A coligação “Belém quer Mudança de Verdade”, que reúne os partidos Republicanos, Agir, Solidariedade, Democracia Cristã, Avante e PMB e tem como candidato a prefeito o deputado estadual Thiago Araújo, entrou, na tarde deste sexta-feira (16), com pedido de impugnação ao DRAP (Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários ) da coligação “União Bora Belém”, do candidato Everaldo Eguchi (foto), sob a acusação de registro irregular do Solidariedade como parte da coligação.
De acordo com a coligação “Belém quer Mudança de Verdade”, no último dia 26 de julho, a comissão provisória do Solidariedade Belém realizou convenção em que ficou decidido que o partido não lançaria candidatura majoritária e iria fazer parte da coligação “Belém quer Mudança de Verdade”, encabeçada por Thiago Araújo. O edital de convocação para a convenção havia sido publicado no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) no dia 22 de junho.
Segundo a coligação liderada pelo Republicanos, no dia 05 de agosto, último dia para a realização de convenções políticas pelo calendário eleitoral, a comissão provisória do Solidariedade foi surpreendida com a ata de uma suposta convenção em que o partido havia deliberado pela coligação com o PRTB, partido de Eguchi.
A convenção, que agora é contestada pela coligação “Belém quer Mudança de Verdade”, teria sido presidida por uma mulher de nome Allana, que se dizia presidente da comissão provisória do Solidariedade Belém. O nome de Allana, no entanto, nunca constou da composição do partido no Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP) do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O próprio Solidariedade entrou com um pedido de liminar solicitando a suspensão desta segunda ata, o que foi acatado no último dia 12 de agosto pela juíza eleitoral da 76ª Zona Eleitoral que determinou “A IMEDIATA SUSPENSÃO DA ATA FAKE OCORRIDA DIA 05 e LANÇADA NO CANDEX DIA 06/08, e PROIBINDO QUE OS REQUERIDOS REALIZEM QUALQUER ATO REFERENTE AO PARTIDO”. Ainda assim, na quinta-feira, 15/08, o PRTB registrou o DRAP da coligação em que consta o Solidariedade. O pedido de impugnação protocolado pela Coligação “Belém quer Mudança de Verdade nesta sexta-feira pede a exclusão do Solidariedade da coligação “União Bora Belém”.
Lula posa com trabalhadores readmitidos na Fábrica de Fertilizantes no Paraná, que ficou parada por 4 anos no governo do inelegível. Um governo que gera empregos oportunidades para trabalhadores é outro nível.
É um balão furado, que em breve se esvaziará. Mas é o tiro de partida para um jogo pesado, que visa repactuar a aliança com o bolsonarismo
Por Luis Nassif
A cada novo fato, mais se reforça a hipótese de que a reportagem da Folha sobre Alexandre de Moraes faz parte de uma tentativa de desestabilização do governo Lula. Ontem o jornal levantou outra “denúncia”, a de que um policial, lotado no gabinete de Moraes conseguiu informalmente dados da Polícia Civil de São Paulo.
As circunstâncias do pedido estão descritas na matéria. Moraes e sua família vinham sendo ameaçados, chantageados, através de mensagens de WhatsApp e envio de encomendas. Como conseguiram seus telefones? Porque, no banco de dados da Polícia Civil, encontrava-se a ficha do Ministro e seus familiares com todos seus dados pessoais. Ou seja, as informações partiam da base de dados da Polícia Civil paulista.
Havia um clima de conspiração explícita. Moraes estava na linha de frente, correndo riscos – ele e seus familiares – em defesa da democracia. O bolsonarismo infiltrou-se por todos os poros da República, especialmente nas polícias. Quem abriu a base de dados da Polícia aos terroristas? A chefia? Algum delegado? Algum técnico?
Aí, os brilhantes repórteres – um dos quais, Glenn Greenwald, vencedor do Prêmio Pulitzer – jogam no lixo qualquer racionalidade, qualquer presunção de isenção, e passam a exigir do Ministro o respeito às formalidades: oficiar os próprios suspeitos – a Polícia Civil paulista – e aguardar a resposta. Isso, em uma quadra da história em que terroristas ameaçavam o Ministro e seus familiares. E tudo isso ilustrado por uma foto em que Moraes parecia um monstro das fábulas.
Há várias formas de manipular a notícia. Uma é contando uma mentira. Outra é desvirtuando as conclusões.
O trabalho de Glenn é tão descabido que dois baluartes do golpismo – Ives Gandra e Janaína Paschoal – se pronunciaram, sustentando que as acusações contra Moraes não tinham nenhum fundamento.
