Foi tão sofrida quanto a estreia em 2002, quando o Brasil virou sobre a Turquia com um pênalti também inexistente. Desta vez, diante de um público vibrante, que empurrou e incentivou a Seleção o tempo todo, o time de Felipão sofreu o impacto do gol croata logo aos 11 minutos e custou a se aprumar em campo, terminando por chegar a uma vitória suada e bastante valorizada pelo futebol rápido e ousado do adversário.
O Brasil permitiu a abertura do placar em cochilo de Paulinho e Daniel Alves. Daí saiu a jogada que levou ao cruzamento fatal, escorado por Marcelo para as redes. O time acusou o golpe e levou um bom tempo para retomar o ímpeto inicial. Perdeu grande oportunidade em chute longo de Oscar e esbarrava na dura barreira defensiva croata.
Mas, em meio a incerteza, brotou a chama de inspiração do craque. Neymar partiu para uma tentativa isolada, arrancando da intermediária com a bola dominada e batendo no canto esquerdo do goleirão Pletikosa. A bola, mesmo desviada, entrou no cantinho.
Empate consignado, o Brasil ainda buscou virar no primeiro tempo, mas sofria com as indecisões ofensivas. Não se sabia se Oscar era o homem da direita ou da esquerda. Hulk não ficava em nenhum dos lados, completamente perdido. Quando o árbitro Yushi Nishimura encerrou a primeira etapa quase se ouviu o ufa da plateia, pois nos instantes finais a Croácia voltou a se assanhar em campo.
As palavras de Niko Kovac, técnico croata, prometendo ir para cima do Brasil, não foram vazias. Sob a liderança do camisa 10 Luka Modric, a equipe voltou do intervalo determinada a controlar as ações e buscar o segundo gol. Oscar era a ave solitária a tentar trabalhar a bola pelo lado direito, mas tinha pouquíssima ajuda na troca de passes. A Croácia quase desempatou em disparo do próprio Modric de fora da área, aos 18 minutos. Júlio César teve que se esforçar para espalmar.
Quando era mais forte o esforço croata em busca da vantagem veio o lance mais polêmico da partida. Nishimura apontou pênalti sobre Fred. Tocado por Dejan Lovren, o atacante se estatelou no gramado. As imagens mostraram que não era pra tanto. A falta não existiu, mas o Brasil passou à frente em pênalti cobrado por Neymar e quase defendido por Pletikosa, aos 26 minutos.
Muito vigiado, Neymar realizou um jogo à parte. Na verdade, fez o seu jogo. Correu o tempo todo, não apelou para o cai-cai e infernizou a linha de quatro zagueiros da Croácia. Não foi mais produtivo porque Hulk era peça decorativa, jogando no habitual estilo zagueirão de várzea, distribuindo empurrões e chutes a esmo.
No instante seguinte, Olic quase encaçapou, mas David Luiz bloqueou o cabeceio. Mais alguns minutos e o gol saiu, mas não valeu. Kovacic se apoiou nos ombros de Julio César tocando para o arremate de Jelavic. Com seus meias e volantes instalados no campo de defesa, Kovac conseguiu impor uma meia pressão que deixou Felipão sem muitas alternativas. Acabou optando por sacrificar seu melhor jogador para dar suporte à marcação. Ramires entrou no lugar de Neymar, que saiu sob aplausos intensos – quase na mesma proporção dos xingamentos dirigidos à presidente Dilma, cuja imagem apareceu no telão logo depois do segundo gol.
Bernard substituiu Hulk e deu vida à ponta esquerda brasileira, puxando jogadas em alta velocidade e atraindo marcadores. Foi através dele, aos 45 minutos, que um contra-ataque foi iniciado e a bola chegou a Oscar. Ele controlou a bola desde a intermediária e tocou com estilo para as redes, fechando o placar. O gol mais bonito da abertura da Copa coube a um dos melhores em campo, ao lado de Neymar e Modric.
Apesar da falha da arbitragem, o Brasil mereceu a vitória. Foi sempre resoluto na busca pelo gol, embora padecendo da crônica falta de criatividade no meio. Oscar joga muito sozinho e, para reter a bola, Neymar é obrigado a sacrificar-se voltando para buscar jogo. São jovens jogadores, mas a batalha contra fortes marcadores castiga demais a dupla de talentos do escrete. É algo para Felipão pensar – e se preocupar.
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Neymar e Oscar em altíssimo nível
Pela capacidade de fazer o jogo fluir e desafiar o esquema de marcação, Neymar e Oscar foram os grandes artífices da vitória brasileira. Estavam determinados a buscar espaços e quebraram a monotonia da meia-cancha brasileira, ontem muito presa, pois Luiz Gustavo estava ocupado apenas em marcar e Paulinho não fazia uma coisa nem outra. Neymar parecia disposto a desmentir seus críticos, que costumam acusá-lo de cair demais e se esconder do jogo. Foi audacioso e persistente, conduziu a bola de maneira inteligente e só foi parado com faltas.
Prejudicada pela velocidade dos atacantes croatas e a pouca combatividade de Paulinho e Luiz Gustavo, a defesa quase não teve sossego ao longo dos 90 minutos. Ponto alto da Seleção sob o comando de Felipão, a linha de zaga teve um teste dificílimo, pecando muito nas jogadas aéreas ensaiadas pelos croatas. Olic e Kovacic se impuseram desde os primeiros movimentos, deixando claro que este será um expediente muito usado pelos europeus na Copa.
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Ligação direta denuncia limitações
Em vários momentos do jogo, sobretudo no segundo tempo, o goleiro Júlio César e os zagueiros Tiago Silva e David Luiz rifaram bolas em direção ao ataque. Como todo mundo que joga futebol, deviam saber que é uma jogada inútil, burocrata e pouco criativa. É o recurso de quem não tem talento. Erguer a bola rumo à área inimiga pode até resultar em gol ou falta, mas é mais provável que seja rebatida pelos zagueiros e volte em poder dos inimigos.
Preocupa ver que o Brasil, quando cercado no meio-de-campo, não tem inventividade para sair do cerco e buscar caminhos improváveis. Só conseguiu essas vias alternativas pelos pés de seus mais habilidosos jogadores, Neymar e Oscar. Quando eram bloqueados, a bola voltava a ser tratada com certa afobação, quase sempre se refletindo nos passes errados.
Como é um time jovem e forte, o Brasil foi preparado para jogar intensamente, sufocando e se possível atropelando os oponentes. Ocorre que nem sempre isso é possível e aí vem a necessidade de administrar a posse de bola. Em várias ocasiões no confronto de ontem a Seleção se revelou incapaz de executar essa tarefa tão simples quanto fundamental para a condução do jogo.
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Clássico reedita a decisão de 2010
A Copa começou e a programação aponta hoje um clássico europeu de grandes encantos para os fãs do futebol. Holanda e Espanha duelam entre si pelo grupo B. É a reprise da final de 2010 na África do Sul. Desde então, os espanhóis perderam algum prestígio e os holandeses não conseguiram sair do patamar de sempre. De todo modo, é um jogo que promete fortes emoções e reserva a chance de observar um dos times que deverá estar no caminho do Brasil logo nas oitavas de final.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 13)