan na tarde do Rio equivale a procurar pelo Eldorado no meio da Amazônia peruana. Como achar essa espécie de Greta Garbo do rock entre ciclistas e corredores marombados, mulatas sargentellianas, turistas franceses e alemães com rostos tão vermelhos que parecem o braseiro da churrascaria Porcão? Dylan nunca quis ser encontrado, por que iria facilitar agora? Ainda assim, por contingência profissional, não restava outra coisa a fazer a não ser buscar por ele quixotescamente pela estupenda tarde de domingo. A estratégia era a mais óbvia: um giro pelos hotéis mais estrelados do Rio.
No Fasano, às 13h, não restava outra coisa a não ser entrar e fingir naturalidade no restaurante, e pedir pelo que o dinheiro alcançava ali: um carpaccio de vieiras e uma taça de cabernet sauvignon chileno. Uma dica: rejeitar o couvert nunca é um bom salvo-conduto para camuflar o boné, o jeans puído e o tênis novinho. Todos vão estranhar. Mas isso tudo só serviu para enrolar pouco mais de uma hora e meia, e não havia sinais da comitiva dylanesca por ali, apenas um cheiro caro de requinte e exclusividade.

Do Fasano de Ipanema para o Copacabana Palace foi um pulo. Mas a piscina e o buffet lotados de sósias de Jorginho Guinle não pareciam um bom refúgio para o bardo esquivo de Minnesota. Mais uns minutos enrolando ao pé da estátua de Ibrahim Sued, com sua famosa frase: “Ademã, que eu vou eu frente!”, e a inutilidade da empreitada começou a ficar mais penosa.
Ok, Ibrahim, você venceu! O estômago ronca, hora de dar um chapéu nas obrigações e ir até a cantina italiana que é um clássico desde 1976, tentando esquecer a frustração de mais uma pequena caçada inútil aos mitos do rock – bailes famosos de Mick Jagger e Bono estão na conta dessa peregrinação. Ao sairmos, chegou uma mensagem no celular de um amigo aniversariante: “Bom Dylan pra vocês!”

Cara de touca. Pouco antes das 16h, saída pela esquerda, já abastecido de uma refeição que custava metade do couvert do Fasano, tomando o rumo da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, para o táxi final antes do show. Ao menos no show ele dará as caras, e a torcida é para que essa noite promova novamente um encontro com a sua música mutante que inaugurou uma nova perspectiva para a arte contemporânea. “Aquele cara de touca e casaco ali parece o Dylan”, ela diz, desencanadamente. Só o que me faltava, um sósia a essa hora, eu pensei. Mas aí o sujeito se virou para a avenida e o sangue gelou nas veias.
“A máquina! A máquina! A máquina! É ele! É ele MESMO!” Os segundos pareciam horas, a avenida parecia mais larga, e Dylan olhava para um lado e para o outro sem se decidir, parado na frente da banca de jornais da Rua Inhangá. “No direction home”, como sempre. Se for para o outro lado, vai pegar mal correr atrás dele, pensei. Mas aí ele veio para o nosso lado, tranquilamente, como se fosse parte da paisagem, sem causar nenhuma curiosidade dos velhinhos e dos cães de estimação de Copacabana. Caminhando resoluto, com as mãos nos bolsos. Fez uma careta quando viu a máquina fotográfica, mas não parou, continuou andando na direção da lente, e passou por nós aceleradamente.
“Hey, Dylan!” Ele já ia sumindo na rua quando se voltou e respondeu com um grunhido: “You are a f… paparazzi!” Não, não, não, eu jurava, querendo acreditar em minhas próprias palavras. “Para quê a foto?”, ele perguntou. “Para o Facebook, para a gente mesmo”, menti. Eu me peguei mentindo para Bob Dylan, minha alma estava ficando atormentada, ele era o primeiro ídolo e será o último. “Por quê?”, ele ainda perguntou. “Porque você é um dos importantes artistas do século 20”, respondi.

E ele sorriu. Só aí ele relaxou. Pediu para a garota se aproximar, para que eu tirasse uma foto dele com ela. As mãos tremiam, o foco desapareceu, a rua desapareceu. Sorriu quando ela perguntou se estava se divertindo no Rio. “Eu adoro!” Não sabia mais como mantê-lo ali. “Você está com fome?”, perguntei. Dylan acariciou a barriga com as mãos, fazendo o clássico gesto de bucho cheio. “Não mesmo.” Eu apontei: “É que ali na rua de trás tem uma cantina italiana daquelas clássicas, sabe aquelas que parecem frequentadas pela máfia? Muito boa mesmo.” Ele se interessou: “Para lá?” Sim, eu disse. “Ok”, ele disse, sorrindo de novo, e mudou a direção para a rua de trás. Resolvemos deixá-lo em paz (mas aposto que ele viu a gente pulando e se abraçando no meio da rua como doidos).
Trinta e quatro graus na sombra, e Dylan de casaco, gorro de lã e bota de caubói. Achamos que ele se disfarçaria melhor se saísse de sunga branca e fones de iPod nos ouvidos. No táxi, as mãos ainda suavam, o coração destrambelhado, e eu olhava para o Rio e sorria como uma criança. Não acreditava nos próprios sentidos. Publicar isso tudo seria trair a confiança do velho Dylan? Acho que só se fosse por lucro, e não é o caso. Ao deixar a gente no hotel, o taxista, que ficou só ouvindo a euforia, perguntou: “Quem vocês focaram?” Ao ouvir a resposta, ele demonstrou conhecimento do assunto. “Ah, o senhor Zimmerman! O narigudo! Aposto que o reconheceram pelo nariz, não?”.