Não se sabe até onde o jornal – e os dois repórteres – irão com essa farsa. Cada dia de vida dessa peça burlesca nunca é mais, é sempre menos na construção da reputação jornalística de ambos.
Mas é uma peça a mais a ser analisada pelo governo. É um balão furado, que em breve se esvaziará. Mas é o tiro de partida para um jogo pesado, que visa repactuar a aliança com o bolsonarismo, de olhos nas últimas jóias da coroa – Petrobrás e outras empresas públicas, que serão entregues de graça ao mercado, em caso de vitória de Tarcísio de Freitas.
Jornal adere às hordas bolsonaristas e trabalha no sentido de anular todos os processos sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes, livrando de uma vez Bolsonaro e todos os golpistas
Talvez influenciada pela morte de Delfim Netto, que trouxe ao Brasil lembranças da ditadura (ditabranda para a Folha) e do AI-5, a Folha resolveu tomar como sua a célebre frase do ministro Jarbas Passarinho no dia da promulgação do infame ato: “Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência.”
Foi o que fez a Folha ao produzir a manchete com graves insinuações contra o ministro Alexandre de Moraes: “Moraes usou TSE fora do rito para investigar bolsonaristas no Supremo, revelam mensagens”.
O “fora do rito” encaixado na manchete foi o apito de cachorro para as hordas bolsonaristas saírem do esgoto e correrem para a tribuna e os tribunais em busca da salvação do inelegível, indiciado, investigado por inúmeros crimes Jair Bolsonaro e seus asseclas, assim como todos os golpistas de 8 de janeiro.
A Folha, em parceria com o jornalista Glenn Greenwald, que depois que perdeu a mãe e o marido parece ter perdido também o rumo, produziram um pastel de vento com chumbinho — o “fora do rito” da manchete.
A reportagem mostra que o ministro do STF e o presidente do TSE na época agiam combinados, como se fossem uma mesma pessoa na época. Só que eram: o ministro do STF era Alexandre de Moraes e o presidente do TSE também.
Por serem a mesma pessoa, um sabia do que o outro estava fazendo, dos processos que estavam tocando, e por isso usaram (uso o plural porque o veneno do título trata como duas uma mesma pessoa) seus assessores, com conhecimento do Procurador Geral da República (sic), para aprofundarem investigações sobre acusados de golpe e de propagadores de fake news do gabinete do ódio — ambas investigações do TSE, presidido por Moraes, e dos processos relatados pelo ministro do STF Alexandre de Moraes.
Logo, as hordas bolsonaristas correram para o X, onde foram acolhidas com os braços abertos e uma postagem de boas vindas do dono do X e golpista Elon Musk, que escreveu em seu perfil na rede de que é dono: “This platform is being asked to censor content in Brazil where the censorship demands require us to violate Brazilian law! That is not right. Esta plataforma está sendo solicitada a censurar conteúdo no Brasil onde as exigências de censura exigem que violemos a lei brasileira! Isso não está certo.“
A Folha tratou de publicar a mensagem de Musk com novo título novamente golpista e bolsonarista: “X, de Elon Musk, divulga nova decisão sigilosa de Moraes contra bolsonaristas“.
Não, Folha, o ministro não tomou decisão contra bolsonaristas, os bolsonaristas é que tomaram decisões contrárias às leis do país e por isso estavam sendo tomadas atitudes para preservar a ordem pública.
Mas o serviço da Folha não estaria completo sem ouvir um “atingido” pela atuação “fora do rito” de Moraes, o filho do ex-presidente senador Flávio Bolsonaro. O Flávio Chocolate, das rachadinhas, da mansão milionária em Brasília, da Abin para pressionar a Receita, recebeu o seguinte título da Folha para suas acusações: “Cenas de Brasília: Flávio Bolsonaro pede a palavra no Senado para afirmar ver crime de Moraesem mensagens”.
O texto da reportagem é tão afinado com as palavras de Flávio que até parece que foi tudo escrito por ele:
“O gabinete do ministro ordenou por mensagens e de forma não oficial a produção de relatórios pela Justiça Eleitoral para embasar decisões do próprio ministro contra bolsonaristas no inquérito das fake news no Supremo durante e após as eleições de 2022”.
“É a desmoralização de um ministro do STF usando a máquina pública para perseguir aquele que ele considera adversário político, mais especificamente Jair Messias Bolsonaro. Não tem devido processo legal aqui, tem arapongagem”, disse o senador.
