Um festival de hipocrisia

Por Ricardo Kotscho

Venho notando nos últimos dias que um festival de hipocrisia está assolando o Brasil. Já tivemos o Febeapá (Festival de Besteiras que Assola o País), imortal criação do Stanislaw Ponte Preta, e agora é só trocar besteiras por hipocrisia que dá na mesma.
Até agora não fiz nenhum comentário sobre a grave crise que se prolonga em Honduras e envolve seriamente o Brasil porque é tão grande a confusão por lá que não dá para sair por aí alegremente dizendo quem é bandido e quem é mocinho nesta história.
Se você não tem o que dizer e não consegue nem entender o que está acontecendo, vai explicar o quê? Melhor é ficar calado.
Mas, diante do que li hoje no noticiário, com todo mundo metendo o bedelho, me deu vontade de entrar no assunto só para destacar a quantidade de besteiras e de hipocrisia que se está produzindo em torno da crise naquele pequeno e desconhecido país.
Que esse Manuel Zelaya é um tremendo maluco que não merece a menor confiança de ninguém, estamos todos de acordo. Ocorre que ele foi eleito pelo povo de Honduras e derrubado de pijama pelos militares porque queria fazer uma consulta popular para poder se candidatar à reeleição.
Qual é o crime? Por que no mundo inteiro a reeleição é considerada democrática, mas só não pode existir em Honduras, na Venezuela e nos seus aliados bolivarianos? Por que Fernando Henrique Cardoso não foi chamado de golpista ao mudar a Constituição para disputar mais um mandato, utilizando métodos, digamos, pouco ortodoxos?
O Brasil, os Estados Unidos, a ONU, a OEA, todos condenaram o golpe em Honduras que derrubou Zelaya. Golpe é golpe, não tem outro nome, e o presidente eleito tinha todo o direito de lutar para voltar ao seu cargo.
Na ausência de outras crises internas, agora o governo brasileiro é criticado por abrigar o dito cujo em sua embaixada em Tegucigalpa. Queriam o que? Que o embaixador fechasse o portão e chamasse a polícia dos golpistas?
Entramos numa tremenda roubada porque esse tal de Zelaya, uma caricatura do Ratinho, não está respeitando a casa de quem lhe deu abrigo e quer botar fogo no circo escondido atrás dos muros da embaixada.
O problema é que o Brasil continua lutando por uma saída diplomática e pacífica, mas está cada vez mais pendurado na brocha no momento em que os organismos internacionais nada fazem para resolver o conflito.
Hipocrisia é chamar de ditador o celerado presidente venezuelano Hugo Chaves, também eleito e reeleito, quando fecha arbitrariamente emissoras de rádio e televisão de oposição, e achar bonito quando o “presidente de facto”, Roberto Micheletti, faz a mesma coisa em Honduras.
Assim como é hipocrisia ficar a toda hora denunciando o presidente Lula de antecipar a campanha eleitoral e fazer exatamente a mesma coisa. O que é feio para uns, fica bonito nos outros, é natural. Ou as viagens que os outros candidatos presidenciais fazem pelo país, assim como Dilma, são apenas de turismo, para conhecer melhor o Brasil?
Serra, Aécio, Ciro, Marina, todos eles estão toda semana viajando, procurando cavar seu espaço para cativar o eleitorado com vistas a 2010. É direito deles, qual o crime? Pois nesta segunda-feira, no Rio, onde está em plena campanha, minha amiga Marina Silva achou bonito criticar a “antecipação do debate político sobre a eleição do próximo ano”.
No domingo passado, cercada pelos óculos escuros de Gabeira e Sirkis, Marina foi fazer o que caminhando com faixas e bandeiras pelas praias cariocas? Tomar sorvete, catar conchinhas, ou não estaria dando início à sua campanha presidencial também?
Diz a notícia da Folha: “Marina aprovou a avaliação do presidente do PV no Estado do Rio, vereador Alfredo Sirkis, que culpou o presidente Lula pela discussão eleitoral antecipada”. Que maravilha! O valente ex-guerrilheiro e ex-secretário de Cesar Maia agora é o guru de Marina.
Por que nós temos este costume de não chamar as coisas pelos nomes certos e só achar errado o que fazem os que não pensam como nós?
Por acaso foi também por culpa de Lula que o governador José Serra resolveu aumentar em 43% a verba de publicidade do seu governo este ano?
Seria apenas para dar mais trabalho às agências de publicidade e ocupar os espaços ociosos dos intervalos comerciais porque o povo não é capaz de enxergar a grande obra que ele vem fazendo em São Paulo?
Cada um pode enxergar a paisagem como quiser, já escrevi aqui outro dia, mas um pouco de semancol nas declarações não faria mal a ninguém. Estão exagerando na hipocrisia.

