Dilma está certa

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POR ANDRÉ FORASTIERI

Os Fundamentalistas das Finanças estão em polvorosa: presidente se nega a cortar gastos sociais! Irresponsabilidade fiscal! Primeiro vamos cortar na carne, depois vamos discutir aumento de impostos!
Já reparou como investimento que beneficia os mais pobres é sempre “gasto”? Esses Talibãs são radicais às custas dos outros. Eles defendem cortes, contanto que os cortados sejam a peãozada que mora lá na periferia. Os banqueiros exigem cortes, mas também exigem continuar com os lucros mais altos do mundo. Os empresários exigem cortes, mas não nos subsídios, não no apoio à exportação, não na Zona Franca, e nem pensar em reonerar as folhas de pagamento. O jornal estampa na primeira página a cobrantina, mas não abre mão da isenção fiscal na compra de papel. E por aí vai.
É fácil você defender que o governo pare de investir em casa própria para os pobres, hospital para os pobres e escola para os pobres quando você é rico. É fácil e imoral, mas pior ainda, é errado na prática e na teoria. Se você está morrendo de fome, a última coisa a fazer é regime.
É matematicamente impossível sair de uma crise econômica diminuindo o investimento público. É o que vem tentando Dilma, e é exatamente a que foi defendido por Aécio. Ela faz o que prometeu que não faria jamais: tarifaço, aumento de juros, recessão. A diferença entre os dois é sutil. Aécio anunciou que se vencesse, seu ministro da fazenda seria o dono de banco, Armínio Fraga. Joaquim Levy foi aluno de Armínio, mas não é banqueiro. Era funcionário do Bradesco: é bancário. Quem manda na economia é Dilma.
E nesse momento, sob imensa pressão, Dilma rejeita cortes adicionais nos gastos sociais. Defende o Bolsa Família, mantém boa parte dos subsídios para construção de casas populares, banca aumento do salário mínimo, sustenta aposentadorias. Jogo de cena para a base petista? Pode ser. É pouco, perto do que o Brasil precisa? Claro. Temos cem milhões de jovens do Brasil, e eles precisam de um horizonte, e oportunidades para usarem toda essa energia – trabalhar, empreender, criar.
Mas ao resistir às pressões para cortar mais na carne dos pobres, Dilma denota mais sensibilidade social e inteligência econômica que os defensores dessa falsa “Austeridade”, que é só outra maneira de dizer “transferência dos recursos do povão para os credores”.
Brasileiro adora imitar americano. Essa é uma boa oportunidade. O país é a grande referência da economia do planeta. O dólar é a moeda mundial, e o Banco Central americano, o Federal Reserve, é o banco central dos bancos centrais.
Como o governo americano enfrentou a crise de 2008? Apertou o cinto? Fez o contrário. Obama afrouxou geral e seu governo saiu investindo. Fizeram igual os bancos centrais da Europa e do Japão. Inundaram a Terra de liquidez. Foi assim que o mundo sobreviveu ao tsunami, e o Brasil pegou carona e surfou uma marolinha. Barack também aproveitou para manter Wall Street desregulamentada, no que perdeu uma oportunidade de ouro, e pagamos o preço por isso.
Na época, até os banqueiros diziam: “agora somos todos Keynesianos”. O que defendia Keynes, que a revista The Economist chamou de “o maior economista britânico do século 20”? Em uma frase, que a economia de um país não deve ser deixada ao sabor dos ventos do mercado, mas estimulada quando necessário com investimentos do seu governo, para garantir empregos e crescimento. Outra revista, a Time, decretou: “sua idéia radical de que os governos devem gastar dinheiro que não têm pode ter salvado o capitalismo”. É o que todos os governos fazem, no século 21.
O orçamento do governo federal americano é US 3,9 trilhões. E eles gastam menos do que arrecadam, certo? Errado. Os EUA gastam muitíssimo mais do que é gerado pelos impostos: mais de 500 bilhões por ano! Quer dizer: lá pode ter déficit. Aqui, nem pensar.
E o governo americano investe dinheiro público na economia americana? Mas é lógico. De muitas maneiras diferentes. Subsídios para empresas, tem por lá? De monte. Dos governos federal, estaduais e municipais. Só para fazendeiros, são US 20 bilhões por ano. Para a indústria do petróleo, US 18,5 bilhões por ano. O subsídio mais escandaloso e horrível de todos: o orçamento das Forças Armadas americanas é US 642 bilhões por ano. Quase 4% do PIB.
Você pode amar ou odiar Dilma. Está equivocado nos dois casos. A política econômica de Dilma é errada no atacado, mas a presidente está certa ao defender os investimentos sociais. Para lidar com governantes há que usar a razão, não a emoção. Política demanda fiscalização e pressão. Há que usar o cérebro, não o fígado ou o coração – por mais tentador que seja.

