O agro é publi: gigantes do agronegócio pagam personalidades brasileiras antes da COP30

JBS, MBRF e Minerva bancam influenciadores em propagandas sobre carne; campanhas foram mais intensas às vésperas da COP

Por TJ Jordan, Akhil Ranjan, Rachel Sherrington, Clare Carlile, DeSmog | Edição: Matthew Green, Emily J Gertz | Colaboração: Ellen Ormesher, Bruno Fonseca, Maria Martha Bruno

Empresas do agronegócio mobilizaram um exército de influenciadores e personalidades nas redes sociais antes da COP30, que termina nesta semana em Belém. Pelo menos 195 influenciadores brasileiros, entre modelos, apresentadores de TV, médicos famosos e ativistas de direita, publicaram conteúdos patrocinados por dez das maiores empresas de carne, fertilizantes e alimentos do mundo nos 12 meses que antecederam a COP30.

O número é mais de duas vezes maior que os 80 influenciadores patrocinados no mesmo período há um ano, segundo análise da organização de jornalismo internacional DeSmog, que a Agência Pública publica em parceria. Juntos, estes influenciadores têm milhões de seguidores no Instagram.

As publicações incluíam afirmações sobre os benefícios da carne para a saúde, esquetes de humor sobre a vida no campo e vídeos com músicas promovendo nuggets de frango e hambúrgueres.

O cantor pernambucano João Gomes é uma das personalidades recrutadas pelas empresas do agronegócio: ele publicou em março um vídeo em que aparece cantando e dançando ao lado de saxofonistas, depois de comer um hambúrguer bovino da Maturatta, marca da JBS. Ele tem 16,6 milhões de seguidores no Instagram.

Gomes e os demais mencionados na apuração foram procurados nas suas redes sociais para comentar. As respostas estão incluídas na reportagem.

A médica e atleta amadora Dra. Luciana Haddad também exaltou as virtudes da carne bovina, dizendo a seus 125 mil seguidores no Instagram que estava criando “conteúdo baseado em ciência” para a empresa Minerva. Ela afirmava: “No meu caso, a carne sempre foi essencial para a recuperação e o desempenho!”.

Quando procurada para comentar, Haddad respondeu por e-mail que “toda parceria que faço com empresas tem o mesmo objetivo: ampliar o diálogo e levar informação de qualidade sobre o que realmente importa para o bem-estar… com a Minerva, meu conteúdo é focado exclusivamente na minha área de atuação, ou seja, saúde.”

No festival de música The Town, realizado em setembro na cidade de São Paulo, a influenciadora de moda Bruna Biancardi publicou um vídeo abrindo sua bolsa de grife e mostrando produtos de frango frito da Seara, marca da JBS, com a legenda: “@searabrasil me convidou para mostrar o que eu levo na bolsa nos dias de festival.” Biancardi tem 14,5 milhões de seguidores.

Também no festival, a apresentadora Fátima Bernardes recebeu mais de 100 mil curtidas em um vídeo publicado para seus 13 milhões de seguidores, usando uma air fryer para preparar nuggets de frango da Seara.

O próprio festival esteve envolvido nas ações de marketing de empresas ligadas à COP30: o The Town, junto ao Rock In Rio e empresas como a Vale patrocinaram um show às vésperas da COP que contou com artistas paraenses como Dona Onete, Gaby Amarantos e Joelma, além da cantora dos EUA Mariah Carey. O show, realizado em cima de um palco que imitava uma vitória régia, aconteceu numa área protegida que enfrenta erosão, turismo predatório e ausência do Estado. Reportagem da Pública com a Carta Amazônia mostrou que, fora dos holofotes, a Ilha do Combu está ameaçada justamente pelas mudanças climáticas e problemas socioambientais que a COP30 tenta resolver.

Muitos influenciadores usaram sua reputação ou expertise para associar os produtos das empresas à cultura pop ou reforçar seus supostos benefícios à saúde e ao bem-estar, em vez de abordar diretamente questões ambientais ou climáticas.

