O PIB subiu, mas a imprensa conseguiu transformar isso em uma notícia ruim

Com desemprego em baixa, PIB do 2º semestre apresenta inesperada alta de 1,4%. Diante da boa notícia, imprensa reage com terrorismo político: seu emprego causa inflação.

Por Juliane Furno – Intercept_Brasil

O produto interno bruto, o PIB, brasileiro cresceu 1,4% no segundo trimestre de 2024. Das muitas surpresas apresentadas com a divulgação dos indicadores, a que mais me chocou  foi como a mídia hegemônica – preposto dos interesses do capital e, especialmente, do capital financeiro – fez a boa notícia parecer um sinal alarmante de problemas no futuro.

Não deveria me surpreender. Afinal, essa foi a mesma mídia, ou conjunto de mídias, que deram palco para opiniões como “Desemprego teria de subir para inflação convergir para 4,5%” em 2015, e a célebre argumentação de que “recessão e desemprego derrubam a inflação e devolvem poder de compra aos brasileiros” em 2017.

Antes de comentar sobre o “grave risco” do crescimento trimestral acima do esperado pelo mercado e desejado por boa parte dos economistas, vamos entender o que os dados do PIB indicam.

Em primeiro lugar, o crescimento econômico de uma nação periférica e subdesenvolvida, como a brasileira, pode ser motivada por  uma maior demanda pelos produtos que nós ofertamos ao mercado internacional, por exemplo. Isso impactaria a dinâmica interna pelo efeito do aumento da renda de exportação.

O crescimento também pode ser motivado por elementos da demanda interna, ou seja, por um aquecimento no mercado interno, que gera um conjunto de efeitos benéficos sobre a atividade econômica. 

Portanto, um primeiro elemento de análise é que o que puxou o crescimento de 1,4% do PIB, comparado com o trimestre anterior, foi a demanda interna.

Estamos vivenciando um ciclo em que o aumento da renda das pessoas – seja pela redução do desemprego; pelo crescimento das negociações salariais acima da inflação; pela retomada da política de valorização do salário ou pelo Bolsa Família “turbinado” – é o que dá o “start” e inaugura um ciclo virtuoso.

Se as pessoas estão com mais renda, elas demandam mais bens e serviços. Com isso, os empresários precisam contratar mais pessoas, refazer seus estoques e, muitas vezes, ampliar a sua produção. Apenas para citar alguns números: a taxa de desemprego está em 6,8%, menor taxa desde 2014, e a massa salarial, já descontada a inflação, está crescendo a um ritmo de 8% ao ano. 

Se olhamos o resultado do PIB pela ótica da demanda, entendemos melhor esse raciocínio: o consumo das famílias cresceu 1,3% e o consumo do governo também cresceu 1,3%, tudo comparado com o trimestre anterior, que já foi de crescimento.

Agora, se nosso olhar for de comparação do segundo trimestre de 2024 com o segundo trimestre de 2023, os dados de crescimento dessas duas variáveis são ainda mais expressivos: o consumo das famílias cresceu 4,9% e o do governo 3,1%. 

Esse aumento no consumo impacta diretamente os serviços, o comércio e a indústria nacional, que são fortemente dependentes da dinâmica de funcionamento do mercado interno. Por isso os serviços cresceram 1% e a indústria cresceu 1,8%, na comparação com o primeiro trimestre de 2023, enquanto a agropecuária apresentou resultado negativo de 2,3%. 

A melhora no ambiente econômico, a maior demanda interna e o aumento na disponibilidade de crédito ajudam a explicar o crescimento de 5,7% frente ao mesmo trimestre do ano anterior, da Formação Bruta de Capital Fixo, que é uma aproximação do crescimento do investimento, embora também estejam presentes aí as importações. 

A IMPRENSA E SEU TERRORISMO ECONÔMICO

Poderíamos sintetizar essa descrição em manchetes como: Brasil é a segunda economia do G20 que tem o maior crescimento trimestral; Crescimento do PIB trimestral é acompanhada da menor taxa de desemprego desde 2014; Crescimento é puxado pela indústria, com destaque para a indústria de transformação; Crescimento da renda real dos trabalhadores por ganhos salariais, queda do desemprego e inflação baixa explicam crescimento do PIB acima do projetado pelo mercado.