17 comentários em “Dilma está certa

  1. Muito ingenuo acreditarmos que a defesa é em investimentos sociais. Se houvesse um planejamento estrutural sério o discurso de investimento social já teria obtido melhores resultado, afinal já tem 30 anos que esse discurso é usado.
    O Brasil que eu vivo não tem proposta de nação, apenas projetos partidários. Nós, “tolos mortais” ficamos discutindo quem é o melhor (PT, PSDB, PMDB, DEM, PSol…) deixa quieto… somos no máximo o “Senhor das moscas”.

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  2. De fato, uma coisa é gerir uma empresa, outra, um país. À maneira de Ford uma empresa pode crescer, afinal, seu objetivo é o lucro. Já um estado, seu objetivo é outro, e sua meta é o desenvolvimento. É que o crescimento para um e o desenvolvimento para o outro, são coisas diferentes. E não podem ser a mesma coisa, mesmo.

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  3. Óbvio que houve muitos equívocos no governo.

    Segurar parte dos preços através de canetadas foi um deles, já que, esta é uma prática que nunca será uma coisa boa, pois o acumulo aparecerá depois de maneira impetuosa.

    Mesmo com estes equívocos visivelmente eleitorais (acho que qualquer um faria a mesma coisa na situação dela), Dilma acerta ao manter os investimentos nos programas sociais, de modo especial no bolsa (que infelizmente ainda é desvirtuado, porém necessário), pois, é apenas mantendo o poder de compra dos mais pobres e oportunizando que eles ascendam socialmente que teremos (no futuro) um mercado interno de consumo consolidado economicamente.

    Mas apenas isto não basta, é bom que se diga.

    É preciso que o governo comece cobrar que os mais ricos assumam suas responsabilidades pelo desenvolvimento do país. É preciso que eles comecem a parar de serem meros especuladores financeiros (verdadeiros vivem no vácuo) para tornarem-se parceiros do Brasil.

    Caso eles não desejam investir pesado no país, que comecem a serem fiscalizados ferozmente para que a sonegação seja reduzida e, consequentemente, o Brasil possa começar a acumular divisas para voltar a desenvolver-se socialmente.

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  4. Neste país a gente paga uma carga tributária de quase 40% do PIB, trabalhamos 5 meses e meio só para pagar impostos e precisamos pagar plano de saúde pq o estado não oferece atendimento médico que preste, precisamos pagar escola particular pq a escola pública só funciona 7 mesmos por anos (os outros 5 são de greve) e com péssima infraestrutura e qualidade de ensino, precisamos pagar seguro pra tudo o que compramos pq a segurança pública é um lixo, precisamos acordar de madrugada e passar horas em uma fila se precisarmos de qualquer documento público, precisamos passar humilhações nas portas das repartições públicas quando precisamos solicitar qualquer benefício, ficamos horas parados em gigantescos engarrafamentos pq não foram construídas estradas, viadutos e cruzamentos suficientes, precisamos andar exprimidos em ônibus velhos pq a concessão pública não nos garante o mínimo de conforto, precisamos aceitar a perda de nossos bens quando somos roubados pq o sistema de segurança público é precaríssimo com falta de pessoal e equipamentos e por aí vai.