5 comentários em “Um festival de hipocrisia

  1. O pior, Gérson, é que a nossa Band, promete um debate isento sobre o caso, no respeitável “Canal Livre” de domingo e me leva como convidado um inexpressivo “Quem?” que defende abertamente o golpe hondurenho, com direito à opinião do ex-trostsquista e tucano convertido Demétrio Magnólli que para variar, chama o Zelaya de “caudilho”. Saudades do velho “Canal Livre”.

    1. Saudades de jornalismo de verdade, meu caro Cássio. A postura da grande mídia, de qualificar como “governo de fato” o golpe hondurenho, é algo tão vergonhoso quanto a própria quartelada. Quando o Chávez fechou uma emissora de TV na Venezuela foi um deus-nos-acuda. O William Bonner empostou ainda mais a voz, protestando contra a “violação da liberdade de imprensa”. O tal Micheletti mandou fechar rádios e empastelar jornais e a mídia nacional silencia.

  2. Tá tudo errado meus amigos, tudo errado. Aliás, não foi esse mesmo Willian Bonner que certa vez comparou o cidadão médio brasileiro com o Homer Simpson? Pois então. A grande imprensa age exatamente por essa linha de pensamento. De que somos todos trouxas!

  3. A propósito, já tramita no Congresso colombiano a emenda que permite um terceiro mandato para Álvaro Uribe. E a imprensa tupiniquim não dá um pio sobre o assunto. É o cúmulo da desfaçatez.

  4. Muito felizes as considerações do Ricardo Kotscho no post acima, concordo com tudo, em genero, número e grau. Também concordo com as manifestações postadas pelos participantes, no entanto, quero aqui refletir que não adianta clamarmos, por onde anda quem!?!?!?! SOMOS NÓS, quem temos a responsabilidade de mudar esse panorama, SOMOS NÓS, que nos despojaremos do espírito comodista de só apontar soluções e cobrar dos outros, a execução da tarefa menos nobre ou talvez, mais espinhosa.
    Não tem jeito amigos, a responsabilidade é NOSSA, outubro de 2010, está às portas, que tal não reelegermos nenhum parlamentar atual, que tal não renovarmos o contrato de nenhum representante NOSSO?!?!?!, afinal, não caíram em contradição defendendo governos, quando foram eleitos para defender o povo? TRAIÇÃO, talvez seja o termo mais apropriado; que tal ANULARMOS O VOTO ao percebermos que os candidatos SÃO SEMPRE OS MESMOS? que não existe renovação dos quadros políticos pois os partidos manobram as listas priorizando sempre ELES? e não aceitemos o comentário de que anular o voto é atentar contra a democracia, esse discurso está viciado; anular o voto é tão democrático que está lá na urna, existe uma tecla alaranjada, diferenciada portanto, para nós exercitarmos essa faculdade e nós a desprezamos.
    Anular o voto é dizer para a sociedade, para o TRE, que os candidatos ali apresentados não atendem à nossa exigência e, que queremos outros candidatos, queremos aqueles que ainda não tiveram chance de mostrar que tem capacidade de representar-nos em qualquer esfera política, que são idealistas, que são PRÔBOS tal qual nós o somos, que trabalharão em prol da melhoria da qualidade de vida de um povo vilipendiado, miserável, mas de uma nação rica…
    ANULAR O VOTO!!! talvez comece por aí, porquê não tentar.

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