Por Janu Schwab
Se todos os males do mundo da publicidade, do marketing promocional ou coisa que o valha pudessem ser resumidos em uma única frase, minha escolha, sem titubear, seria a tal “é preciso pensar fora da caixa”.
Dentro desse universo, não há nada mais petulante e angustiante do que esse apanhado de palavras de significado duvidoso. Nada mais representa com fidelidade a pantomima que põe publicitários como doutos moradores de um Monte Olimpo da criatividade universal, distantes dos reles mortais e suas vidas de folha de ponto, carimbos e crachás.
Pensar fora da caixa? Pfff… Passei a primeira metade da minha vida tendo um milhão de mantras pós-modernos empurrados ouvidos adentro numa tentativa de interagir e construir o arcabouço que, sempre disseram, me faria estar a frente dos outros. “O mundo é uma selva”, diziam enquanto eu assistia à Tv Colosso.
A humanidade é viciada em dogmas. Faça isso, não faça aquilo, pense assim, não pense assado, obladi-obladá e toda a infinidade de máximas que a imaginação e a programação neurolinguística podem formular passaram por aqui. Mas nenhuma, nenhuma frase foi repetida tantas vezes e tantas vezes me deixou mais angustiado quanto “é preciso pensar fora da caixa”.
Nunca tive problemas em distinguir literalidades, figuras de linguagem, eufemismos e afins. Mas essa frase enigmática, esse comando que não diz a que veio, esse joguete charmoso que apenas lhe incita a algo e encerra-se em silêncio sempre me foi mais tensão do que estímulo. Mais lágrima do que suor.
Pensar fora da caixa. Sei bem do que se trata: enxergar além do que se vê, entregar muito mais do que esperam, “se o mundo zig, você zag” e fazer valer o título de doutor honoris causa em criatividade que carregamos por sobre nossas cabeças; afinal, na indústria criativa, somos todos criativos.
Porém, a frase “é preciso pensar fora da caixa” sempre me vem como um “te vira” cheio de floreios, enquanto o tempo, essa máquina de mofar sonhos, escorre por entre os dedos e o mercado, de dentes arreganhados, espera por nossos erros.
“Pensar fora da caixa” sempre me soou uma desculpa para ignorar briefings mal escritos (e desmerecer a importância do mesmo no processo) ou pedidos de clientes que sempre foram feitos em cima da hora. “Pensar fora da caixa” passou a ser uma forma rebuscada de jogar uma pedra quente no colo de quem esteve esperando uma batata. Alguém consegue fazer purê de granito?
Figura de linguagem por figura de linguagem, se a caixa é a realidade do brief, do pedido do cliente ou do prazo da tarefa, não posso pensar fora dela sem antes conhecer – e entender – o que há dentro dela, certo? Nunca me responderam sim, não ou talvez. E meu anseio por informações que iam além de “nosso público alvo é todo mundo” ficou no ar como um capricho.
A frase virou um dogma. Um dogma que faz com que a gente se preocupe mais em surpreender do que pensar. Em tempos onde qualquer um é mais do que realmente é, mesmo fazendo menos do que poderia, não faz o menor sentido ser um forasteiro de uma terra que é sua enquanto durar o contrato.
Sejamos francos, poucos de nós têm interesse em conhecer o cliente a fundo, seus anseios, seus propósitos não só como marca, mas também como gestor da mesma. Queremos empurrar nossas ideias, porque é com elas que fazemos portfólio, fama e dinheiro. “Quero meu milhão antes dos trinta”, alguém sussurrou.
Poucos de nós entendem que o papel de um profissional de publicidade, de marketing promocional ou coisa que o valha não é ser um varejista de fórmulas sensacionais, “pagou, levou”, mas um concierge de soluções feitas sob medida, “pois não, como posso ajudá-lo?”.
Demorei um pouco para enxergar que era isso que fazia com que eu me sentisse uma fraude diante das inúmeras oportunidades que se disfarçavam de obstáculos intransponíveis e dificuldades insolúveis. Quando tive esse estalo e alguém voltou a dizer “é preciso pensar fora da caixa”, respondi de pronto: agora não, obrigado.
Janu Schwab é diretor de Planejamento da Fermento Promo