Segundo ativistas de clima, ao se associarem a celebridades brasileiras, os gigantes do agronegócio buscam desviar a atenção pública de suas crescentes emissões e evitar pressões para reduzir o consumo de carne, em favor de dietas à base de plantas, menos nocivas ao planeta.

A agricultura é responsável por cerca de um terço dos gases de efeito estufa que impulsionam o aquecimento global, enquanto a pecuária industrial e o desmatamento para cultivo de ração, como a soja, são as principais causas de destruição florestal, inclusive na Amazônia.

“Esse aumento [no uso de influenciadores] não é uma surpresa: ele reflete a nova estratégia das grandes corporações de legitimar suas ações e fortalecer sua reputação. Elas apostam em uma forma de comunicação mais humana e próxima, que se conecta com o público e influencia diretamente seus estilos de vida”, afirmou Eva Morel, secretária-geral do think tank de mídia francês QuotaClimat, que publicou em outubro um relatório sobre desinformação climática na mídia brasileira.

“O volume em si, no entanto, é preocupante e exige uma vigilância maior por parte dos formuladores de políticas públicas”, acrescentou Morel.

A Petrobras também recorreu às redes sociais antes da COP30, contratando um grupo de sete influenciadores da Geração Z nas áreas de ciência, clima e cultura para produzir conteúdos que apresentem a petroleira como uma campeã da energia limpa, segundo reportagem da Pública de setembro.

Postagem da Bayer, produtora de agrotóxicos, sobre a COP30

Para as dez empresas do agronegócio analisadas, o DeSmog baseou a pesquisa em conteúdos patrocinados ou de marca publicados no Instagram, coletados a partir da biblioteca de anúncios da Meta, empresa controladora do Instagram. O DeSmog também fez buscas manuais para identificar publicações patrocinadas que não estavam listadas na biblioteca de anúncios.

As empresas incluídas no levantamento foram: JBS, multinacional brasileira e maior produtora de carne do mundo; as também brasileiras MBRF e Minerva Foods; as gigantes globais de sementes e pesticidas Bayer, Corteva e Syngenta; a multinacional europeia de fertilizantes Yara; e as companhias norte-americanas de commodities agrícolas ADM, Bunge e Cargill.

Essas empresas foram selecionadas para representar toda a cadeia global de produção de alimentos, de produtores de insumos — como sementes, produtos químicos e fertilizantes — a processadores e exportadores de carne que abastecem mercados no Brasil e no exterior. Elas estão no centro de um modelo industrial de agricultura que gera quantidades crescentes de gases que causam efeito estufa, incluindo metano emitido pelo gado e dióxido de carbono produzido na fabricação de fertilizantes à base de combustíveis fósseis, que também podem liberar óxido nitroso poluente ao serem aplicados no solo.

A JBS, MBRF e Minerva foram responsáveis pelo maior volume de conteúdo com os influenciadores, representando três quartos das cerca de 200 parcerias identificadas.

No entanto, o maior aumento no uso de influenciadores foi registrado entre as europeias Bayer e Syngenta, do setor de pesticidas, e as norte-americanas Cargill e Bunge. Essas quatro empresas passaram de quase nenhuma ação com influenciadores no Brasil para um total combinado de 44 parcerias nos últimos 12 meses.

No geral, sete das dez empresas ampliaram o uso de influenciadores no último ano em comparação com o período anterior. As produtoras de fertilizantes Yara e Corteva, e a comerciante de grãos ADM, reduziram levemente ou não realizaram parcerias com influenciadores nos últimos dois anos.

A Syngenta afirmou que trabalha com influenciadores para “manter a relevância junto aos nossos públicos” e que “investir na produção de informação de qualidade contribui para o fortalecimento da ciência e da inovação em todas as áreas — especialmente na agricultura”.

A Yara se recusou a comentar. A JBS pediu mais informações sobre as propagandas citadas. As outras sete empresas não responderam aos pedidos de resposta.