Mas não. Para os analistas dos principais jornais brasileiros, a alta do PIB vem acompanhada da ideia de “perigo”. Aí é que opera uma lógica de “terrorismo econômico”. Escutando uma das mídias de áudio da grande imprensa, ao anunciar os resultados dos PIB a entrevistadora muda o tom de voz e sugere, em tom de vinheta de filme de terror, que se prosseguir essa tendência poderemos vivenciar outra vez o “fantasma da inflação”.

O “terrorismo econômico” pode ser compreendido por um conjunto de discursos que sugerem que o governo e a política econômica não devam se distanciar do que elas denominaram “boas práticas macroeconômicas” sob o risco de a vida das pessoas ficar muito pior do que estava.

Não importa o conteúdo das mudanças, o medo de que a vida piore é o reinante. Por isso, os trabalhadores devem se contentar com uma política fiscal de apertos salariais, afinal, caso os salários cresçam muito esse mesmo trabalhador sofrerá ainda mais no futuro, já que salários mais elevados significam inflação, e inflação é combatida com aumento de juros, o que inibe a atividade econômica e causa desemprego.

Conclusão: contente-se com seu salário baixo, afinal, se ele crescer talvez você não tenha mais emprego.

É por isso que na sequência da notícia “PIB cresce 1,4%” vem o alerta: o que pode causar inflação; descontrole de preços; juros mais elevados entre outras frases que sugerem que, no fim das contas, o que importa – mesmo – é só uma coisa, estabilidade de preços.

Inclusive, é só para inflação que há metas, para crescimento, emprego e renda não. Não faltam analistas com resultados de bons modelos matemáticos sinalizando que estamos crescendo acima do “PIB potencial”, ou mesmo aqueles que sugerem que – pelos seus cálculos – a taxa natural de desemprego é de 8,9%, ou seja, 8 milhões de brasileiros devem idealmente permanecer desempregados.

O que fazer com 8 milhões de desempregados? Aí o modelo matemático falha, afinal, estamos tratando de decisões de política econômica.

Fica difícil achar que a inflação mais elevada é nosso destino certeiro quando, ao mesmo tempo em que cresce a renda e a demanda, também cresce a atividade industrial. Ou seja, fica difícil acreditar que estamos a dois passos do “fantasma da inflação”, com uma taxa anual de 4,5%, em boa medida determinada pelo comportamento do dólar e das demais instabilidades internacionais, portanto, respondendo mais ao câmbio do que as variáveis de consumo.

Seleção de dramas e horrores

POR GERSON NOGUEIRA

Um jogador personifica em especial a pobreza técnica da Seleção Brasileira. Danilo, lateral-direito titular, é um retrato das carências de um time que na maioria das vezes se comporta como bando. Foi assim, por exemplo, no jogo de anteontem contra o Paraguai, em Assunção.

Em várias ocasiões, o Brasil se portava como um time menor, acuado e trêmulo. Nem se pode dizer que foi uma surpresa, pois é situação que já se repete há algum tempo, em edições de Copa América e das Eliminatórias. Desta vez, porém, a coisa adquire contornos muito mais sérios.

O Brasil de Danilo briga com a bola. Cada lance põe por terra miseravelmente aquela lenda que sempre cultivamos de que este é o país do futebol. Se um sujeito distraído entrar no estádio para ver a Seleção jogar, jamais vai acreditar que é detentora de cinco Copas do Mundo.

Todos os movimentos apontam para uma equipe limitada, de baixos recursos e quase nenhuma iniciativa ofensiva. O Brasil tem Danilo como capitão Danilo, um lateral que não apoia o ataque e raramente cruza bola na área adversária. 

Somente em times muito depauperados tecnicamente seria possível ver um lateral como Danilo em posição tão destacada – e inútil. Nos torneios disputados no Brasil é possível achar pelo menos uma meia dúzia de alas bem mais capazes de explorar os lados do campo.

Nesse ponto entramos naquele que é o debate principal deste momento soturno do futebol brasileiro: a teimosia da opção obrigatória por jogadores que atuam na Europa, como se fossem todos superiores aos nativos. Não são – e faz tempo já. Os técnicos, a direção da CBF e os empresários preferem pensar diferente. É mais cômodo e lucrativo.