    Ou seja quase a metade de toda a riqueza gerada no Brasil vai para as mãos do governo e não recebemos praticamente nada em troca.

    Desse jeito fica difícil a população apoiar aumento de impostos quando a gente sabe que isso é apenas pra tampar o rombo causado pela irresponsabilidade com a gestão do dinheiro público e não vamos receber absolutamente nenhuma melhoria no serviço público em troca, pois tudo vai continuar do mesmos jeito e essa CPMF provisória vai virar permanente, como foi no governo do FHC.

    Quer fazer o ajuste fiscal que corte despesas e ajuste seus gastos às suas receitas. Não quer cortar na área fiscal, corta no custeio, em investimentos, reduz o número de ministério (pra quê 39?).

    Pelo dito concluo: Sou completamente contra a criação ou aumento de tributos no Brasil.

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  5. A questão, Nação, é que quem mais “perde” com a CPMF são os rentistas.

    Pessoas que tem milhões aplicados – não pagando imposto por isso – e retiram apenas a rentabilidade. É esse que o governo quer pegar com a CPMF. Pois estes deveriam investir no Brasil.

    Claro que ninguém quer mais imposto, principalmente pela situação que colocaste.

    Mas, se não ajudarmos o Brasil (o governo errou ao não analisar devidamente a situação econômica mundial), todos serão afetados, principalmente quem mais precisa.

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  6. Quero rapidamente mostrar um negócio…

    Brasileiro prefere investir na casa do vizinho do que na sua terra. Muitos ricos estão migrando para os EUA. Mas, para obter vistos “permanentes” (não são green card), eles são obrigados a dar 500 mil dólares por família (Marido+mulher+filho menor de idade) para o governo dos EUA. Este dinheiro é investido na economia dos EUA para que esta mantenha-se aquecida.

    Pergunto: quanto desses ricos já pagaram faculdade para um filho de empregada?

    Ps.: uma das situações mais bizarras dessa reportagem foi de um juiz que tinha uma casa glamorosa de frente para praia aqui no Brasil – mais de dez quartos com suíte – com direito a quatro empregadas trabalhando para seu conforto. Lá nos EUA eles limpam o seu banheiro e pagam uma diarista por semana. Lá são humildes. Aqui são soberbos. Lá pagam valores justos para diarista. Aqui exploram.

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  7. Sr. Celira,
    CPMF é um imposto maléfico pois incide em cascata e cumulativamente, e atinge a todos, pobres, ricos e classe média, de forme indistinta, pois aquele coitado que recebe uma ajuda da família para ajudar no orçamento vai pagar os mesmos 0,2% que o milionário que transfere milhões para compra de um iate.

    Dizer que esse imposto só atinge ricos não é sustentável, pois basta vc ir em qualquer banco e ver quem são as pessoas que estão na fila dos caixas.
    Esse tributo atinge qualquer operação bancária e não só aplicações.

    outra coisa, depois de implantado esse 0,2 pode virar facilmente 0,3, 0,4, 0,5%… é muito perigoso.

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  8. Nação,

    Não é que a CPMF incida apenas sob os ricos, pelo contrário, atinge os pobres. Mas, diferentemente dos pobres, parte dos lucro dos ricos (empresas) são rendimentos (famosos rentistas) que não caem na malha do imposto de renda, daí que, isso passaria a ser tributado.

    Agora, concordo com você quando dizes que de 0,2 pode virar 0,3…

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  9. Sr. celira permita-me humildemente discordar quando o Sr. diz que a o rendimento das aplicações financeiras dos ricos não é tributada e que a CPMF iria atingir essa base não tributada.
    A uma pq os rendimentos financeiros, não só dos ricos mas de todos, é tributada pelo Imposto de Renda, inclusive com a retenção sendo feita pela instituição bancária. isso gira em torno de 15% sobre o rendimento, dependendo do tipo de aplicação e do tempo em que o dinheiro fica aplicado. A aplicação também é tributada pelo IOF.
    A duas pq a CPMF não vai tributar os rendimentos financeiros, mas apenas a movimentação bancária. Claro que se vc transferir dinheiro da sua C/C para uma aplicação vc vai pagar CPMF mas ela não vai incidir sobre os rendimentos auferidos.

