Coluna: Os papas do espetáculo

A era do espetáculo chegou instantes antes do culto à celebridade, dominante nos dias de hoje. Dúzias de estudiosos dos fenômenos midiáticos dedicam precioso tempo e queimam incontáveis pestanas buscando entender os tempos frenéticos que o mundo experimenta. O esporte, obviamente, não teria como escapar a essas formas de comportamento.
Mais que isso: nas arenas esportivas, a superexposição mistura-se ao narcisismo e produz situações inusitadas, por vezes engraçadas, outras beirando o ridículo. O futebol, que nos primórdios era abrigo quase exclusivo das classes sociais mais humildes, tornou-se palco para o livre desfilar de egos.
Das chuteiras de variadas cores, matizes e formatos, passando pelos apetrechos fashionistas que uns e outros jogadores insistem em usar, como forma de se sobressair da multidão. Sem esquecer de óbvios apelos de marketing expressos nas bandanas, pulseiras e penteados exóticos.
O comportamento personalista extrapola o mero apuro visual. Os jogadores mais articulados procuram valorizar a capacidade de comunicação, caprichando nas entrevistas e posicionamentos. Foi-se o tempo em que jogador só falava (e mal) do jogo em si. Felipe, Marcos, Rogério Ceni, Fernandão e Souza (Grêmio) elaboram análises de jogo com conhecimento e capacidade de argumentação. 
Os técnicos também aparecem como potenciais competidores por espaço na mídia, fazendo o impossível para chamar atenção na estreita faixa que lhes cabe à beira do gramado e nos ringues da TV, internet e outros canais de comunicação. Todos tentam a todo custo estabelecer sua própria marca, misto de apelo estético com expressão verbal.
Desde os exemplos óbvios, como Luxemburgo, Muricy, Paulo Autuori e Dunga (lembram das camisas cuidadosamente escolhidas para os primeiros jogos à frente da Seleção?), até projetos em construção, como os de Mano Menezes e Sérgio Guedes, apropriam-se do negócio futebol e rivalizam com os verdadeiros artistas do espetáculo.
 
 
Ao mesmo tempo, é visível o fato de que a mídia deixou de ser universo dominado pelos boleiros. A saga começou com Ayrton Senna, tão genial como piloto quanto mago da comunicação marqueteira, e prosseguiu com Oscar, Hortência, Paula, todas as seleções de vôlei, Guga, Gustavo Borges, Maurren Maggi, César Cielo & cia.   
Toda essa galera usou (e usa) bem as ferramentas disponíveis, mas estou por ver alguém tão conectado com esses novos tempos quanto esse Usain Bolt, que hoje bateu novo recorde mundial nos 200 metros livres. Além de correr feito um guepardo, o jamaicano lança mão de todos os recursos para amplificar sua condição de super astro, desde caretas até gestos cuidadosamente calculados. Mais que Phelps, Federer, Cristiano Ronaldo ou outro astro do esporte contemporâneo, Bolt é “o cara”.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta sexta-feira, 21)

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