Bolsonaro e aliados começam a cumprir pena de prisão por tentativa de golpe contra a democracia

Decisão finaliza julgamento da trama golpista; ex-presidente vai permanecer na Superintendência da Polícia Federal, onde está preso desde sábado

Do Opera Mundi

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decretou o início do cumprimento da pena de prisão para o ex-presidente Jair Bolsonaro, que foi condenado a 27 anos e três meses de prisão em regime inicialmente fechado por tentativa de golpe de Estado. Ele vai permanecer na Superintendência da Polícia Federal, em Brasília, onde está preso desde sábado (22/11).

O cumprimento da pena ocorre após o STF declarar o trânsito em julgado da ação penal. Isso significa que os réus já esgotaram todos os recursos disponíveis dentro da Corte. Bolsonaro foi condenado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição do Estado Democrático, golpe de Estado, dano qualificado pela violência, grave ameaça contra patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

O ex-presidente já está preso preventivamente na Superintendência da Polícia Federal na capital brasileira desde a manhã do último sábado. De acordo com a corporação, Bolsonaro tentou romper a tornozeleira eletrônica. Moraes havia determinado o uso do equipamento no âmbito da investigação sobre a tentativa de obstrução do julgamento da trama golpista, com a ajuda de seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos Estados Unidos.

Além do ex-presidente, Moraes decretou o trânsito em julgado para o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Anderson Torres e para o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ). O ministro também determinou o início do cumprimento das penas de Mauro Cid, Walter Braga Neto, Anderson Torres, Almir Garnier, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Alexandre Ramagem.

REPERCUSSÃO INTERNACIONAL

“O momento tão aguardado por ativistas de esquerda brasileiros e familiares de vítimas do coronavírus chegou”, escreveu, nesta terça-feira (25/11), o jornal El País sobre o início da pena de 27 anos de prisão por Jair Bolsonaro por “liderar uma conspiração golpista”. O periódico espanhol que o ex-presidente brasileiro “está agora tecnicamente preso, mas sem sair um centímetro da cela onde está detido em Brasília”.

Ao dar destaque aos “problemas gastrointestinais” de Bolsonaro, a publicação afirmou que o ex-presidente cumprirá pena no local “levando em conta sua idade e saúde frágil”, consideradas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), — órgão classificado pelo jornal como um “grande defensor da democracia”.

Segundo o El País, “se Bolsonaro cumprisse toda a sua pena na prisão, seria libertado após quase 100 anos [de idade]”, detalhando que, segundo o direito penal brasileiro, o ex-presidente deve cumprir pelo menos 25% ou seis anos em regime fechado. Após esse período, teria “permissão para trabalhar”, mas está “está impedido de concorrer a cargos públicos desde 2023”, escreveu, lembrando de sua inexigibilidade.

“Seu afastamento da vida pública e o silêncio imposto pelo juiz o enfraqueceram politicamente. Os esforços de seus filhos e de seu partido para aprovar uma lei de anistia ou uma redução de pena no Congresso — que o livraria da prisão ou ao menos diminuiria sua punição — fracassaram até agora”, analisou ainda.

Para o El País, nem a “formidável pressão exercida pelo presidente [dos Estados Unidos] Donald Trump, na forma de ameaças, tarifas e sanções econômicas contra juízes, não conseguiu salvar seu aliado e impedi-lo de ser responsabilizado por tentar subverter a ordem constitucional”

De acordo com a publicação, “as instituições brasileiras demonstraram notável resiliência diante das ameaças e agressões do político mais poderoso do mundo”.

francês Le Monde afirmou que Bolsonaro começou a cumprir sua sentença, tornando “definitiva sua condenação” após “esgotar todos os recursos cabíveis contra sua condenação”.

“O ex-capitão do Exército, que mobilizou os conservadores brasileiros para se tornar presidente em 2019 e remodelou a política do país, agora terá que cumprir uma longa pena de prisão”, escreveu o jornal.

Qual era o plano de fuga de Bolsonaro?

Pista de pouso vizinha ao condomínio de Bolsonaro, controlada pela família de Nelson Piquet, pode entrar no radar da PF como possível peça de plano do ex-presidente.

Por Paulo Motoryn, em Cartas Marcadas

Na edição desta semana, não podemos falar de outra coisa que não a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro após a tentativa de violação da tornozeleira eletrônica. Como você já sabe, a avaliação enviada pela Polícia Federal ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, apontou risco concreto de fuga e levou à ordem de detenção imediata.

A decisão se baseou no entendimento de que Bolsonaro já não estava sob controle suficiente das medidas cautelares e que havia, sim, indícios de preparo para escapar.

Desde sábado, dediquei minhas horas a investigar quais poderiam ser os possíveis planos de fuga do ex-capitão. Não por especulação, mas porque essa pergunta passou a orientar também o trabalho da PF.