Minerva Foods, que patrocinou influencers brasileiros, tem uma área dentro da COP30

Ativistas do clima afirmam que, ao se associarem a celebridades brasileiras, os gigantes do agronegócio buscam desviar a atenção do público de suas emissões crescentes e afastar as pressões para reduzir o consumo de carne em favor de dietas à base de plantas, que causam um impacto muito menor na saúde humana, no clima e no meio ambiente.

Um estudo de 2024 realizado por pesquisadores de saúde pública da Universidade de São Paulo (USP) descobriu que as quantidades excessivas de carne vermelha consumidas diariamente pela pessoa média no Brasil já estão aumentando os riscos de doenças como câncer, diabetes e enfermidades cardiovasculares, e excedem em muito a “dieta da saúde planetária”, recomendada pela Comissão EAT-Lancet para sistemas alimentares saudáveis, sustentáveis e justos, que aumenta o consumo de alimentos de origem vegetal e reduz o de proteínas de origem animal.

Segundo a atualização revisada por pares da EAT-Lancet, publicada em outubro de 2025, as emissões que aquecem o clima provenientes da agricultura cairiam cerca de 15% se o consumo global de carne, gorduras saturadas, açúcar e sal diminuísse, enquanto as mortes relacionadas à nutrição cairiam em torno de 15 milhões por ano — o equivalente a salvar mais de 41 mil vidas por dia. Esses impactos seriam ainda maiores se as mudanças relacionadas à alimentação fossem além das dietas, observou a EAT-Lancet: “Uma transformação nos sistemas alimentares é fundamental para solucionar as crises relacionadas ao clima, à biodiversidade, à saúde e à justiça”.

ESTRATÉGIA DIGITAL REFORÇA IMAGEM DO AGRO

Como país-sede da COP30, o Brasil colocou como um dos principais objetivos da conferência a “transformação da agricultura e dos sistemas alimentares”.

Do outro lado do balcão, o setor do agronegócio enviou centenas de lobistas e patrocina eventos para defender a tese de que a indústria pode enfrentar a crise climática com ajustes pontuais em seus negócios, em vez de adotar as mudanças estruturais profundas que cientistas do clima apontam como essenciais para reduzir drasticamente as emissões.

As grandes empresas de carne e agroquímicos têm usado táticas que incluem minimizar o impacto climático da indústria, defender soluções tecnológicas pouco confiáveis e argumentar que regulações obrigatórias ameaçam a saúde e a prosperidade humanas (confira as narrativas do agronegócio nas negociações).

Segundo uma pesquisa publicada em julho de 2024 pela Universidade Federal do Pará (UFPA), sete em cada dez brasileiros têm uma visão positiva do agronegócio. Muitos dos influenciadores contratados pelas empresas analisadas pelo DeSmog estão entre as figuras mais populares da cultura pop brasileira, pagos tanto para promover produtos específicos, como hambúrgueres e nuggets, quanto para se conectar com comunidades online segmentadas.

O educador físico e apresentador de TV Márcio Atalla apareceu em um vídeo de fevereiro patrocinado pela Minerva, no qual afirmou aos seus 1,1 milhão de seguidores que a carne “é uma excelente fonte de proteína, vitaminas e minerais, essencial para a saúde, o ganho de massa magra e até para o coração!”. Atalla acrescentou: “Confio na Minerva Foods, que garante qualidade e tem compromisso com a sustentabilidade”.

Já empresas agroquímicas como a Syngenta escolheram criadores de conteúdo populares dentro da comunidade agrícola. O canal Primos Agro, administrado por dois primos que produzem vídeos satíricos sobre a vida no campo, publicou duas vezes, em setembro e outubro, para seus 2,1 milhões de seguidores, promovendo produtos de fertilizantes da Syngenta. Os vídeos somaram 280 mil curtidas.

Embora mais raramente, alguns influenciadores falaram diretamente sobre temas ambientais e climáticos. A influenciadora do agronegócio Camila Telles, que participa frequentemente de eventos da direita e tem ligações com a Atlas Network, uma rede internacional de think tanks liberais, publicou em junho um vídeo patrocinado pela Minerva em que perguntava aos seus 455 mil seguidores: “Você sabia que a carne no seu prato pode ajudar o meio ambiente?”. No vídeo, ela descreve produções de carne de baixo carbono e pastagens que sequestrariam carbono da atmosfera.