Como os treinadores se recusam a pensar fora do esquadro vigente, a Seleção segue como vitrine para brasileiros que jogam nas principais ligas. Alguns merecidamente lembrados – Vinícius Jr., Rodrygo. A imensa maioria, porém, não merece essa primazia nas escolhas.

Jogadores como Lucas Paquetá, Bruno Guimarães, Gabriel Magalhães e André atuam em times de nível modesto, que praticam um futebol quase sempre encolhido e defensivo. O único titular da Seleção que defende um time inglês de ponta é o goleiro Alisson, do Liverpool.

A insistência com jogadores desse perfil faz crescer o coro por mais oportunidades para atletas que jogam no Brasil. O argumento é forte: aqui pelo menos há competitividade e um grau de dificuldade maior. Em campo, os “estrangeiros” atuam mal e reforçam as críticas.

É pouco provável que esse critério seja alterado até a Copa do Mundo, mas a discussão está posta e ganha cada vez mais terreno. Não é, porém, o único grande problema a ser resolvido na Seleção Brasileira.

A figura do técnico incomoda e divide. Dorival é visivelmente um técnico-tampão, daqueles que chegam quando não há melhor alternativa. Está no mesmo nível de Emerson Leão, Sebastião Lazaroni, Carlos Alberto Silva e Fernando Diniz, um exemplo mais recente.

Os 11 jogos sob o comando de Dorival expõem erros terríveis na escolha de jogadores e falhas inaceitáveis na montagem do sistema tático.

Não há risco de o Brasil ficar fora da Copa, mesmo com o futebol medíocre de hoje, mas é improvável que vá além das quartas de final do torneio – limite auto imposto à Seleção nas últimas duas edições. A conferir.

Joel: aposta real ou apenas cartucho desperdiçado?

O atacante camaronês Joel, de 30 anos, foi apresentado pelo clube dois dias antes da demissão do técnico Hélio dos Anjos. Mesmo sem as condições ideais para jogar, acabou entrando nos minutos finais da partida com o Amazonas, na Curuzu, participando de duas jogadas apenas.

Foi claramente uma opção desesperada em jogo que podia complicar ainda mais as coisas, como de fato complicou. Entrou no lugar de Nicolas, que fazia uma atuação discreta. Essa substituição pode se tornar frequente quando Joel estiver fisicamente pronto.

Joel é centroavante de ofício. Foi assim que despontou no futebol brasileiro com as camisas de Coritiba, Botafogo e Avaí, principalmente. Seu último clube foi o Hà Nôi, do Vietnã, onde atuou até julho e marcou 11 gols em 28 jogos nas últimas temporadas.

A contratação de Joel deixou a impressão de uma ação desesperada por um atacante de área, depois que o PSC ficou repentinamente sem um camisa 9 para chamar de seu. O grande ponto de interrogação é se o camaronês é ainda um jogador decisivo e à altura das exigências da Série B.

Sob o comando de Márcio Fernandes, Joel terá certamente a oportunidade de provar utilidade e de brigar por um lugar no ataque.

Dívidas astronômicas não inibem contratação milionária

Em tempos de aquecidas resenhas em torno do fair play financeiro no futebol brasileiro, provocadas pelos vertiginosos investimentos da SAF Botafogo, desperta espanto geral a ousada contratação do astro Memphis Depay pelo Corinthians, anunciada e concretizada em tempo recorde.

Com direito a um ritual de apresentação digno dos grandes astros, com desembarque em grande estilo, o Corinthians montou uma cerimônia de gala de entronização do atacante holandês para os milhares de torcedores presentes ao jogo com o Juventude pela Copa do Brasil, ontem à noite.      

Pouco se discutiu se Depay será um reforço de fato para o time, que patina nas últimas posições da Série A. Entre a surpresa pela audácia e as muitas dúvidas quanto à sustentação financeira para bancar a transação, boa parte da mídia esportiva preferiu não se indispor com a massa corintiana.

A essa altura, pouco vai importar se o endividado Corinthians vai conseguir pagar os salários astronômicos de Depay – custo mensal calculado em R$ 3 milhões. Por enquanto, a badalação é toda em cima do candidato a ídolo.

A ausência de críticas contundentes só confirma que a tal preocupação com fair play financeiro é pura potoca, mero esperneio diante da ascensão do Botafogo.    

(Coluna publicada na edição do Bola desta quinta-feira, 12)