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  10. Caro Ferdinando, tudo é muito simples, né? Analise bem sua própria afirmação. Digo, e digo bem, que nunca houve o investimento necessário ao desenvolvimento do país. As elites nacionais não se interessam em produção, mas em rentabilidade. Houve um forte fluxo de capital para estas elites, e sempre haverá enquanto não mudar o perfil da aplicação do capital. As elites retornam o dinheiro para a economia, aprisionando capitais em especulação financeira. O crescimento brasileiro na década passada é totalmente creditável à população que trabalhou e consumiu. O Brasil atrai multinacionais porque o mercado interno é gigantesco e lucrativo, mas é preciso produzir para competir nele. E não é o custo da mão-de-obra que aumenta os custos, mas a carga tributária que incide sobre a produção. A CPMF, como qualquer imposto que aumente o peso dos tributos sobre rendimentos pode assumir um papel importante, levando especuladores a investir em produção e gerar empregos, mas, penso que o governo federal, assim como estados e municípios, devem sinalizar a redução de tributos sobre a produção. Essa talvez seja a deixa mais interessante para que se pense uma reforma tributária realmente efetiva. A renúncia de Dilma é só um impropério das elites que, estranhamente, tem encontrado reverberação nas camadas mais pobres da sociedade. A crise está aí e seria mesmo inevitável, e o governo errou grosseiramente na medida da crise para o país. Vejo uma inversão histórica no otimismo e no pessimismo. No governo FHC, as medidas contra crises eram amargas e o mais pobre sempre levou a pior. Ao avaliar mal a situação, o governo Dilma foi otimista quando era preciso cautela. No entanto, concordo que o governo seja o principal fiador do desenvolvimento, porque ele é mesmo. O governo precisa continuar investindo na população, acreditando na capacidade de recuperação da economia, mas, acima, precisa fomentar a produção, atraindo o capital metido na especulação financeira a produzir bens e serviços, gerando emprego e distribuição de renda. Esse é o principal desafio brasileiro e que bom que discussões sobre temas tão espinhosos tem sido levados a bom nível de diálogo. Um abraço a todos.

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    1. Luiz, bem antes de falar em prisão da presidente (que nada cometeu de errado), seria justo e coerente protestar contra a impunidade de FHC, Aécio, Alckmin & cia. Esses senhores, todos envolvidos reiteradas vezes em falcatruas que lesaram o país, continuam blindados e livres para bradar contra a corrupção. Deveriam estar presos só pelo cinismo.

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  11. “Fundamentalistas das finanças” é expressão generalizante e diversionista. Por outro lado, constitui acentuado distanciamento da verdade dizer que a reeleita “se nega a cortar gastos sociais”.

    Deveras, desde que ela iniciou o segundo mandato que gastos sociais vem sendo vítimas de cortes. Que o diga o seguro desemprego, as benefícios dos pensionistas por exemplo.

    E a esmagadora maioria daqueles que reclamam não o fazem por fundamentalismo, mas sim porque são contribuintes trabalhadores que vivem do salário de seu trabalho e estão cansados de ter suas finanças e economias saqueadas por uma carga tributária que é escorchante, que não para de crescer, e que não é revertida pelo saqueador em serviços públicos em qualidade e quantidade suficiente para satisfazer condignamente o interesse da coletividade.

    Demais disso, se existem os rentistas, os grandes capitalistas, a elite endinheirada entre os que reclamam das imposições tributárias do governo e de sua voracidade confiscatória do suor do trabalhador, estes, conforme os governistas e seus apoiadores estão cansados de dizer (e com razão), correspondem a uma minoria.
    (…) Cont.

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