Procurada, Telles respondeu que “as parcerias que firmo, existem justamente porque meu trabalho já é reconhecido pela abordagem séria, coerente e baseada em fatos sobre o agronegócio brasileiro. Elas não definem meu conteúdo — apenas ampliam o alcance de pautas que eu já defendo há anos, com ou sem patrocínio”. Veja a resposta completa aqui.

Alguns influenciadores chegaram a trabalhar tanto para empresas do agronegócio quanto para organizações ambientais. O comediante Fábio Cruz, que havia publicado conteúdo patrocinado pela marca de carnes Seara durante o festival The Town, em setembro, apareceu no mês seguinte em um post para o Greenpeace Brasil, vestindo uma camiseta com a frase “Respeitem a Amazônia”.

MARCAS AUMENTARAM ANÚNCIOS PARA COP30

O conteúdo com influenciadores foi apenas uma das armas no arsenal digital antes da COP30. As dez empresas analisadas também publicaram anúncios pagos no Facebook (Meta), Google e LinkedIn nos meses que antecederam as negociações climáticas.

Foram veiculados mais de 6 mil anúncios direcionados ao público brasileiro no Google, incluindo cerca de 350 anúncios em vídeo, com quase metade sendo publicada nos 30 dias que antecederam a conferência.

No fim de outubro, as empresas também tinham um total de 929 anúncios ativos no Facebook e no Instagram no Brasil. Como a legislação brasileira não exige que a Meta — empresa controladora do Facebook e do Instagram — mantenha anúncios inativos em sua biblioteca de publicidade, não foi possível determinar se as empresas haviam aumentado a quantidade de anúncios nessas plataformas.

Ainda assim, a análise sugere que as empresas tiveram um foco especial no Brasil. Em 31 de outubro, fabricantes de pesticidas como Bayer, Corteva e Syngenta tinham mais anúncios ativos no Facebook e no Instagram no Brasil do que em qualquer outro país.

O Brasil é o terceiro maior usuário de pesticidas no mundo, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Assim como o conteúdo produzido por influenciadores, os anúncios geralmente evitavam abordar diretamente a questão das mudanças climáticas, mas serviam para justificar os modelos de negócios existentes das empresas, destacando os benefícios de seus produtos e serviços.

Um anúncio da Bayer afirmava: “Seguimos com a mesma missão: saúde para todos, fome para ninguém”, em referência ao seu ramo farmacêutico e ao de agroquímicos.

Um anúncio da JBS, promovendo oportunidades de emprego, convidava jovens recém-formados a se juntarem à empresa para “alimentar o mundo”.

Nos Estados Unidos, a subsidiária norte-americana da JBS fechou recentemente um acordo para encerrar um processo por publicidade enganosa movido pelo estado de Nova York. A procuradora-geral Letitia James havia processado a empresa por violar leis estaduais de proteção ao consumidor ao anunciar falsamente que zeraria suas emissões que aquecem o clima até 2040, depois que uma investigação de seu gabinete constatou que a JBS ainda não havia calculado suas emissões totais e não tinha um plano real para sustentar essa promessa.

Nos anúncios, a JBS USA “recorreu ao greenwashing e a declarações enganosas” para atender ao desejo dos consumidores por produtos ambientalmente responsáveis, afirmou o gabinete da procuradora-geral em um comunicado à imprensa — incluindo frases como: “A agricultura pode fazer parte da solução climática. Bacon, asinhas de frango e bife com emissões líquidas zero. É possível.”

A JBS concordou em pagar US$ 1,1 milhão ao estado para apoiar programas de agricultura resiliente ao clima em Nova York, mas afirmou em comunicado que sua decisão de fazer um acordo “não representa uma admissão de irregularidades”.