Que caminhos reais estavam ao alcance imediato de Bolsonaro? E que estruturas poderiam ser usadas em uma eventual tentativa de evasão?

Vamos aos fatos.

Durante o esforço de apuração desta reportagem, descobri que a própria Polícia Federal passou a reexaminar informações para tentar reconstruir o que poderia ter sido um plano de fuga. Entre essas pistas, estavam informações idênticas a de um relato que chegou até mim em agosto de 2025.

Na ocasião, uma moradora do condomínio de Bolsonaro, o Solar de Brasília, no bairro do Jardim Botânico, disse que vizinhos temiam que um aeródromo privativo da família Piquet, a menos de 200 metros do condomínio, fosse cogitado como peça de um plano de fuga.

À época, procurei integrantes da PF para tentar confirmar a possibilidade e ouvi, de uma fonte do departamento, um categórico: “Chance zero”. O assunto morreu ali.

Com a prisão consumada e a suspeita de que a vigília bolsonarista na porta do condomínio pudesse servir para criar tumulto e atrasar uma ação policial para deter a fuga, a hipótese reapareceu na mesa.

Desta vez, não como fofoca de vizinhança, mas como elemento considerado pela própria PF. A mesma fonte do Departamento de Inteligência Policial, que antes havia negado a chance de uma fuga pela pista dos Piquet, confirmou que o aeródromo “entrou no radar” da corporação após o episódio da tornozeleira.

A PF, inclusive, estaria estudando diligências no local, levantamento de imagens e a eventual oitiva do proprietário, Geraldo Piquet Souto Maior, irmão de Nelson Piquet, tricampeão mundial da Fórmula 1 e aliado de primeira hora de Bolsonaro.

A pista de pouso e decolagem em questão, chamada simplesmente de Piquet, é registrada na Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac, como aeródromo privado e localizado na borda do condomínio de Bolsonaro, imediatamente atrás da antiga Hípica Lago Sul, terreno que pertenceu à família Piquet até 2016.
Segundo documentos oficiais da ANAC e imagens de satélite consultadas pela reportagem, trata-se de uma pista asfaltada de 590 metros de comprimento por 18 metros de largura, com autorização para operação visual diurna e noturna, equipada com iluminação de borda e farol de aeródromo.

A pista é adequada para monomotores e bimotores leves, comuns na aviação executiva privada, e plenamente operacional para helicópteros, que independem de extensão para decolagem.
Para a fonte ouvida pela reportagem, a combinação da capacidade para aeronaves discretas, a operação regular e a proximidade inferior a 200 metros do condomínio tornam o aeródromo relevante em um cenário de possível evasão.
O responsável pela pista, Geraldo Piquet, mantém uma longa trajetória como piloto. Em entrevista publicada por uma revista especializada, ele conta que pilota “diferentes aeronaves”, inclusive jatos, e que sempre buscou “testar limites” para sentir a liberdade durante os voos.
As redes sociais de Geraldo reforçam essa identidade: vídeos mostram acrobacias sobre Brasília, voos de helicóptero e pousos e decolagens que parecem ocorrer na própria pista Piquet.
Esse repertório, somado ao histórico aeronáutico da família e à localização estratégica da pista em relação ao Solar de Brasília, explica o interesse renovado da PF em verificar a hipótese.
Questionei Geraldo Piquet sobre a possibilidade de uso do aeródromo em um eventual plano de fuga e se ele havia sido procurado por autoridades policiais nas últimas horas. Até o momento, não houve resposta. Também pedi uma nota oficial à PF, mas não tive retorno.
A relação entre Bolsonaro e Nelson Piquet é digna de nota. A visita do ex-piloto ao ex-presidente durante a prisão domiciliar, em 5 de novembro, autorizada por Alexandre de Moraes, reforça a hipótese.
Nos últimos anos, Piquet foi um dos mais visíveis apoiadores de Bolsonaro, dirigindo o Rolls-Royce presidencial no 7 de Setembro e participando de manifestações públicas em sua defesa.
Por ora, não há qualquer prova de que Bolsonaro tenha utilizado o aeródromo ou de que alguma movimentação real tenha sido feita em direção à pista. A apuração busca esclarecer se a estrutura chegou a ser cogitada, mesmo que informalmente, como rota de fuga.
As próximas etapas podem incluir análise de imagens, varredura de registros, inspeção técnica da pista e a oitiva de Geraldo Piquet, caso haja avanço para diligências formais.

Com raça, paixão e fé

POR GERSON NOGUEIRA

A festa continua rolando em todas as cidades paraenses e em outras paragens também. Poucas vezes se viu tanto entusiasmo e alegria nas ruas partindo de torcedores do Clube do Remo. O motivo é mais do que justo: o acesso à elite do futebol brasileiro. Por força de uma campanha memorável, o Leão está de volta ao topo.