O parlamentar diz que o caso se trata de um atentado à democracia e passa a ler trechos da reportagem.
“Se isso for confirmado, é uma prova de interferência direta do então presidente do TSE dando ordens para prejudicar um candidato, desequilibrando a disputa presidencial. Algo que já suspeitávamos, mas se confirmado isso aqui, é a prova da interferência direta criminosa”, afirmou.
Num dia 13, não de dezembro, como no AI-5, mas de agosto, a Folha tirou a máscara e radicalizou o golpismo, com seu AI-5 particular, como a ditadura em 1968. Lá se foram de vez os escrúpulos do jornalão paulista.
A RESPOSTA DE ALEXANDRE DE MORAES
“O gabinete do ministro Alexandre de Moraes esclarece que, no curso das investigações do Inquérito (INQ) 4781 (Fake News) e do INQ 4878 (milícias digitais), nos termos regimentais, diversas determinações, requisições e solicitações foram feitas a inúmeros órgãos, inclusive ao Tribunal Superior Eleitoral, que, no exercício do poder de polícia, tem competência para a realização de relatórios sobre atividades ilícitas, como desinformação, discursos de ódio eleitoral, tentativa de golpe de Estado e atentado à Democracia e às Instituições”, inicia o comunicado.
Em seguida, o comunicado afirma que “os relatórios simplesmente descreviam as postagens ilícitas realizadas nas redes sociais, de maneira objetiva, em virtude de estarem diretamente ligadas às investigações de milícias digitais. Vários desses relatórios foram juntados nessas investigações e em outras conexas e enviados à Polícia Federal para a continuidade das diligências necessárias, sempre com ciência à Procuradoria Geral da República. Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria Geral da República”.
Repórter Brasil segue a agenda de ex-secretário do governo Bolsonaro para investigar a ascensão da banda truculenta do agro na Amazônia
Porretes vendidos em posto de gasolina no entroncamento entre a BR-163 e a Transamazônica, em Itaituba (PA). (Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil)
Transcrito do Repórter Brasil
DE MATO GROSSO E PARÁ – Ao longo da BR-163, é comum encontrar facas com a mensagem “Agro é top” cravada na lâmina. No entroncamento com a Transamazônica, em Itaituba (PA), dezenas de caminhões carregados de soja esperam em um posto de gasolina, enquanto no caixa vendem-se porretes com as inscrições “Respeito”, “Diálogo” e “Direitos Humanos”.
Essa é a “estrada da soja”, uma das vias mais importantes para o agronegócio na Amazônia. Liga o “nortão” de Mato Grosso aos portos do rio Tapajós, no sul do Pará. Enormes silos de grãos e centenas de bois confinados em abatedouros margeiam a rodovia.
Mas facas e porretes também fazem parte da paisagem. Há bandeiras do Brasil sobre as porteiras, outdoors em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e propagandas de clubes de tiro. Uma delas combina a imagem do político com o verde-amarelo patriota. O patrocínio é do Clube de Tiro de Sorriso (MT), cidade que mais planta soja no país. “Um povo armado jamais será escravizado”, diz a mensagem ao lado de um Bolsonaro carrancudo.
A Repórter Brasil percorreu mais de 6.000 quilômetros, principalmente em estradas de terra, para investigar o lado truculento do agronegócio e seus laços com o bolsonarismo. Essa aliança encontrou solo fértil na Amazônia, onde parte da elite local está envolvida com grilagem de terras, desmatamento ilegal e milícias rurais, e obteve no governo Bolsonaro interlocução para suas demandas. Essa investigação foi feita com apoio do Rainforest Investigation Network do Pulitzer Center.
A rota foi baseada na agenda de encontros de uma figura proeminente do chamado “agrobolsonarismo”: o ex-secretário especial de Assuntos Fundiários Luiz Antonio Nabhan Garcia. Homem de confiança do ex-presidente e um dos principais expoentes da União Democrática Ruralista (UDR), entidade linha-dura do agro, Nabhan Garcia teve papel decisivo na paralisação da reforma agrária nos quatro anos do mandato de Bolsonaro.
Entre audiências de gabinete e viagens, os 610 compromissos oficiais de Nabhan revelam como ele abriu as portas de Brasília para políticos e produtores rurais acusados de ataques aos povos do campo, como um conhecido fazendeiro de Anapu (PA) investigado por esconder o assassino da missionária norte-americana Dorothy Stang, executada em 2005.
Nabhan também recebeu produtores multados por desmatamento e flagrados por trabalho escravo. Alinhou-se ainda a empresários investigados por financiar a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, como Antônio Galvan, ex-presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), e outros indiciados de Novo Progresso, Xinguara, Marabá e Redenção, também no Pará.
