Uma batalha desafiadora

POR GERSON NOGUEIRA

O Remo enfrenta o Criciúma, hoje à noite (19h30), no estádio Mangueirão, com a responsabilidade de garantir presença na 3ª fase da Copa do Brasil. Muito além da importância técnica da classificação, há o fator financeiro. Caso passe pelos catarinenses, o Leão vai acumular uma premiação de R$ 2.921.000,00. Na 3ª fase, mais R$ 2.315.000,00.

A Copa do Brasil é extremamente valiosa pela premiação que paga. Tropeços como o do ano passado, quando o Remo foi eliminado na 1ª fase, representam prejuízos irrecuperáveis. O duelo com o Criciúma é, portanto, fundamental para reforçar a receita da temporada.

Para avançar, o Remo terá que jogar muito mais do que tem jogado no Campeonato Paraense. A falta de criatividade demonstrada pela equipe em jogos contra adversários tecnicamente inferiores, como o Capitão Poço e Cametá, não pode se repetir hoje.

O Criciúma disputou o Brasileiro da Série A em 2024, fazendo uma campanha de recuperação na reta final, mas a pontuação foi insuficiente para se manter na elite. Tem um time do mesmo nível da equipe azulina.

É enganoso considerar que o Remo é superior levando em conta que o Criciúma foi eliminado do Campeonato Catarinense. Ocorre que a eliminação veio na primeira partida eliminatória depois de liderar a fase inicial.

Os riscos representados pelo Criciúma têm a mesma envergadura dos problemas que o Remo exibe. Se na Série C 2024, Rodrigo Santana baseou a força de seu sistema no apoio dos alas, neste ano a dificuldade de encontrar uma solução eficiente no lado esquerdo enfraquece as ações ofensivas.

Para hoje, o paraguaio Alan Rodriguez deve ser novamente o titular, depois da má impressão deixada no Re-Pa. Uma opção mais palatável seria Edson Cauã, que perdeu espaço após se lesionar. Na direita, o jovem Kadu tem feito um Parazão de alto nível, contribuindo bastante nas jogadas ofensivas, com Dodô ou Maxwell, hoje na suplência.

Ytalo será o centroavante, pois Felipe Vizeu está lesionado. Terá ao seu lado Pedro Rocha e Dodô. O problema é que o esperado movimento de flutuação entre meio e ataque só foi bem-sucedido na estreia, diante do S. Francisco. 

Curiosamente, a esperança da torcida se concentra num atacante que segue na suplência: Adailton, artilheiro na temporada com 5 gols, até hoje só foi titular contra o Cametá. É um reserva de luxo, arma de Rodrigo Santana para o 2º tempo. É o melhor reforço azulino até agora.

Renascimento de PK é mérito de Luizinho Lopes

Jogador mais hostilizado pela torcida bicolor nas primeiras rodadas do Parazão, o lateral-esquerdo PK chegou a pintar como o grande engodo da temporada. De jogador que foi alvo da cobiça do rival e acabou contratado num lance de bastidores, ele passou a ser visto como mau negócio.

Atuou mal e acabou expulso no clássico com a Tuna, mas se reabilitou a partir da chegada de Luizinho Lopes, que passou a posicionar o lateral como um terceiro zagueiro no transcurso de várias partidas.

Apesar da evolução, ainda sofreu com vaias da Fiel no jogo contra o Independente. Mesmo fazendo o cruzamento para Nicolas marcar o gol da vitória, PK foi apupado o tempo todo. Virou o alvo preferencial da insatisfação da torcida com o time.

Contra o Remo, no empate de 1 a 1, PK começou a mostrar utilidade, participando muito bem do bloqueio armado por Luizinho. Atuou bem contra o Manaus e teve personalidade para seguir em frente, sem se preocupar com a desconfiança dos torcedores.

As coisas foram mudando para melhor. Na semifinal da Copa Verde diante do São Raimundo, em Boa Vista, PK desfruta da condição de titular indiscutível pelo lado esquerdo, consolidado no sistema adotado pelo técnico. A sonhada compactação envolve o papel de PK como marcador.

Com o súbito renascimento dele, o Papão ganhou um titular experiente e que pode contribuir muito para a maturidade técnica do time.

Conmebol passou pano para o racismo paraguaio

Com uma punição pecuniária muito abaixo do que era esperado (50 mil dólares, cerca de R$ 290 mil), a Conmebol confirmou a fama de condescendência com atos racistas no futebol sul-americano. A entidade, presidida por um cartola paraguaio, costuma agir com excessiva brandura em relação a torcedores xenófobos e intolerantes.

Luighi e seus companheiros do Palmeiras sub-20 foram insultados com gestos vindos de torcedores imitando macacos. As lágrimas amargas e indignadas do atacante comoveram o país, mas não convenceram a Conmebol. 

Além da multa, que não foi a maior já aplicada pela entidade, a decisão incluiu a proibição de público em jogos do Cerro Porteño na Libertadores Sub-20, medida absolutamente inútil e até ridícula, pois o time já foi eliminado do torneio.     

