POR FLÁVIA AZEVEDO, via Facebook
Exercício simples sobre a edição do JN. Resolvi colocar no “papel” porque nem sempre as pessoas entendem quando martelamos sobre os recursos do jornalismo para a prática da seletividade. É textão, sorry.
É muito mais sofisticado, mas ao mesmo tempo muito simples. Primeiro, trazem para o grande público recortes de uma entrevista de Dilma para jornais impressos e para rádios do interior de SP.
1) Dos fatos. Na entrevista aos impressos, Dilma diz que subestimou os efeitos da crise internacional sobre a economia brasileira. “Agora, eu nunca imaginaria, ninguém imaginaria que o preço do petróleo cairia de 105 dólares [o barril] em abril, para 102 dólares em agosto, para 43 dólares hoje.” Juntando a isso, a presidenta fala que sim, após as eleições percebeu a bruta queda na arrecadação de impostos no Brasil. Ou seja, elementos que juntos agravaram a crise, segundo ela.
2) Das manchetes dos impressos:
Folha: Dilma afirma que errou na avaliação da situação econômica
Estadão: Dilma admite demora do governo em perceber a crise econômica
O Globo: Dilma diz que errou ao ter demorado para perceber gravidade da crise econômica
(Pausa: o que se percebe pelas manchetes? o erro foi de avaliação sobre a crise, mas de qual crise estamos falando? Quem lê a manchete pensa o quê? Economia brasileira, claro)
3) Já nas rádios, ela explica AO VIVO o que talvez não tenha dito para os impressos ou o que talvez tenha dito aos impressos mas tenha sido EDITADO pelos impressos. Contou que havia uma expectativa de crise internacional por conta do fim do superciclo das commodities. Alguma novidade até ai? Isso foi dito na campanha.
Voltemos ao JN. William Bonner diz, com voz grave e arqueando as sobrancelhas: “Sobre o tamanho da crise, em menos de 24 horas, a presidente deu respostas bem diferentes”. E ai a matéria corre profunda como um pires. (VIDE FOTO do momento da sobrancelha)

(Pausa: como que ratificando, devagar e sempre, no imaginário coletivo, a imagem de uma chefe de estado louca, incompetente e senil)
PAUSA 2 ~ Entre as entrevistas de Dilma e a edição do JN aconteceu a grande acareação entre Yousseff e Paulo Roberto da Costa. Nela, o deputado baiano Jorge Solla pergunta novamente a Yousseff sobre Furnas, onde o inquirido reafirma que um dos destinatários da propina da estatal foi Aécio Neves. “Eu confirmo por conta do que eu escutava do deputado José Janene, que era meu compadre e que eu era o operador dele”.
5) Mas, ignorando totalmente a denúncia de Yousseff (atentem para a seletividade), o JN emplaca o recurso clássico para emitir sua opinião depois das eleições através do seu escolhido abençado: Aécio Neves, o mesmo do episódio de Furnas, comenta que Dilma usa a mentira como método para enganar as pessoas.
6) Percebam que não interessa ao jornalismo global a acusação sobre Furnas. Quase no final da edição, para mostrar que se trata de um jornal sério, os âncoras citam que Yousseff voltou a reafirmar que “ouviu dizer” que um dos dinheiros de Furnas foi para Aécio Neves, mas o Ministério Público disse que não há materialidade para se abrir uma investigação sobre isso.
(Pausa: atentem para a fala pausada de Bonner quando ele diz que Yousseff ouviu dizer, o que claro, demonstra a falta de materialidade para a denúncia do MPF e nós só estamos colocando isso aqui pq seria muita cara de pau não citar, visto que vivemos em tempos de REDES SOCIAIS)
Bom, e assim a vida caminha, com esse tipo de jornalismo de massa. De um lado, a louca e incompetente. Do outro, seu porta-voz, a voz do Congresso, o bom moço para levantar a bandeira da moral contra “tudo que está aí”. E assim, temos um exemplo claro de como funciona a mídia brasileira, que não está interessada em nada em contribuir para que as pessoas tenham suas próprias opiniões, princípio básico do jornalismo.