Durante os quatro anos no cargo, o secretário de Bolsonaro buscou facilitar a vida de empresários acusados de violações. Em discurso a sojeiros de Mato Grosso encrencados na Justiça por apropriação indevida de terras públicas, por exemplo, disse ser possível “regularizar o que está irregular, às vezes”, como vai mostrar a segunda reportagem deste especial.
Já contra os sem-terra, indígenas e quilombolas, Nabhan encampou um discurso belicoso. Em tese, essas populações deveriam ser atendidas por sua secretaria, mas foram tratadas como “invasoras de terras” e deixaram de ser recebidas pelo governo.
“Não vou aceitar viés ideológico de quem invade propriedade. O Brasil não é uma republiqueta. Quem invade propriedade comete crime”, disse Nabhan à Repórter Brasil em 2019, após ser questionado sobre como seria a interlocução do então governo com esses grupos.
Entrevistado novamente por telefone no início de agosto, Nabhan afirmou que cabe aos produtores rurais avaliarem o seu trabalho ao longo do governo Bolsonaro: “O produtor rural é quem paga a conta de tudo, quem paga a conta do governo. Quem avalia é ele”.
Ao ser informado de que a série de reportagens também vai trazer críticas sobre a política de reforma agrária em sua gestão, ele rebateu: “Não estou preocupado com quem critica ou deixa de criticar”.
Nabhan não ouviu as outras questões. Disse que precisava trabalhar e desligou o telefone. A reportagem ligou novamente, mas ele não atendeu. Foram enviadas oito perguntas detalhadas sobre esta investigação, mas ele não respondeu. Confira aqui a íntegra.
Do faroeste paulista para Brasília
Nabhan Garcia está longe de ser um formulador de políticas públicas. Técnico em zootecnia e agropecuária, mas sobretudo pecuarista e latifundiário, ele ocupou o cargo devido ao histórico à frente da UDR. A organização foi criada em 1985, no interior paulista, para se contrapor ao avanço do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Nessa época, Nabhan teve seu nome envolvido em ataques a trabalhadores sem terra do Pontal do Paranapanema, extremo oeste de São Paulo. Ele foi acusado por um fazendeiro, em depoimento à Polícia Federal, de participar da contratação e do treinamento de pistoleiros que feriram oito sem-terra a bala em 1997, durante ação da entidade para desocupar uma fazenda em Sandovalina (SP).
Nabhan, porém, não virou réu na Justiça. A denúncia chegou até a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Terra (CPMI da Terra), instalada em 2003. Um primeiro relatório da comissão chegou a pedir o indiciamento de Nabhan e de outros fazendeiros pelos crimes, mas a articulação política de deputados da bancada ruralista conseguiu alterar o documento final e livrá-lo.
Expoente do agronegócio na política, Nabhan Garcia fez carreira como líder da União Democrática Ruralista, a entidade linha-dura no combate ao MST (Foto: Reprodução/Redes sociais)
Ao longo dos 30 anos de presidência da UDR, Nabhan se aproximou do então deputado federal Jair Bolsonaro. “Desde quando o Bolsonaro entrou no Congresso, eu acompanho ele que, mesmo não sendo produtor rural, sempre defendeu o setor produtivo”, afirmou Nabhan naquela entrevista à Repórter Brasil
Foi ele quem abriu a porteira do agronegócio para o ex-presidente, percorrendo feiras e exposições agropecuárias nas eleições de 2018. A primeira viagem oficial daquela campanha foi um tour pelo interior paulista, iniciado em Presidente Prudente (SP), região de Nabhan, com desfecho na Festa do Peão de Barretos (SP).
A amizade com Bolsonaro fez seu nome ser cogitado para ministro da Agricultura do novo governo, mas Nabhan foi preterido pela bancada ruralista do Congresso, a quem costumava criticar, acusando-a de se preocupar mais com as grandes empresas do agronegócio do que com os produtores rurais.
Restou-lhe a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários e a simbólica posição de “vice-ministro da Agricultura” – inexistente na burocracia estatal, mas exibida em seu cartão de visitas e em audiências Brasil afora.
Com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sob seu controle, Nabhan Garcia escreveria um novo capítulo da reforma agrária no país, colocando a política fundiária a serviço do Ministério da Agricultura, algo que só havia ocorrido durante a ditadura militar (1964-85) e no governo do ex-presidente José Sarney (1985-89).