Caberá à CBF agir com um mínimo de coragem e cobrar da Conmebol uma revisão de pena, além de acionar a Fifa, que também não é muito de se importar com cenas de racismo – Vini Jr. que o diga.

O fato é que a CBF é hoje a confederação mais poderosa da América do Sul, reunindo clubes que dominam as competições continentais. Está na hora de abandonar a tibieza e fazer valer esse poderio.  

(Coluna publicada na edição do Bola desta terça-feira, 11)

O chamado à ação na carta do presidente da COP30

André Corrêa do Lago divulga documento com visões e objetivos do Brasil para o evento. Diplomata pede um mutirão contra as mudanças climáticas

Do Nexo Jornal

O embaixador André Corrêa do Lago, que preside a 30ª Conferência do Clima da ONU, a COP30, divulgou nesta segunda-feira (10) uma carta que traz a visão e os objetivos do país para o evento, que será realizado em Belém, em novembro. Mais do que metas ou uma agenda concreta, porém, o documento traz, ao longo de 12 páginas, um apelo para que países, sociedade civil, empresários não desistam da luta contra o que ele chamou de inimigo comum a todos: as mudanças climáticas.

O Brasil faz um chamado a uma mobilização geral diante do complexo cenário internacional, em que os Estados Unidos, sob Donald Trump, estão provocando mudanças no tabuleiro geopolítico; e a ameaça de uma nova grande guerra vem redirecionando os esforços de muitos países, antes voltados para o clima, para estratégias de defesa. É o que Corrêa do Lago chama de “banalidade da inação”, em sua carta.

“Este ano marca o 80º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial e de nossa aliança na criação das Nações Unidas. A filósofa germano-americana Hannah Arendt denunciou a ‘banalidade do mal’ como a aceitação do que era inaceitável. Agora, estamos enfrentando a ‘banalidade da inação”, uma inação irresponsável e também inaceitável”, escreve.

“Nesta década crítica, o Brasil convoca novamente nossa aliança de povos para, mais uma vez, deixarmos nossas diferenças de lado e nos unirmos para vencer o inimigo comum: a mudança do clima”, continua.

Logo no primeiro parágrafo da carta, Corrêa do Lago pede que a comunidade internacional reflita sobre os valores “que nos mantêm unidos: paz e prosperidade, esperança e renovação, consideração e gratidão, unidade e conexão, resiliência e otimismo, generosidade e bondade, diversidade e inclusão”. Serão necessários “em um século que testará a capacidade de adaptação e inovação de nossa espécie na construção de um futuro comum”.

Para o embaixador, que desde 2023 é o negociador chefe do Brasil nas negociações climáticas, o momento demanda uma mudança inevitável, “seja por escolha ou por catástrofe”.

Nos últimos anos o aquecimento global tem se agravado. 2024 foi o mais quente do registro histórico, superando o recorde de 2023, e foi o primeiro em que a temperatura média do planeta ultrapassou em mais de 1,5 °C a que era registrada antes da Revolução Industrial. A consequência tem sido um aumento de eventos extremos e tragédias em todo o mundo, como as chuvas que devastaram o Rio Grande do Sul e as queimadas na Amazônia e no Pantanal.

“Se o aquecimento global não for controlado, a mudança nos será imposta, ao desestruturar nossas sociedades, economias e famílias. Se, em vez disso, optarmos por nos organizar em uma ação coletiva, teremos a possibilidade de reescrever um futuro diferente. Mudar pela escolha nos dá a chance de um futuro que não é ditado pela tragédia, mas sim pela resiliência e pela agência em direção a uma visão que nós mesmos projetamos”, aponta a carta.

É o mesmo tom que ele já havia adotado, na quarta passada (5), durante reunião informal na Assembleia Geral da ONU. “Diante da urgência, a complexidade da nossa tarefa é fortalecer a governança climática e proporcionar agilidade, preparação e antecipação tanto na tomada de decisões quanto na implementação”, disse.

Em conversa com alguns veículos de imprensa na sexta-feira (7), da qual fez parte a Agência Pública, Corrêa do Lago e Ana Toni, secretária de Mudança do Clima, do Ministério do Meio Ambiente, e diretora-executiva da conferência, explicaram que a ideia da carta foi realmente fazer um chamado à mobilização que vá além da própria conferência.

“Nós estamos vendo muito claramente os limites de tratar do tema de mudança do clima apenas entre países negociando num acordo internacional cheio de regras extremamente complexas”, afirmou o embaixador.

No documento, a presidência brasileira da COP se vale do conceito tão brasileiro de mutirão. “Todo brasileiro entende essa palavra, e agora o mundo vai descobrir que existe, que todo mundo tem que se juntar para um bem comum”, disse ele na entrevista.

“Não apenas os países. Nós temos que juntar a sociedade, o setor privado, a juventude. Nós temos que juntar todos em torno de um movimento que nos parece tão urgente, mas que nós não estamos tendo no mundo, neste momento: um foco sobre clima como deveria ser”, complementou.