Ficou mais difícil, mas ainda dá

POR GERSON NOGUEIRA

A 37ª rodada não foi favorável ao Remo. O plano do acesso, que parecia bem encaminhado, de repente entrou em compasso de espera. Subir ainda é possível, mas não depende mais exclusivamente das ações do time. Para alcançar o objetivo, o Leão terá que vencer o Goiás no domingo (23, às 16h30) e torcer para que Chapecoense ou Criciúma percam seus jogos. Depender dos outros é sempre angustiante.

E angústia foi o que a torcida azulina sofreu no sábado à tarde, durante o jogo com o Avaí, disputado em Florianópolis. O Remo sofreu gol ainda no 1º tempo, em pênalti discutível. Até sofrer o gol, o time azulino fazia uma partida controlada e tinha criado as melhores chances.

Panagiotis, Diego Hernández (2 vezes) e Nico finalizaram com muito perigo antes dos 15 minutos. O goleiro Otávio, reserva escalado para o jogo pelo Avaí, era um dos melhores em campo. Apesar disso, havia um grave problema na lateral direita azulina, ocupada pelo volante Pedro Castro.

Obrigado a marcar o velocista Emerson Ramon, Castro tomou um amarelo e se lesionou antes dos 20 minutos. Foi substituído por Freitas, meia-armador improvisado de lateral. Também não deu certo. Foi em cima dele que Ramon cavou a penalidade: um choque dentro da área que resultou no gol inaugural da partida, marcado por Cléber.   

A situação de vulnerabilidade atrás era acompanhada pela ausência de criatividade no meio-de-campo. Panagiotis não conseguia produzir jogadas para os atacantes Nico Ferreira, Pedro Rocha e Diego Hernández. Lento e dispersivo, o meia errou a maioria dos passes. Caio Vinícius, que voltava ao time, também teve atuação aquém do esperado.

Sem conseguir reagir ao gol sofrido, o Remo precisou mudar. Guto Ferreira botou Nathan Pescador, Cantillo, João Pedro e Marrony. Deixou o time mais ofensivo, mas desguarnecido na marcação. Em poucos minutos, o Avaí aproveitou os espaços na zaga e chegou ao segundo gol em contra-ataque fulminante. Cléber recebeu livre diante de Marcelo Rangel.

Com trocas de passe e algumas investidas pelos lados, com Hernández e Nico, o Remo seguiu pressionando. Até que Nathan bateu em direção ao gol, Pedro Rocha desviou e João Pedro diminuiu. Pena que, dez minutos depois, o Avaí liquidou a fatura. Gol de Léo Reis em contra-ataque idêntico ao do segundo gol. Nova falha defensiva fatal.

Os erros de escalação e escolha de substitutos puniram o Remo terrivelmente, levando à primeira derrota sob o comando de Guto Ferreira. Pior ainda: o time caiu da terceira para a 6ª posição a uma rodada do final do campeonato e os pontas Hernández e Nico caíram na pilha dos adversários, sendo expulsos de campo. 

Ficou difícil, mas quem falou que seria fácil?

Técnico admite erros, mas mantém fé no acesso

Guto Ferreira tem crédito. Botou o Remo no G4 quando quase ninguém mais acreditava na possibilidade de acesso. Dito isto, é preciso admitir também que ele comete erros. E cometeu dois erros crassos contra o Avaí. Na falta de opções para a lateral direita, escolheu o volante mais lento do time, Pedro Castro. Para substituí-lo, botou Freitas, jogador que não entrava em campo há meses. Tinha Pavani, Jaderson, Kayky…

Com sinceridade, o técnico admitiu que cometeu erros. De forma genérica, mas admitiu. É uma prova de inteligência e seriedade. Disse confiar no acesso, e passa confiança ao dizer isso ao torcedor. É importante que a torcida vá ao Mangueirão no domingo, faça uma festa e empurre o time para uma vitória que pode determinar o acesso.

Caso o sonhado salto para a Série A não se concretize, paciência. Vale a comemoração por uma campanha excelente, a melhor do Remo em Campeonatos Brasileiros. Vale ainda a experiência de brigar diretamente pelo acesso, enfrentando de igual para igual os melhores times da Série B.