O fim da reforma agrária
Na primeira semana de governo, o Incra paralisou a reforma agrária, congelando todos os processos de compra e desapropriação de terras. Era um sinal do que seriam os quatro anos seguintes.
Pela primeira vez no século, o Incra deixou de comprar áreas para a reforma agrária, o que ocorreu efetivamente nos anos de 2021 e 2022 – um dos fatores para agravamento dos conflitos no campo.
Houve corte de quase 40% nos gastos da autarquia, que caíram de R$ 2,8 bilhões para R$ 1,7 bilhão, entre 2018 e 2022, segundo a plataforma Siga Brasil. O governo também reduziu investimentos na agricultura familiar, que atingiu os menores patamares em 2020 e 2021, segundo a mesma fonte de dados.
“Ele foi escolhido a dedo para o cargo, pois era explicitamente contra a reforma agrária e os movimentos sociais, e Bolsonaro assumiu dizendo que os sem-terra eram inimigos e precisavam ser combatidos”, analisa o professor da USP Adalmir Leonidio, que pesquisou a violência fundiária no Pontal do Paranapanema.
Na gestão de Nabhan Garcia, a reforma agrária foi reduzida a um programa de distribuição de títulos de propriedade. O foco passou a ser a regularização fundiária, em detrimento da criação de novos assentamentos. “Esse programa é um retrocesso, pois coloca as terras públicas no mercado e facilita a concentração fundiária [por fazendeiros]”, avalia a presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), Yamila Goldfarb.
Vozes silenciadas: atacados pelo agronegócio, camponeses são ameaçados e vítimas de despejos ilegais. Sem amparo das forças de segurança, não podem mostrar o rosto, pois sentem medo (Fotos: Fernando Martinho/Repórter Brasil)
O ‘ogronegócio’ vai a Brasília
A chegada de Nabhan Garcia ao Planalto tem ainda outro elemento: a ascensão do Movimento Brasil Verde e Amarelo no agronegócio brasileiro.
Criado como frente de oposição ao segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), a articulação ganhou força durante o processo de impeachment e se alinhou a Jair Bolsonaro nas eleições de 2018, explica o antropólogo Caio Pompeia, autor do livro “A formação política do agronegócio” (Editora Elefante, 2021).
Um de seus principais líderes era Antônio Galvan, acusado de financiar a tentativa de golpe de estado contra o governo Lula em 8 de janeiro de 2023 – e “amigo particular” de Nabhan. Procurado pela Repórter Brasil, Galvan não retornou os contatos.
Antes de Bolsonaro chegar ao poder, Galvan e Nabhan mobilizaram fazendeiros e pecuaristas descontentes com as elites do agro, por se sentirem rejeitados por elas, avalia Pompeia.
Segundo o pesquisador, Bolsonaro viu nesse grupo marginal uma oportunidade de apoio político. Uma vez no governo, o ex-presidente encampou pautas que agradavam esses fazendeiros, como a redução de impostos rurais e a flexibilização das políticas ambientais. A esse grupo Pompeia dá o nome de “agrobolsonarismo”.
Já as elites do agronegócio, por outro lado, representadas por associações como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), mantiveram uma postura mais pragmática, segundo Pompeia, negociando pauta a pauta com o governo de extrema direita.
Fachada de comércio e clube de tiro em Marabá, no sul do Pará. Registros de armas de fogo triplicaram no estado entre 2017 e 2022, segundo a PF (Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil)
Quem definiu as diferenças entre esses dois grupos do agro de maneira menos sutil do que “agrobolsonarismo” foi a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Durante audiência na Câmara dos Deputados em maio de 2023, ela disse que o governo iria apostar na transição para agricultura de baixo carbono para tirar o agronegócio brasileiro da condição de “ogronegócio”.
Um deputado reagiu, disse que a ministra estava desrespeitando os produtores rurais com o termo ogro (monstro) e que a ministra queria somente “lacrar”. “Eu sou uma mulher preta, pobre, que chegou aqui porque ralou muito, não porque lacrou”, respondeu a ministra.
O termo já havia sido usado anteriormente pelo diretor do Instituto Socioambiental (ISA), Márcio Santilli, que já foi presidente da Funai e deputado federal.
“Pensei nessa expressão para fazer um contraponto com o agronegócio, que em seu cerne não tem vinculação com expansão da fronteira agrícola, desmatamento e invasão das terras públicas. O ogro é uma parte do agronegócio que cumpre essa função”, explica Santilli.
Esta reportagem teve apoio da Rainforest Investigations Network, do Pulitzer Center.