Este não-foco ganhou escala a partir da vitória de Trump nas eleições americanas. E não somente pela postura anti-climática do republicano, que além de ter iniciado o processo de mais uma vez retirar os EUA do Acordo de Paris, defende uma exploração maior de petróleo, tem agido contra incentivos à transição energética e vem promovendo um desmonte da área ambiental e de pesquisas de clima.

O impacto ainda maior é pela desestabilização da ordem mundial que ele vem provocando por exemplo, em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia e que faz com que países europeus direcionem o foco para uma eventual guerra no continente.

Na carta, Corrêa do Lago cita isso, de modo indireto. “A falta de ambição será julgada como falta de liderança, pois não haverá liderança global no século 21 que não seja definida pela liderança climática (…). Ao reconhecermos que somos todos interdependentes na luta contra a mudança do clima, devemos reconhecer que a comunidade internacional é tão forte quanto seu elo mais fraco.”

Na entrevista, ele foi mais enfático. “[É um momento em que] os maiores, ou o que se espera que sejam os maiores, entre aspas, doadores [para a ação climática]… um está saindo de Paris e não parece ter muita intenção de colocar recursos para isso, e os outros estão tendo que desviar os recursos para outras coisas também, um pouco por causa das circunstâncias mundiais hoje”, resumiu.

A visão é que é preciso traduzir melhor às pessoas o que significam as negociações climáticas e qual é a relação delas com a vida real. “Acho que o mundo entende que a gente está assinando várias coisas importantes e tal [no âmbito das conferências do clima], mas não está entendendo muito bem. A gente tem que traduzir o resultado dessas negociações para o público em geral, para que ele volte a acreditar que a gente tem que entrar nessa agenda para o bem comum”, explica.

Uma ideia que precisa ser combatida, diz, é que investir em combate à mudança do clima é ruim para a economia. “Não é. Eu acho que nós temos que chegar com muitíssimos exemplos do quanto pode ser bom, se bem feito, e há vários exemplos. É mostrar que o combate à mudança do clima não piora a vida das pessoas. Ao contrário, melhora”, diz.

“Porque há essa percepção, por exemplo, em alguns países europeus, que o combate à mudança do clima está aumentando o custo da energia. Então as pessoas acham que não têm que pagar por isso. A ideia é fazer um movimento que dê um novo impulso ao combate à mudança do clima, com novos argumentos e com novos atores.”

A presidência da COP30 e o governo brasileiro, em especial na figura da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, têm defendido, desde o ano passado, que esta deve ser a conferência da implementação de tudo o que já foi decidido ao longo dos últimos anos. Que o que precisa ser feito para combater a mudança do clima já está posto, agora é preciso pôr em prática. A carta traz essa ideia. De que a COP30 seja o “momento da virada”.

Questionados sobre como esperam ser possível fazer essa virada justamente diante do diagnóstico, que eles mesmos fizeram, de que as preocupações neste momento de todo o mundo são outras, como a guinada da extrema direita, um discurso anti-ambiental e a iminência de uma guerra mais ampla, tanto o presidente da COP quanto a diretora-executiva fizeram um chamado à razão.

“A gente tem de perceber que o tema da mudança do clima vai continuar conosco. As guerras vêm, vão. Ficam aí um ano, dois, três… Muita destruição e vão embora. A mudança do clima, ela fica. Vai ficar por muitos anos. A gente sabe disso”, respondeu Ana Toni.

Na carta, eles propõem que outros atores atuem como “alavancas” das soluções que já estão disponíveis e já estão acontecendo: “A presidência recrutará agentes entre as partes interessadas não estatais para se associarem como ‘alavancas’, ajudando a aplicar soluções em ‘pontos de alta alavancagem’, onde pequenas mudanças podem resultar em grandes impactos no comportamento de sistemas complexos”.

De acordo com Ana Toni, uma dessas alavancas precisa ser sobre a transição energética. “É inevitável, ela vai acontecer. O que a gente precisa agora é dar velocidade e escala a essa mudança. Já tem soluções em muitos setores. Já tem tecnologia. A gente já sabe que os recursos existem. Eles precisam ser colocados. Se a gente olhar para soluções, olhar para essa alavanca, pensando nesse mutirão, não só os negociadores, mas a sociedade como um todo, setor privado, governo multinacional, governos subnacionais, a gente tem uma oportunidade incrível de avançar neste combate à mudança do clima”, afirma.

“Temos sim esse inimigo comum e temos já soluções na mesa. [A carta traz] essa esperança de fazer com que a próxima década seja essa década de mutirão, de trabalhar juntos, de pensar nesse bem comum, sabendo que as soluções já existem, a gente só precisa dar velocidade e escala para ela”, complementa.

Link para matéria: https://www.nexojornal.com.br/externo/2025/03/10/cop30-carta-presidente-andre-correa-do-lago