Vale, também, como importante aprendizado sobre as filigranas de uma competição tão equilibrada, seletiva e traiçoeira. Depois de 2025, nada será como antes para o Remo, no bom sentido. A partir de agora, o clube ingressa em outro nível de ambição ao participar do Brasileiro.

Passou o tempo em que o objetivo era apenas não cair de divisão. O Remo de agora quer mais. Ambiciona o acesso para chegar à Primeira Divisão e, de preferência, se manter nela. Para isso, está investindo em estrutura, o que envolve a reforma completa do CT de Outeiro e a revitalização do Banpará Baenão. O caminho escolhido é um sinal de amadurecimento. (Fotos: Elói Mendes e Léo Piva)

Decisão de domingo traz coincidência gloriosa

Há 20 anos, o Remo conquistou seu primeiro título brasileiro. A Série C de 2005 foi conquistada em circunstâncias adversas, parecidas com as de agora. Era preciso vencer, longe dos olhos da torcida, e torcer por outro resultado favorável.  

O Remo foi jogar no estádio Santa Rosa, em Novo Hamburgo (RS), com a missão de vencer para ter chance de conquistar o título, mas isso não bastava. Era preciso que Ipatinga e América-RN empatassem (0 a 0).

Parecia difícil, como agora, mas deu certo. Exatamente no dia 20 de novembro daquele ano aconteceu a rodada final do quadrangular decisivo. Capitão e Maurílio fizeram os gols do Leão. Luís Gustavo descontou para o Novo Hamburgo.

Foi o primeiro título nacional conquistado pelo Remo. Tão importante quanto a taça erguida no estádio gaúcho foi o acesso conquistado naquele momento.

(Quem avisou sobre esse episódio glorioso da história remista foi o professor Gil Matos, torcedor e otimista de carteirinha). 

(Coluna publicada na edição do Bola desta segunda-feira, 17)

Tema de destaque na COP30, “ponto de não retorno” da Amazônia ainda precisa de mais estudos

Da Agência Fapesp

A ciência brasileira precisa entrar de maneira mais incisiva em pesquisas relacionadas ao tipping point da Amazônia não só para entender os diversos fatores envolvidos no processo como para ampliar as evidências disponíveis. A afirmação é do coordenador do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), David Lapola. Lapola mediou o painel “Hipóteses extraordinárias exigem evidências extraordinárias: Perspectivas em pesquisa, educação e ações sobre o tipping point da Amazônia”, na Zona Azul da COP30, na quinta-feira (13/11).

A sessão teve o objetivo de discutir o conhecimento atual sobre a possibilidade de ultrapassar um ponto de não retorno na floresta, abordando ações institucionais e coletivas de adaptação e o papel do ensino superior na redução de incertezas e na implementação de soluções.

Vindo das ciências exatas, o termo designa um momento crucial a partir do qual um ecossistema não consegue mais se regenerar, entrando em um outro estado de retroalimentação. Ganhou destaque com o livro The tipping point: how little things can make a big difference, de Malcom Gladwell (2000), que olhou para a questão sob um ponto de vista das ciências sociais. Faz parte da programação da Unicamp na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, realizada em Belém, em parceria com a Fundação Conrado Wessel (FCW) e o AmazonFace, um programa de pesquisa apoiado pela Fapesp que, por meio de experimento de campo, estuda como o aumento de CO2 atmosférico afeta a floresta amazônica, sua biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.

“Precisamos conviver melhor com as incertezas. Atualmente não conseguimos afirmar categoricamente que passamos do ponto de não retorno da Amazônia. Mas isso não torna a questão menos séria e urgente. Precisamos ter mais pesquisas brasileiras e simplificar a forma de comunicá-las, sempre mantendo o rigor e a integridade científica. Também é importante abordar pontos que hoje não estão incluídos nesse tipo de estudo, como outros conhecimentos, como os de povos tradicionais, e a visão de ciências humanas. Hoje temos evidências, mas não são extraordinárias”, disse Lapola à Agência FAPESP, logo após o evento realizado no pavilhão Higher Education For Climate Action, do qual a Unicamp faz parte.

