
Do Filmoscópio
O diretor Robert Altman desafiou o compositor Johnny Mandel a escrever “a canção mais estúpida de todos os tempos” para “MASH” (1970). Diante da dificuldade, a tarefa recaiu sobre Mike, seu filho de 14 anos. Em 5 minutos, o menino redigiu os versos de “Suicide is Painless”. O resultado foi irônico: o pai, Robert, lucrou US$ 75 mil pela direção; o filho, Mike, embolsou US$ 2 milhões em royalties ao tornar sua letra adolescente o tema da famosa série de TV.
A ousadia não parava na trilha sonora. O filme foi recusado por 14 diretores antes de Altman aceitar. Sua marca registrada foi a sobreposição de diálogos – até quatro conversas simultâneas – e 80% de improviso do elenco, criando um caos realista que imitava o absurdo da guerra.
Esse método revolucionário quase causou um motim. Donald Sutherland e Elliott Gould, as estrelas, exigiram a demissão de Altman, temendo pelo próprio futuro. Um executivo subestimou o filme, dizendo que ele só rodaria em cinemas drive-in. O estúdio manteve o diretor, e Gould depois admitiu o erro, chamando a si mesmo de “arrogante” por não enxergar a genialidade de Altman na hora.
A batalha continuou na pós-produção. O estúdio quis cortar as cenas de cirurgia, consideradas muito gráficas, mas visitantes no set insistiram que eram essenciais. Altman resumiu a luta numa frase: “Este filme não foi lançado, ele escapou”. A fuga deu certo: a obra faturou US$ 41 milhões e conquistou a Palma de Ouro em Cannes.
O ápice da ironia veio com o Oscar: o roteirista Ring Lardner Jr., que reclamou não ver “uma palavra sua” no filme final, ganhou o prêmio de Melhor Roteiro Adaptado. Banido pelos militares, “M.A.S.H.” usou o humor negro para criticar a guerra e se tornou um clássico atemporal, símbolo da criatividade que venceu o sistema.
(Pesquisa e redação: Daniel de Boni)