No jogo de domingo, no Mangueirão, o enredo foi tão meticulosamente construído que pareceu obra de roteirista de cinema dos bons, com direito a pausas de suspense e emoção, momentos de aflição e a redenção final, com direito à expectativa pelo resultado do jogo Cuiabá x Criciúma.

Nem o torcedor mais fanático e pacheco conseguiria criar um desfecho tão espetacular. O hino diz que “em cada um de nós mora a esperança”, mas esse grau de confiança foi testado no limite em vários momentos do campo. Por isso mesmo, o júbilo pelo acesso extrapolou os limites do Pará e saiu mundo afora, despertando aplausos e admiração sincera.

A grande mídia nacional, sempre tão indiferente ao que acontece na parte superior do mapa, despertou finalmente para o Remo. Quarto colocado na Série B, coube ao Leão o tratamento mais caprichado nas matérias e comentários das emissoras de TV e canais de internet, justamente porque a história mais bonita e comovente é a azulina.

Com todo respeito a Coritiba, Athlético-PR e Chapecoense, também muito merecedores do acesso, nada é comparável ao que se passou com o Remo, e não me refiro só às últimas semanas. A história do clube é um tributo à capacidade de sobrevivência e de dar a volta por cima. Não há dúvida: a grande notícia do fim de semana é o renascimento do Leão.

O Remo já esteve sem divisão, frequentou a Série D, passou poucas e boas no limbo do futebol, disputando partidas em campinhos de areia e lama, com bandeiras de escanteio demarcadas por sacos plásticos. Todas essas provações tornam mais grandioso o atual momento de glória.

O Remo está na Série A do Campeonato Brasileiro por merecimento, quase uma reparação histórica para uma torcida resiliente e apaixonada, uma das maiores nações do futebol no Brasil, que em todos os jogos aprendeu a pedir apenas que os jogadores honrem a camisa com raça, paixão e fé.

Sim, a fé é fundamental e necessária. Foi pelos braços fervorosos de torcedores e atletas que a Santinha peregrinou por estádios de todo o Brasil nesta Série B, atestando a profunda religiosidade de um povo.

Belém tem fissura por futebol e devoção pela santa padroeira. Esses caminhos se encontraram na campanha magnífica que o Remo fez neste ano. Sagrado e profano lado a lado, como no Círio de Nazaré. (Foto 1: Samara Miranda/Ascom CR; fotos 2 e 3: Agência Pará)

Sete esteios da longa marcha rumo ao topo

Alguns jogadores se destacaram por rendimento, entrega e comprometimento na campanha do Remo, em nível acima dos demais atletas do elenco. Em primeiríssimo plano, acima de todos, aparecem dois nomes de grande importância para a conquista: Pedro Rocha e Marcelo Rangel. Duas verdadeiras instituições azulinas.

Pedro Rocha foi o melhor jogador do campeonato e o principal artilheiro, com 15 gols marcados. Ninguém exemplifica melhor a sinuosa trajetória do Leão do que o camisa 32. Ele iniciou bem, como todo o time, sob o comando de Daniel Paulista.

Caiu de rendimento quando o comandante era Antônio Oliveira e renasceu com Guto Ferreira, tornando-se mais decisivo ainda. Gols de valor inestimável, como o primeiro da partida com o Goiás, que reabriu as esperanças e sacudiu a massa no Mangueirão.

Marcelo Rangel foi outro pilar, garantindo lá atrás vitórias importantes. O melhor goleiro da Série B foi sempre preciso e econômico, sem firulas ou brilharecos desnecessários. Viveu momentos de aflição, após a lesão no joelho que o deixou fora de combate por duas semanas.

Quando ninguém imaginava que poderia voltar ao gol azulino, pois a previsão era de um tratamento de dois a três meses, ele se ergueu e voltou a campo, a tempo de garantir segurança ao sistema defensivo do Leão.

Além de ambos, é justo destacar também Caio Vinícius, Klaus, Nico Ferreira, Diego Hernández e João Pedro. A reinvenção de Caio Vinícius é um dos milagres operados por Guto Ferreira, que mudou o posicionamento do volante, transformando-o em um atacante improvável em vários jogos.

Na zaga, Klaus brilhou pela regularidade. Impecável no jogo aéreo, aplicado nos lances de chão, ele foi um dos responsáveis pela boa performance da defesa remista – o Remo é um dos três times que menos perderam, com somente oito derrotas na competição.

Os uruguaios Nico e Hernández precisaram de tempo para pegar ritmo e condicionamento, mas, quando isso ocorreu, tornaram-se peças imprescindíveis na equipe. Hernández brilhou nas cobranças de falta. Nico pontificou com aplicação e disciplina tática.

Por fim, é preciso falar de João Pedro, transformado em herói na apoteótica jornada final diante do Goiás. Com poucos e importantes gols, como na vitória sobre o Cuiabá, o centroavante português (nascido em Guiné Bissau) provou sua importância com os gols que levaram o Remo à elite. 

(Coluna publicada na edição do Bola desta terça-feira, 25)