O pesquisador é um dos 664 cientistas de 111 países convocados para elaborar o novo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC), órgão internacional de avaliação da ciência relacionada ao tema, que pela primeira vez incluirá o tema do ponto de não retorno da floresta amazônica na análise. Lapola é o autor principal do capítulo 8 do Grupo de Trabalho I, responsável pelo tema “Mudanças abruptas, eventos de alto impacto e baixa probabilidade e limiares críticos, incluindo pontos de inflexão, no sistema terrestre”.

Informação científica

Durante o painel, as pesquisadoras Sabine Righetti, do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp, e Ana Paula Morales (Fundação Conrado Wessel), fundadoras da Agência Bori , apresentaram os primeiros resultados de um estudo que analisou artigos científicos publicados sobre tipping point. Usando um sistema de mapeamento, organização e análise de informação científica com ajuda da inteligência artificial, foram analisados 823 artigos da Web of Science.

Após uma varredura com base em seis questões, os estudos foram divididos em três grupos: sim (com 178 artigos), não (247) e talvez (86) para indicação de ponto de não retorno. Concluiu que da perspectiva científica é preciso mais pesquisa para entender melhor o fenômeno e sua complexidade. E sobre a comunicação, que é preciso evitar discurso binário “acabou/não acabou” e explicar a “faixa” de risco e incerteza.

“Enquanto alguns estudos cravam 25% de desmatamento como ponto de não retorno, outros falam em faixas de 18% a 28%”, exemplifica Morales. A pesquisa foi desenvolvida no âmbito do Atlas Cultural de Soluções Científicas, uma iniciativa da Bori com a FCW, que usa IA para mapear, organizar e analisar informação científica para apoiar tomadores de decisão.

O piloto do projeto, para testar o sistema, foi desenhado em reuniões com a Fapesp, que neste ano lançou o portal A Ciência na COP30 para reunir pesquisas e projetos apoiados pelas duas fundações visando ampliar o conhecimento sobre o clima.

“A população em geral não sabe o que é tipping point. Essa é uma linguagem da ciência. Queremos passar esse conhecimento científico para a sociedade e, principalmente, tomadores de decisão e formuladores de política pública”, disse Righetti, que também é assessora da coordenadoria geral Mídia Ciência da Fapesp.

A professora Marina Hirota, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), destacou que o próprio termo tipping point tem variação ao ser usado, dependendo da especialidade do cientista.

“É importante, por exemplo, promover interação entre quem faz os modelos e quem está no campo. Como treinamos para que as pessoas queiram juntar modelo e ecologia? Mais do que nunca precisamos de mais gente conversando, inclusive fora da academia, porque senão daqui a pouco tudo pode começar a ser atribuído como ponto de não retorno”, afirma Hirota, que desenvolve estudo com representações algorítmicas da Amazônia para compreender por que certas porções da floresta são mais vulneráveis que outras, interligando diferentes disciplinas, como ecologia e antropologia.

Ao falar no painel sobre o conhecimento dos povos tradicionais, a indígena Kaiana Kamaiurá, do Xingu, disse que as comunidades indígenas não sabem o que é tipping point, “mas sentem na pele as mudanças climáticas”.

“Antes nosso povo contava o calendário para programar o plantio com a mudança das estrelas. Hoje, se usamos as estrelas perdemos o plantio por seca ou por chuva. Temos tentado adaptar, plantando em diferentes períodos para não perder a plantação. Pode parecer irrelevante em espaços de discussão maiores, mas essa é nossa forma de vida. As mudanças climáticas já estão em nossos territórios com os rios secando, os peixes desaparecendo e indo para outros lugares. Temos procurado nos adaptar para conseguir sobreviver.”

Já a pesquisadora Taís Gonzales destacou, entre outros pontos, a questão do racismo ambiental e como as mudanças climáticas têm impactos diversos para diferentes populações.