Por Michelle Miranda, em O Globo
AC/DC vendeu mais de 200 milhões de discos no mundo, ainte tem álbuns (como “Highway to hell”) em listas de mais vendidos e até hoje faz shows esgotados em estádios. Apesar de ser uma das bandas mais importantes da história do rock, há controvérsias sobre o talento e a relevância dos irmãos Angus e Malcolm Young e suas várias formações. É o que o jornalista Mick Wall retrata em “AC/DC — a biografia” (Globo livros), que chega agora ao Brasil, com histórias de brigas, bebedeiras e envolvimento com drogas. Ao longo de 30 anos de carreira, Wall já escreveu outros livros sobre artistas, como “Lou Reed: the life”, “Black Sabbath: symptom of the universe”, “Enter Night: the biography of Metallica”.
— Eles continuam tocando para 70 mil pessoas. Mas isso acontece porque a banda se tornou uma marca tão forte quanto um McDonald’s ou um filme da Disney — comenta Wall por telefone. — Mesmo que não seja exatamente bom, as pessoas consomem por causa da tradição. Os últimos álbuns foram medíocres. Eles tocam o mesmo setlist toda noite, Brian (Johnson, o vocalista atual) não consegue se lembrar das letras, ele usa um teleprompter. Não é porque uma banda tem muitos fãs que significa que ela é realmente boa.
No início do mês, através do site oficial do grupo fundado na Austrália em 1973, foi confirmado o afastamento do guitarrista, compositor e fundador Malcolm Young “após 40 anos por conta de um problema de saúde”, sem especificar do que se trata.
— Não é câncer, como as pessoas têm especulado, mas ele está muito doente e não é o tipo de doença da qual as pessoas costumem se recuperar — diz o biógrafo, opinando sobre uma possível aposentadoria do grupo, já negada publicamente por Johnson. — Quando se tem muito dinheiro envolvido é difícil de parar. Johnson tenta sair da banda há dez anos, mas Malcolm sempre consegue segurá-lo com uma proposta irrecusável. A não ser por Angus, todos os outros já foram substituídos. Malcolm se afastou da banda por um ano no fim dos anos 1980 por problemas com alcoolismo. Stevie Wright fez a turnê no lugar dele e ninguém percebeu.
Na biografia, que não é autorizada, mas não teve nenhum tipo de relutância da banda ao ser publicada, Wall procurou amigos, empresários, produtores e baseou-se em diversas entrevistas. Ele traça um perfil dos integrantes e apura episódios obscuros da história, como a morte de Bon Scott — segundo a ocupar a função de cantor e voz do álbum icônico “Highway to hell” (1979) — no dia 19 de fevereiro de 1980, aos 33 anos.
— Por 30 anos, disseram que Scott morreu após uma bebedeira. A verdade é que ele tomou heroína. Falei com autoridades, médicos e pessoas que estavam com ele no dia. A combinação da droga com álcool foi fatal — revela, aproveitando para explicar o funcionamento do grupo. — Em sua arrogância, Malcolm é o líder e toma todas as decisões. Todo mundo achava que o cabeça era Scott, que tinha muito mais a dizer, ou mesmo Angus, que rouba a atenção nos shows. Johnson, por sua vez, é completamente inexpressivo. Eles o veem como uma pessoa muito grata por exercer a função de vocalista e não representa ameaça de roubar o estrelato dos fundadores. Ele estava à frente da banda em “Back in black” (1980, primeiro disco após a morte de Scott) e fez bem seu trabalho. Mas qualquer um naquele momento teria feito o mesmo sucesso.
Como legado musical do grupo cujo último álbum lançado foi “Black ice” (2008), Wall enumera a influência da banda na inspiração de Kurt Cobain no Nirvana, além do “miniAC/DC” que se tornou a australiana Airbourne. Ele acredita que o último bom trabalho foi “Back in black”, produzido por Robert John Lange, que também assina “Highway to hell”. Lange, segundo Wall, foi demitido por Malcolm, que acreditava ter capacidade de fazer o próximo álbum sozinho. O resultado: “’Flick of the switch‘ (1983) é o pior disco da história da banda. Foi um vexame o número de vendas e Malcolm quase destruiu seu legado”, diz o biógrafo.
— As bandas antigas se tornaram um jukebox. Não existe nada errado em pessoas mais velhas fazerem música, acho que Bob Dylan faz um trabalho fantástico ainda hoje. Mas é preciso se renovar — opina. — O Metallica continua se arriscando. Eles lançaram “Lulu”, com Lou Reed, que foi muito criticado, mas foi uma tentativa ao menos. As pessoas se sentem maravilhadas ao se conectar com alguém que esteve naquela era de ouro do rock. Ficam deslumbradas de imaginar que eles usaram as drogas daquela época, tinham groupies, festas e tantas opções das bandas consideradas as melhores do mundo em seu ápice.